Bruno Roger e Tássia Rabelo: O tempo não para
A crise do capitalismo, a polarização com a direita conservadora e a construção de uma nova orientação socialista para o PT “De repente, a história se revela diante dos rebentos…
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A crise do capitalismo, a polarização com a direita conservadora e a construção de uma nova orientação socialista para o PT
“De repente, a história se revela diante dos rebentos de uma nova geração. Os jovens considerados apáticos e indiferentes revestem-se de coragem e ousadia. Uma sensação de esgotamento e saturação aflige a destreza do conformismo. As ruas se transformam em espaço de interação e desabafo. Esbravejo contra as velhas formas de opressão capitalista. Uma vontade ensandecida de mais direitos e de radicalizar numa rebeldia declarada. Rebelar-se contra o destrato em relação à dignidade humana. Rebelar-se contra aquele incomodo comum. Rebelar-se diante de si mesmo e manifestar-se diante de todos. Uma geração desacreditada das velhas formas de fazer política. Inconformada ante os privilégios de classe e suas arrumações rídicas. Uma geração que nega politicamente a política.”
1. A crise internacional e a polarização ideológica
A crise internacional do capitalismo que se explicitou a partir do estouro da bolha imobiliária nos EUA em 2008, se espraiou para a Europa e atingiu duramente a China.
Na Europa, a elevada destinação de recursos do Tesouro Nacional para socorrer bancos privados em muitos países, gerou agravamento dos recursos públicos disponíveis aprofundando o desmonte do Estado de Bem-Estar Social no Continente. As medidas impostas pela União Européia desencadearam uma onda de desemprego (atingindo 45% da mão-de-obra jovem da Espanha, por exemplo), desabastecimento (300 mil famílias tiveram a energia elétrica cortada por falta de pagamento na Grécia) e despejos por falta de pagamento de hipotecas . A retração da economia chinesa em 2012 foi mais uma peça do efeito dominó que, por sua vez, afetou duramente o Brasil .
A crise do capitalismo polarizou ideologicamente o mundo. Partidos de centro ou centro-esquerda que não conseguiram propor alternativas para além do sacrifício dos mais pobres foram tragados em virtude da incorporação de pressupostos econômicos ortodoxos e da política de austeridade. Nos EUA, a adoção de alguns mecanismos keynesianos assumidos pela gestão Obama, impulsionou a radicalização ideológica tendo à frente o discurso raivoso do TeaParty. Obama, a partir de então, foi acusado de socialista e destruidor dos valores de autonomia individual do seu país.
Na Europa, a polarização foi ainda maior e evidente. A extrema direita – conservadora, racista e xenofóbica – emergiu tendo à frente a perseguição de imigrantes que estariam supostamente “roubando seus empregos”. Tal conjuntura nos remete a Europa da década de 1930 em que discursos nacionalistas, também xenófobos e racistas, levaram à ascensão de regimes totalitários como o Nazismo e o Fascismo .
Na outra ponta da “régua ideológica” partidos de tipo novo surgiram na Espanha (Podemos), Portugal (Bloco de Esquerda) e Grécia (Syriza), envolvendo antigos militantes comunistas e socialistas, mas também a juventude que saiu às ruas em protestos gigantescos (como o 15M, da Espanha; greve de 48 horas e manifestações gigantescas em outubro de 2011 na Grécia; além da Revolução das Panelas da Islândia, em 2008, entre outros). Deles se ouviu, desde então, uma profunda crítica à relação promíscua entre grandes empresas e grandes partidos. Tudo foi resumido à denominação de “castas” (políticas e econômicas) que viraram as costas aos cidadãos. A velha polarização entre partidos liberal-conservadores e socialdemocratas europeus foi se desmanchando no ar com muita rapidez e dinamismo. Caso do PP/PSOE na Espanha, PS/PSD/PPD em Portugal, e assim por diante.
