De volta para o futuro: a saída da encruzilhada do PT é para a frente
As notícias não são boas, o clima é ainda pior. De um lado, o mais extenso e agressivo ataque sofrido por um partido político na história recente do Brasil. De…
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As notícias não são boas, o clima é ainda pior. De um lado, o mais extenso e agressivo ataque sofrido por um partido político na história recente do Brasil. De outro, acusações de letargia e de impedimento das propostas de mudanças estratégicas na sua organização e programa, durante o 5º Congresso Nacional. Em uma ponta, o PT se apresenta como vítima da grande mídia, onde o espaço reservado ao PT é o de inventor e monopolizador da corrupção.
Percebe-se claramente que mesmo sem ter propostas e líderes, a direita nacional consegue desenvolver uma estratégia para retomar hegemonia, inclusive em articulação com interesses internacionais, a exemplo do ocorrido em Caracas quando da visita injustificável da delegação parlamentar protagonizada pelo Senador Aécio. Na outra, a postura defensiva do partido não encontra eco na sociedade e a percepção popular sobre os escândalos e sobre o desgaste dos anos de governo é real e concreta – vide a pesquisa Datafolha que, pela primeira vez, aponta empate técnico entre petistas e tucanos como preferidos do eleitorado nacional.
Diante desse cenário é correto afirmar que o Partido dos Trabalhadores se encontra na maior encruzilhada histórica de sua jovem vida.
Militantes, dirigentes, intelectuais, gestores e parlamentares do PT – e da Esquerda Brasileira como um todo – levantam importantes questões sobre essa realidade. Há saída para essa crise? É possível sair da defensiva e reagir? O PT ainda é capaz de liderar o projeto contra-hegemônico no Brasil? Sim, a nosso ver, todas essas perguntas tem resposta afirmativa. Entretanto, quando questionado se é necessário um retorno às origens, o resgate dos seus anos de fundação, quando se é sugerido que retornemos a ser o PT da década de 1980, a proposta que passamos a defender aqui é: não.
O Partido dos Trabalhadores é a melhor experiência de um partido de esquerda das Américas e, definitivamente, é o maior patrimônio e o principal instrumento político da classe trabalhadora brasileira pela sua capacidade de inovar, de ousar, de criar novas utopias, novos olhares, novos caminhos e novas formas de caminhar. É a capacidade de construção de novas sínteses que fez o PT protagonista da luta do seu tempo, pensando sempre adiante.
Senão, vejamos.
Quando, no final dos anos 1970, início dos anos 1980, sindicalistas, organizações marxistas tradicionais, intelectuais, artistas e militantes de base da Igreja se reuniram para fundar um novo partido, foi para perpetuar alguma experiência anterior? Não. Foi para criar algo novo, uma nova experiência. E assim nasceu o PT. Um partido que se inspira na luta trabalhista, mas que é formado, dirigido e representado por trabalhadores.
Quando, ainda nos idos de 80, trabalhadores de todo o Brasil apoiaram a criação do PT, da CUT, do MST e etc, foi para fazer algum tipo de resgate de tempos passados? Também não. Foi para a constituição de instrumentos engajados na luta democrática, contra a Ditadura, mas que não admita a via institucional como única arena possível – que enxergava, organizava e disputava os movimentos sociais, a sociedade civil, a cultura política nacional.
O PT nasce assim, como uma inovação ao que havia – e não como um resgate. O PT busca o novo, o inédito.
Nos anos 1990, no lugar de buscar resgatar reformas, agendas e métodos de algum pretérito “ano dourado”, o PT criou novas lideranças e consolidou novos movimentos sociais. Criou novas agendas, disputou e conquistou novos direitos. Foi por não abrir mão do seu caráter vanguardista que o PT revolucionou os parlamentos e os governos locais, por exemplo, com o Orçamento Participativo.
Outro exemplo? Quando muitos apostavam que o partido carregaria o ranço do isolacionismo, o PT inovou ao mostrar que é possível – e necessário – construir com quem pensa diferente. Montou uma política de alianças de unificou a esquerda, disputou o centro e dividiu a direita, viabilizando a vitória do companheiro Lula em 2002, consolidando o caminho do nosso campo na Argentina, Equador, Bolívia, Uruguai, Chile, entre outros, impediu o avanço do neoliberalismo através do nefasto Acordo de Livre Comércio das Américas e abriu novas avenidas de diálogo e cooperação com parceiros do Sul, reaproximando o Brasil da África, e participando da criação do bloco Brics com um novo player global.
Assim, não defendemos o retorno ao passado como janela para o futuro do PT. A resposta do partido aos desafios atuais não será o resgate de agendas do tipo Não a ALCA, Diretas Já ou o Modo Petista de Governar. É preciso ousar novamente, ser de novo e sempre criativo. É necessário abandonar o papel de vítima e construir um discurso que, sim, faça uma séria e construtiva auto-crítica, mas que aponte novos caminhos, novos horizontes.
Deve-se aí responder aos desafios colocados pela Carta de Salvador, aprovada no último congresso, em que se defende a criação de “poderoso movimento de massas que – articulado à luta institucional, às ações efetivas e corretas de governo e à batalha cultural – seja capaz de impor uma situação de cerco ao Estado oligárquico […]” e um programa de reformas estruturais que “[…]pressupõe a construção de uma frente democrática e popular, de partidos e movimentos sociais, do mundo da cultura e do trabalho, baseada na identidade com as mudanças propostas para o período histórico em curso”.
Tal resposta não será vitoriosa se não contemplar a construção de um PT contemporâneo do povo brasileiro, capaz de interpretar, assimilar e atuar junto a uma sociedade que mudou profundamente e que nós próprios contribuímos para transformar.
Temos fórmula pronta? Obviamente não. Mas percebemos algumas pistas que estão no ar, como a luta pela Reforma Urbana, o repensar as cidades, o direito ao território e novas formas de socialização. A luta pelo direito e pela democratização da Comunicação, pela construção de uma política de Segurança Pública cidadã e eficaz na tarefa de poupar vidas, são outros pontos cruciais para a rearticulação da frente ampliada e progressista que possibilitou nosso triunfo nas eleições de 2014.
Isso não se fará por meio de uma viagem ao passado, ao tempo em que tínhamos 12% do eleitorado e baixa capacidade de concretizar alianças com outras forças políticas. Um programa de reformas estruturantes, cujo debate envolva um arco extenso de atores sociais, para além da dinâmica já estabelecida entre o Partido e seus parceiros históricos, e que consiga alcançar a academia, os artistas, o meio jurídico, setores progressistas das igrejas, entre outros, é estratégia que deve ocupar os dirigentes do PT no processo de saída da citada encruzilhada histórica. Diante da indecisão sobre os próximos caminhos, é desejável um olhar mais detido ao redor, mas, no caso do avanço da luta do povo, jamais contemplar a possibilidade de fazer o caminho de retorno. Nossa volta é para o futuro.
Éden Valadares, 33 anos, é militante do PT desde 2001, ex-secretário de juventude do PT da Bahia e atual Assessor Especial do Ministério da Defesa.
Fernando Pacheco, 29 anos, é militante do PT desde 2005, membro da executiva nacional da JPT e assessor de relações internacionais da Secretaria Nacional de Juventude.