Nilto Tatto: “O golpe e o meio ambiente”
“O impeachment da presidenta Dilma tem relação direta com a agenda socioambiental, porque o pré-sal e nossa mão de obra estavam na mira”, registra Nilto Tatto
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O Brasil de Chico Mendes é o país que mais mata ativistas em todo o mundo, e no dia de hoje eu não poderia deixar de lembrar dos mais de 70 companheiros e companheiras que tiveram suas vidas ceifadas devido a sua luta por sustentabilidade (da Terra e das vidas humanas).
Precisamos, urgentemente, especialmente no campo da esquerda, rediscutir o modelo de desenvolvimento que queremos. Apesar de o desmatamento e a legislação ambiental terem avançado durante os governos petistas, a economia seguiu baseada em commodities, houve investimento em um modelo de infraestrutura agressivo ao planeta e o agronegócio se fortaleceu.
É preciso reconhecer que avançamos consideravelmente por um lado, sendo, inclusive, o único país a assumir metas brutas para redução de emissão de carbono; por outro, as alternativas de geração de emprego e consumo que oferecemos à sociedade são incompatíveis com um planeta capaz de prover a vida humana por muito tempo.
Quando falamos de meio ambiente, o universo que o termo representa é maior que o sistema solar. O mantenimento dos recursos naturais, não somente para atender as necessidades humanas que nossa sociedade criou, mas, para manter a vida natural, está, hoje, no centro do debate.
Água pura e de qualidade é rara em todo o globo. O Brasil tem a maior biodiversidade do mundo, especialmente nas florestas tropicais. Somos, portanto, o salva-vidas da destruição promovida pelo modelo capitalista. O Brasil é detentor das maiores riquezas do planta Terra (água, minérios, fauna e flora) e é por isso que os EUA se daram ao trabalho de interferir duas vezes em nossa democracia em menos de um século.
O impeachment da presidenta Dilma tem relação direta com a agenda socioambiental, porque o pré-sal e nossa mão de obra estavam na mira. Nossos governos falavam grosso com os EUA. O golpe não foi dado pela direita brasileira, foi dada pelos mais importantes capitalistas do planeta: os agentes que o proporcionaram não passam de ferramentas úteis e descartáveis. Julian Assange alertou a presidenta sobre os grampos telefônicos. As reservas de petróleo estão diminuindo, corroborando a estratégia de Temer para desmoralizar a Petrobras e vende-la a preço de banana para o capital privado e estrangeiro. Some isso a liberação de agrotóxicos e permissão para não-brasileiros comprarem terras por aqui. Tem mais: em um contexto de economia em crise, empregos precarizados pela lei da terceirização e reforma trabalhista, desabastecimento e fome devido a corte nos programas sociais e outras ações pré-orquestradas, não seria difícil para as indústrias estrangeiras ou nacionais a serviço das estrangeiras contratar empregados brasileiros por muito pouco. Mão-de-obra barata, Estado fragilizado, riquezas naturais nas mãos da biopirataria, madeireiras estrangeiras, água privatizada, hidrelétricas mascarando mineradoras e genocídio da população negra, indígena e sem-terra. Este é o plano dos golpistas para nosso futuro.
O único jeito para mudarmos o futuro sombrio que nos aguarda é priorizando, hoje, um modelo de desenvolvimento diferente. Que valorize nossas potencialidades naturais que vão muito além das matrizes energéticas do século passado. A monocultura também precisa ser seriamente discutida, uma vez esse modelo de agronegócio além de favorecer a concentração de terra e exploração do trabalhador rural, é extremamente danosa ao solo, ao ar e à vida humana. Nesse sentido, a Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento do PT tem trabalhado – junto a outras secretarias, acadêmicos, movimentos sociais e Fundação Perseu Abramo – para encontrar um caminho que aponte para um futuro mais justo, sustentável e viável para nosso país.
Infelizmente, nesse 5 de junho não há o que comemorar. Ativistas continuam sendo mortos, o desmatamento vem crescendo, órgãos ambientais fragilizados, agrotóxicos nos ameaçando cada vez mais… é preciso, além de resistir, enfrentar os problemas com propostas. E é nelas que estamos debruçados.
Sejamos resistentes e propositivos. Nunca houve na história melhor momento para construirmos, com o povo, um novo modelo social. Sejamos corajosos para romper com o que precisarmos e estabelecermos novas regras. Padre Amaro segue preso, Lula segue preso, e nós, aqui fora, precisamos ser suas vozes, corpos e almas. Certamente eles querem nos ver altivos, e com altivez seguiremos nossa luta. Todos os dias.
Nilto Tatto
Secretário Nacional de Meio Ambiente e Desenvolvimento