2. O fantasma da instabilidade ronda o Brasil
A instabilidade econômica, reflexo da crise internacional, também atingiu o Brasil e afetou as bases em que a política brasileira vinha se firmando. Em 2010, a eleição presidencial já havia emitido sinais. No final do primeiro turno, a candidatura de Marina Silva, pelo Partido Verde, projetou-se e criou a sensação de que parte considerável dos eleitores procurava uma alternativa à polarização PT-PSDB.
Entre os eleitores jovens esse desejo de mudança ficou ainda mais evidente. Na última pesquisa de intenção de voto realizada pelo Datafolha nos dias 01 e 02 de outubro de 2010, Marina aparecia com 16%, mas entre os jovens (16-24 anos) este percentual subia para 20% enquanto representava apenas 11% das intenções de votos de eleitores com 60 anos ou mais, demonstrando um nítido corte geracional nas escolhas eleitorais. Na simulação de segundo turno a negação à continuidade por parte da juventude ficava ainda mais pulsante. Na média, os cenários com Dilma e Serra e Dilma e Marina apresentavam o mesmo resultado: 52% de Dilma a 40% de seus possíveis adversários. Entre os mais jovens, porém, enquanto a diferença entre Dilma e Serra se matinha quase idêntica a média (variação de um ponto percentual), os dados apresentavam empate técnico entre Dilma (49%) e Marina (46%). Nas eleições municipais de 2012, este fenômeno reapareceu com muita força em algumas localidades.
O cenário que se apresenta atualmente é ainda mais duro e complexo. A crise internacional fez ruir também parte dos recursos que financiaram as políticas de inclusão social dos governos petistas. Para citar um único exemplo, vale lembrar que a China investiu diretamente (além das importações) 13,6 bilhões de dólares no Brasil em 2010. Fomos o país que recebeu maior volume de recursos produtivos da China naquele ano. Pois bem, em 2013 o volume de investimentos chineses no Brasil foi apenas 10% do realizado em 2010. Os brasileiros sentiram a instabilidade e a percepção da crise foi se instalando. Em maio de 2013, um mero boato do fim do Bolsa Família estimulou 920 mil beneficiários do programa a sacar todo saldo das suas contas na Caixa Econômica Federal, em apenas três dias. Algo que revelava que o segmento do eleitorado mais fiel ao aos nossos governos já pressentia as dificuldades econômicas em curso.
Finalmente, as eleições 2014 revelaram com nitidez a insatisfação com o sistema político brasileiro em sua totalidade, bem como o sentimento de mudança insuflado na população brasileira. No primeiro turno, as intenções de votos das candidaturas oposicionistas do PSB e PSDB oscilaram drasticamente, bem como o total de indecisos, ou que votariam branco e/ou nulo. Nesta ocasião, a discrepância entre a opinião dos jovens e de eleitores de gerações anteriores também ficou evidente.
Durante parte considerável do primeiro turno Marina se diferenciou de seus adversários na juventude. Sua entrada na corrida eleitoral reduziu as intenções de votos brancos e nulos (mais alta entre os mais jovens) , e na faixa etária entre 16 e 24 anos a candidata chegou a apresentar até oito pontos percentuais acima de sua média de intenção de votos geral, empatando tecnicamente com Dilma novamente, mas nesta eleição, já no primeiro turno .
Apesar dos ataques constantes que sofremos, o profundo processo de mobilidade social que fez com que mais de 40 milhões de brasileiros deixassem uma vida de penúria, gerou uma avaliação positiva sobre o Governo e, em certa medida, sobre o PT. Essa ruptura com trajetórias e histórias familiares de pobreza e marginalidade teve efeitos políticos que permitiram o estabelecimento de uma credibilidade que impediu que o partido que governa o Brasil há 12 anos fosse imediatamente jogado na mesma situação que os partidos social democratas da Europa. A questão é que a história mostra que todo capital eleitoral não é imutável, e o presente nos indica que seu resultado não é o mesmo entre os jovens.
Aqueles e aquelas que não tiveram a vivência material da fome, do desemprego em massa e da completa ausência de perspectiva já demonstraram que não empregam seu voto e sua lealdade política apenas com base no que já foi realizado.
