CGU aponta retrocesso na transparência durante governo Bolsonaro
Constatação é resultado da revisão determinada pelo presidente Lula sobre as imposições de sigilo de 100 anos durante o governo de Jair Bolsonaro
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A Controladoria-Geral da União (CGU) identificou abusos por parte do governo de Jair Bolsonaro ao impor sigilo a documentos da administração federal. Segundo o ministro Vinícius Marques de Carvalho, em vários casos, foi feita uma interpretação distorcida da legislação para justificar a imposição de sigilo.
“Se identificava uma informação ou outra dentro de um documento que eventualmente pudesse ser sigilosa, um sigilo bancário, alguma coisa assim, e se determinava que o documento inteiro ficava sigiloso. Não é essa a interpretação da lei”, enfatizou Carvalho, que apresentou, nesta sexta-feira (3), o resultado da análise das regras de sigilo determinada pelo presidente Lula.
Como próximo passo, a CGU vai agora analisar 234 pedidos de acesso a documentos via Lei de Acesso à Informação. Pela explicação do ministro, a expectativa é de que muitos pedidos devem ser concedidos. “O sigilo deve ser interpretado restritivamente. Se há um documento em que se identifica a presença de informações ou dados pessoais cuja sensibilidade merece alguma restrição, esses dados podem e devem ser tarjados, mas o documento não se torna inteiro sigiloso por conta disso”, lembrou Carvalho.
Regras mais claras
A reavaliação dos sigilos foi determinada pelo presidente Lula em despacho assinado no primeiro dia de mandato. Com a análise, a CGU está também restabelecendo as regras para imposição de sigilo, definindo, por exemplo, que informações como registros de entrada e saída de prédios públicos e procedimentos disciplinares de militares são passíveis de acesso público.
O trabalho resultou em um parecer técnico que servirá de modelo para o procedimento de revisão dos pedidos a serem avaliados. Além disso, também foram elaborados 12 enunciados temáticos sobre situações concretas que podem ser objeto de pedidos de acesso.
Conheça a íntegra dos enunciados
O parecer apresenta informações gerais sobre o direito de acesso à informação conforme as normas prescritas na Lei nº 12.527/2012 e a delimitação de parâmetros a serem observados quando da aplicação do regime de restrição de acesso à informação (com análise das bases legais que autorizam a restrição de acesso, nos termos do princípio da máxima divulgação).
Além disso, o documento orienta sobre a aplicação das normas de transparência nos recursos que tiverem como objeto assunto relacionado aos eixos temáticos do despacho presidencial: proteção de dados pessoais,
64,5 mil pedidos negados
A CGU trabalhou a partir de um filtro realizado no universo de 64.571 pedidos de acesso à informação negados, total ou parcialmente, pelos órgãos da administração pública federal, no período de 2019 a 2022. O estudo se concentrou nos casos que chegaram até a terceira instância recursal (CGU) e tiveram a negativa de acesso mantida, num total de 1.335 decisões.
A análise quanto à necessidade de revisão das decisões foi realizada em quatro etapas: criação do grupo de trabalho; análise e sistematização de todos os recursos para identificar os principais fundamentos usados para restrição de acesso à informação; elaboração das teses sobre os quatro eixos temáticos mais recorrentes; e seleção dos casos que serão analisados ou revisados pela CGU.
A partir das conclusões do trabalho, a Controladoria examinará os 234 casos concretos. Desse conjunto, 111 são referentes a segurança nacional; 35 são relativos à segurança do presidente da República e seus familiares; 49 são afetos a informações pessoais; 16 versam sobre segurança nacional; e ainda 23 sobre assuntos diversos.
Recomendações ao Poder Executivo
A CGU também estabeleceu três recomendações destinadas aos órgãos do Poder Executivo Federal, cujo objetivo é aprimorar os mecanismos envolvidos no cumprimento da Lei de Acesso à Informação. A primeira delas é a de que os órgãos revejam seus fluxos de classificação e, principalmente, de desclassificação de informações públicas, de modo a permitir que, uma vez expirado o prazo de classificação, a informação ou documento seja proativamente publicado.
Outra recomendação é para que a Comissão Mista de Revisão de Informações (CMRI) se adeque à nova composição do governo, bem como promova um controle efetivo sobre o ato de classificação, considerando os indícios de uso excessivo da prerrogativa de classificação por parte de alguns órgãos públicos.
Por fim, a Controladoria recomenda que, durante a instrução de recursos de acesso à informação, sempre enviem, quando requisitados, as informações objeto de disputa à CGU, para análise. Nesses casos, caberá à CGU manter a restrição de acesso sustentada pelo órgão público até a tomada de decisão final a respeito da natureza restrita ou não da informação.
Fortalecimento da Lei de Acesso à Informação
A CGU adotará, ainda, nove ações visando o fortalecimento do Sistema de Acesso à Informação.
– Fortalecimento do Conselho de Transparência Pública e Combate à Corrupção;
– Criação do programa de orientação e capacitação para a melhoria do acesso à informação para a rede de SICs e Autoridades de Monitoramento da LAI;
– Avaliação qualitativa de respostas a pedidos de acesso à informação, com uso de inteligência artificial, para reduzir recursos a instâncias superiores;
– Padronização de procedimentos e proposição de atos normativos para a prestação de informação pública;
– Emissão de orientações para harmonização da garantia do acesso à informação com outras legislações e direitos (ex. LGPD);
– Promoção da LAI como instrumento de participação social, por meio de articulação juntos a organizações da sociedade civil para projetos de orientação e capacitação para o acesso à informação;
– Promoção da LAI para estados e municípios;
– Aprimoramento dos entendimentos, com elaboração de enunciados e estudos;
– Aprimoramentos normativos para o fortalecimento da capacidade de monitoramento e supervisão da CGU.
Da Redação, com CGU e Jota