Policial civil é vítima de importunação sexual na Bahia
Leia o depoimento de Lays Macedo, policial civil lotada na Polícia Técnica baiana, na Coordenadoria de Brumado
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No dia 29 de dezembro de 2021, fui vítima de importunação sexual cometida por funcionário terceirizado do Departamento de Polícia Técnica da Bahia, na Coordenadoria de Brumado, dentro do alojamento unissex do Departamento, durante expediente, enquanto usava o espaço para descanso após chegada de uma ocorrência, por volta das 14h00.
O funcionário, com quem tinha uma relação profissional amigável desde quando eu assumi o cargo, em 2016, bateu à porta e pediu para usar o espaço também, ao que permiti a sua entrada, como já aconteceu outras vezes. Aproveitando o momento de descanso, o funcionário se pôs a chupar e lamber a dobra entre meu braço e antebraço esquerdo no momento que me encontrava no colchão superior do beliche, usando meu notebook, até o momento em que o recriminei e o afastei, e ele sair como se nada houvesse acontecido.
Destaco aqui que, na Coordenação Regional de Polícia Técnica (CRPT) de Brumado, há um único alojamento para o uso de todos, de ambos os sexos. Inclusive, a única copa/cozinha disponível na CRPT/Brumado fica dentro do referido alojamento, a qual é utilizada, indistintamente, por todas e todos – funcionários terceirizados, servidores e estagiários. É oportuno destacar que o alojamento na CRPT/Brumado não é usado apenas para descanso, mas como abrigo para os servidores plantonistas que não residem na cidade.
Somente quando tive contato com o superior imediato, no dia 4 de janeiro, por eu não morar na cidade e retornar para casa assim que concluídos os plantões, formalizei a denúncia ao mesmo, por volta das 10h00, numa conversa particular em sua sala. O coordenador recebeu com surpresa e, contrariando o determinado na portaria 207 do ano de 2021 da Secretaria de Segurança Pública da Bahia, não deu imediato início ao processo de apuração, além de me dizer que pensasse sobre o que eu gostaria que ele fizesse com o meu agressor, já que a grave denúncia poderia resultar em demissão do mesmo. Eu saí para atender a uma ocorrência em seguida, mas, antes da saída, fiz um post no meu perfil do Instagram, sem relatar nomes ou cargos, sobre a dupla violência sofrida – a importunação e a revitimização por parte do estado. A partir daí, ao retornar à CRPT, no final do dia, recebi ligações de representantes dos sindicatos de policiais civis e dos peritos técnicos, que me acolheram prontamente.
No dia seguinte, 5 de janeiro, após uma madrugada de crises de ansiedade no alojamento onde fui violada, muito abalada e me sentindo vulnerável, fui à delegacia de Brumado, pouco depois das 8h da manhã, onde fui atendida pelo delegado titular, que imediatamente formalizou o registro da ocorrência, enviou relatório do fato à Corregedoria da Polícia Civil e requereu ao Judiciário medida protetiva em meu favor, proibindo o agressor de aproximação e contato comigo, concedida pelo Poder Judiciário no dia 06 de janeiro.
No dia 17 de janeiro, devido ao estado de adoecimento que os fatos me acarretaram, requeri, após consultas e com embasamento em relatórios da psicóloga que me acompanha, de uma psicóloga do Departamento Médico da Polícia e do psiquiatra disponibilizado pelo plano de saúde, remoção do local onde sofri as violências para trabalhar na Coordenadoria de Vitória da Conquista, local onde tenho acompanhamento clínico e rede de apoio estabelecida, inclusive com a possibilidade de não utilização de alojamento durante o serviço, por residir na cidade. Num primeiro momento, este pedido foi negado pelo meu superior imediato, que ainda sugeriu que eu tentasse uma permuta para uma CRPT numa cidade localizada a quase 300km de onde moro.
Desde então, apesar do afastamento das atividades concedido pela Junta Médica Oficial do Estado, tenho sofrido agravamento do meu adoecimento. Devido à morosidade para resolução da solicitação da transferência, à apreensão em precisar voltar a trabalhar no local em que, comprovadamente, não me garante segurança física e psicológica, e à recente solicitação do meu superior imediato para abertura de uma sindicância contra mim, me acusando de denúncia caluniosa.
Diante do exposto, e certa de toda violência de gênero contra mim, na condição de mulher ocupando um espaço majoritariamente masculino, tenho contado com espaços de apoio para dar visibilidade a toda esta situação e buscar urgentes e necessárias mudanças de cenário social.