3. Uma perspectiva geracional
As manifestações de junho de 2013, embora envolvesse jovens que em sua maioria não tinha nenhuma identidade partidária ou posicionamento ideológico (ver pesquisa Datafolha sobre perfil dos manifestantes), acabou por contaminar parte significativa do eleitorado que não saiu às ruas. O efeito imediato foi a corrosão de 50% da popularidade do governo federal e de vários governos estaduais e municipais. Neste ponto, vale ressaltar que a inclusão social e o início do rompimento do ciclo intergeracional de pobreza proporcionados pelos governos Lula e Dilma, implicou no empoderamento dos filhos das classes mais pobres. Estes que são os primeiros de suas famílias a ocupar os bancos das universidades, ou a exercer um trabalho bem remunerado em função de sua mão-de-obra qualificada, tornaram-se formadores de opinião. Sua percepção sobre a política passou a influenciar a daqueles que os rodeiam.
A campanha de Dilma em 2014 iniciou a virada na juventude quando acertadamente incorporou a avaliação que fazíamos há tempos: para disputar e conquistar os jovens que não viveram sob a égide do neoliberalismo é insuficiente resgatar e apresentar nossas realizações. Ou seja, neste caso, a tática plebiscitária de comparação de nossos governos com governos anteriores, torna-se inóspita. A militância passou a ter munição para dialogar com a juventude a partir do momento em que a campanha passou a falar de futuro, quando propôs agendas progressistas e novos direitos que demarcaram claramente as diferenças entre os dois projetos em disputa. Foi com a reafirmação da defesa dos direitos trabalhistas, do emprego, do investimento em educação, da necessidade da reforma política, do acesso à banda larga, enfrentamento ao extermínio da juventude negra e à homofobia, que trouxemos muitos jovens para a trincheira de luta que permitiu a recondução de Dilma ao Palácio do Planalto.
Após o momento de ascensão política que se deu no segundo turno das eleições 2014, a insegurança em relação à sustentabilidade do novo patamar de qualidade de vida conquistado por tantos brasileiros e brasileiras na última década, volta a alimentar um potencial sentimento de mudança. Assim, após a inflexão da classe média – principalmente da região centro-sul do país -, setores menos abastados da sociedade brasileira começam a revelar a intenção de procurar alternativas ao PT, e a juventude a confirmar sua suspeita de que nosso partido está esgotado enquanto projeto político. O PT, enquanto ideia, está se diluindo.
Se não há polarizações tão profundas como as que envolvem a Europa e parte dos EUA (como a ascensão da ultra direita TeaParty e das reações autonomistas do Occupy) em nosso país, deve-se à falta de alternativa no sistema partidário (quase sempre pendendo à direita e com plataformas que sugerem mais controle de gastos e enxugamento do Estado, o que assusta o eleitorado pobre), à credibilidade que a inserção social dos últimos anos trouxe e à crise econômica que ainda não atingiu os patamares dos outros continentes.
Contudo, o pacote econômico anunciado pela Presidenta Dilma Rousseff em janeiro deste ano e as Medidas Provisórias nº 664 e 665 que alteram as regras do seguro desemprego, defeso e das pensões, podem criar as condições para que o grau de confiança popular em nosso governo degenere. Tais medidas de cortes e ajustes emanam dos princípios da austeridade e de pressupostos econômicos ortodoxos que, para tanto, lançaram o mundo na mais profunda e terrível crise dos últimos tempos. Pois, baseiam-se, fundamentalmente, na eliminação dos recursos destinados para as políticas sociais e o fortalecimento do Estado em detrimento da rentabilidade lucrativa do grande capital global, especulativo e financeiro.
Além disso, há que se atentar para os sinais de esgotamento no sistema político partidário; os graves efeitos da crise de representação; o surgimento e afloramento de uma nova direita reacionária e conservadora; a correlação de forças no congresso nacional que, por sua vez, não favorece aprovação de medidas mais avançadas; a oposição da grande mídia cada vez mais agressiva aos nossos governos; a criminalização do PT e dos movimentos sociais; a sucessão de escândalos e a banalização da corrupção como forma de detonar ainda mais a credibilidade da política e dos políticos; a crise hídrica e energética que afeta praticamente todo o país; a potencial recessão econômica, gerada pela queda do consumo, aumento da taxa de juros, inflação acima da meta, diminuição do crédito popular, contenção dos investimentos públicos e privados, apreciação cambial, redução da demanda externa, queda no preço das commodities, déficit comercial, dentre outros aspectos da política macroeconômica que influem diretamente na vida do povo.
Tais fatos alimentam o insaciável apetite pelo poder e despertam a plântula golpista da direita brasileira, corroborando ainda mais com os rumores de um aspirado processo de impeachment da presidenta Dilma.
4. A fonte do poder transformador está nas ruas
Estamos atravessando um momento de fortes turbulências em nosso país. Depois de 12 anos a frente do governo federal, ou avançamos de maneira decisiva ou recuamos de forma leniente. Entretanto, para avançarmos faz-se necessário a realização das grandes reformas estruturais, especialmente a reforma política, agrária e tributária. Precisamos impulsionar ainda a democratização das mídias e da comunicação.
No entanto, como conseguiremos tais feitos em um cenário amplamente desfavorável e contando com um dos congressos mais conservadores da história brasileira? Somente com muita mobilização social e unidade no campo popular e da esquerda. Definitivamente, não será o atual congresso nacional que criará a correlação de forças necessária para enfrentarmos a crise sem penalizar os mais pobres e avançar na realização das reformas estruturais que o Brasil tanto necessita. Para que isso seja possível o PT precisa assumir a tarefa de pressionar o governo, de mostrar para a sua base e para a sociedade como um todo, que nossos princípios são inegociáveis. É hora de avançarmos na construção de uma nova hegemonia cultural, disputando os valores e opiniões da sociedade, deslocando a disputa política também para o campo simbólico.
A polarização ideológica ocupará a centralidade da agenda política nacional no próximo período. Faz-se urgente, portanto, um processo de recomposição das forças políticas de esquerda que sustentaram este grande projeto de transformações em curso, mas para que isso seja possível o PT precisa de coragem e ousadia.
Precisamos alterar o modo e o jeito de fazer política no Brasil, sem incorrer no erro de ignorar todo processo histórico que resultou e gerou esta cultura política ateada. Não podemos deixar de dizer que nosso governo combateu e combate de forma decisiva, corajosa e aberta, a corrupção, mas que para prosseguirmos efetivamente na sua superação é necessário fazermos a reforma política com voto em lista pré-ordenada, proibição do financiamento privado e das coligações proporcionais, e paridade de gênero. Apenas assim democratizaremos a democracia, e criaremos mecanismos que coíbam a influência do poder econômico nas eleições, atacando a promiscuidade mórbida que existe entre a elite econômica financeira e a elite política.
Indo adiante, a esquerda precisa resguardar-se do voluntarismo impulsivo que tende a contaminar e putrificar a ação política de determinados agentes. Se estamos construindo uma nova sociedade dentro da perspectiva do materialismo dialético, torna-se pressuposto inarredável compreendermos e potencializarmos as contradições inerentes a cada etapa histórica. Não podemos perder de vista a disputa política ideológica que deve ser travada através de uma incessante e permanente batalha de idéias. A disputa de hegemonia e a formação de uma maioria popular capaz de incorporar um novo e avançado conteúdo programático apresentam-se como condição indispensável para vencermos os desafios históricos que estão colocados.
Neste sentido, vale renovarmos as estruturas partidárias e o modo de fazer política, adotarmos uma nova postura diante da sociedade e concretizar o sonho de construirmos um partido de massas que atue em total sintonia com os anseios do povo brasileiro. Nós queremos um PT com o rosto novo, mas que este novo rosto tenha forma definida e própria, não sendo apenas uma bela produção de maquiagem e pó de arroz.
5. O PT está se diluindo enquanto ideia
Os governos do PT mudaram os rumos da história do Brasil. O PT é um partido que nasceu da esperança de milhares de trabalhadores e trabalhadoras, artistas, militantes das organizações de esquerda que combateram a ditadura, estudantes, militantes das CEB’s (Comunidades Eclesiais de Base), dentre outros agrupamentos e setores progressistas que defendiam a retomada da democracia. Um partido que surgiu na contramão da via prussiana. Que nasceu de baixo para cima. Um partido que cresceu em consonância com o sentimento popular, fruto de muitas lutas sociais e políticas.
Durante tempos ostentamos a volição da mudança. Não podemos admitir que o PT seja, hoje, percebido ou reconhecido como o partido da conservação do status quo. É necessário que revigoremos o espírito de lutas da militância, reafirmando nosso compromisso histórico com o projeto socialista. Para isso, precisamos de uma analise correta da atual conjuntura e uma ação capaz de nos reposicionar no cenário político, fortalecendo a idéia de que ainda somos a alternativa concreta e possível de mudança da realidade lamuriosa que aflige o povo brasileiro.
Não podemos admitir que o PT seja decomposto em uma maquina eleitoral e tenha seu papel histórico reduzido ao de uma legenda qualquer. Assim, cabe um vertiginoso processo de autocrítica a fim de reafirmar veementemente as dimensões estratégica, histórica e revolucionária de nosso projeto.
Durante os 35 anos de existência do partido, vale reconhecer o quanto evoluímos e crescemos, contudo, vale também reconhecer que é necessário reposicionarmos estrategicamente o PT ante a nova conjuntura e seus elementos que formam um mosaico de perspectivas, desafios e oportunidades. Se estamos a pouco mais de uma década liderando um governo de coalização que transformou profundamente a vida do povo brasileiro e mudou os rumos do país, é chegada a hora de refletirmos sobre os limites e esgotamento da estratégia adotada e da tática colaboracionista, bem como avaliarmos os impactos deste processo no interior da organização partidária.
A situação de muitos diretórios do PT país a fora é deplorável e já percebemos os efeitos cogentes do estapafúrdio mal da degeneração burocrática e da decadência ideológica. Existe uma diferença substancial entre fazermos opção tática pela via institucional, como meio para atingirmos determinadas metas estratégicas, e, por outro lado, ficarmos restritos à luta institucional, uma vez que seus riscos são eminentes e historicamente comprovados. Por isso, nós não podemos permitir que os rumos do PT repousem absortos nas mãos de certos agentes que carecem de visão estratégica e perspectiva histórica.
Fazemos parte de uma geração politicamente estigmatizada. Uma geração que convive com a pecha do desinteresse e da desmotivação pelas formas tradicionais de participação política. A maior geração de jovens que o Brasil já teve, mais de 50 milhões de pessoas entre 15 e 29 anos. O que significa uma série inesgotável de possibilidades políticas e econômicas, mas também de desafios.
Fazemos parte também de uma geração que precisa retomar a identidade política e ideológica de esquerda. Que tenha capacidade de buscar na fonte da história inspiração para a luta cotidiana e elementos para interpretação da realidade. Nós precisamos resgatar o sonho de uma nova sociedade, disputando valores e opiniões no campo simbólico e no imaginário popular.
Há que se preocupar com os rumos do PT, do Brasil e do mundo. Que se questionar se o PT está cumprindo, tal como afirmava Gramsci, o papel básico de um partido de esquerda: o de contribuir para a elevação da consciência de classe, superando marcos dos interesses puramente imediatos, economicistas, corporativos, para o nível da visão global da realidade, forjando uma “vontade coletiva nacional-popular”, capaz de hegemonizar um projeto político nacional de construção de uma sociedade socialista.
6. O tempo não para
Não há dúvidas de que as primeiras gerações do PT foram vitoriosas e cumpriram tarefas históricas centrais para a retomada e construção da democracia brasileira, mas para darmos o passo seguinte será necessária uma efetiva e profunda ruptura geracional, capaz de reoxigenar as estruturas partidárias, dinamizar os processos internos e, acima de tudo, retomar nossa relação com a sociedade brasileira, especialmente com a juventude.
Ao longo dos últimos anos distanciamo-nos por demais da própria evolução dos tempos. Não podemos ficar estancados. Precisamos compreender as grandes transformações inerentes ao século XXI. O mundo mudou e o Brasil não é mais o mesmo. A mudança é uma constante na história e acontece de forma cada vez mais rápida, fluida e dinâmica. Evidentemente, que o PT teve papel central nas transformações que incidiram em nosso país, no entanto, estamos vacilando diante de um processo de agudização das contradições intrínsecas à sociedade brasileira.
A atuação do PT somente será efetiva se não abandonar o contato com as massas, construindo de maneira coletiva, horizontal e colaborativa, respostas para os atuais problemas que demudam a realidade. Nós precisamos impedir que o partido descole-se da vida prática e caia em um governismo estéril e de gabinete.
Não podemos nos eximir da responsabilidade histórica de nossa geração. A geração que fundou o PT cumpriu, cumpre e, certamente, continuará cumprindo um papel importante na condução do Partido. No entanto, já percebemos sinais que apontam para a necessidade urgente de um processo de reformulação-renovadora da concepção, modelo, forma, conteúdo e, especialmente, das idéias.
Precisamos transformar o PT em um partido verdadeiramente de massas e das massas. Um partido que consiga restabelecer o dialogo com a sociedade e incendiar corações e mentes. Um partido que acumule forças e seja propulsor da disputa de hegemonia. Precisamos disputar as opiniões da sociedade. Precisamos devolver ao PT à condição de patrimônio popular, forjando uma nova utopia revolucionária. Sermos intransigentes na busca pela reforma intelectual e moral do povo, construindo novos valores, contrários aos valores do capitalismo global, pavimentando, desta forma, o caminho para a realização do socialismo em nosso país.
Um socialismo com a cara do Brasil. Que contemple a diversidade do nosso povo e da nossa gente, levando em consideração a tradição histórica e cultural que tanto enrijece as raízes brasileiras. Um socialismo que transforme o Brasil no pólo irradiador de outro mundo possível. A começar pela América Latina e Caribenha, mas a espalhar-se pelo mundo.
Deste modo, transformar o PT em um partido de massas e das massas, não apenas com milhões e milhões de filiados e filiadas, mas formando uma combativa militância identificada com nosso programa e com nossas lutas, é condição necessária para avançarmos na disputa real da sociedade brasileira e modificarmos definitivamente a correlação de forças historicamente arraigada nas instituições anacrônicas do Estado e também na sociedade.
O PT deve ser também um lugar de reflexão ideológica, atuando de maneira educativa e pedagógica no sentido de aumentar substancialmente a influencia política dos “de baixo” nas tomadas de decisões. O PT não deve lutar apenas pelo poder, mas também por uma revolução cultural, pela criação e desenvolvimento de uma nova cultura, baseada em outros valores e outras perspectivas históricas. Nesta linha, dispomos de uma energia geracional acumulada e concentrada em nosso país que, por sua vez, deve ser inexoravelmente canalizada na luta contra hegemônica, a fim de criar as condições materiais e simbólicas para o surgimento do novo.
O que está em jogo é um novo ciclo na política nacional e mundial. Estamos diante de um processo histórico de transformação que incidirá nos rumos do Brasil e do mundo, por isso é fundamental disputarmos os caminhos estratégicos do PT, pois este deve continuar sendo a ferramenta dos “de baixo” para intervir nas grandes decisões e fazer a disputa contra os “de cima”. Não podemos pensar e construir o futuro a partir do presente, mas, ao contrário, temos que pensar e construir o presente a partir do futuro. Pois, o horizonte estratégico que orienta e motiva nossa caminhada – para aqueles que fazem a disputa política na perspectiva do materialismo histórico e dialético – é a sociedade sem opressores e oprimidos, a sociedade livre e igual, a sociedade SOCIALISTA.
Bruno Roger e Tássia Rabelo são da direção nacional da Juventude do PT