Ipea: País caminha para envelhecimento da população
País fica mais velho e surge uma outra geração “nem-nem”: com 50 anos, nem tem qualificação para permanecer no mercado de trabalho, nem consegue se aposentar
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O Brasil desacelera no quesito demografia, a ciência que estuda os movimentos populacionais. Dois fenômenos simultâneos e complementares foram identificados e viraram tema de análise do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), para comprovar a afirmação.
O envelhecimento da população, fato identificado há algum tempo, agora faz par com a redução do crescimento populacional. Na prática, o que ocorre: além da velhice chegar para um contingente proporcionalmente maior, nascem menos brasileiros para atender à reposição natural.
O resultado disso é que, daqui a 35 anos, em 2050, 60% dos brasileiros em idade economicamente ativa vão ter mais de 45 anos, invertendo a pirâmide até aqui predominante, na qual a maioria do povo tinha faixa de idade mais jovem. Outras projeções dão conta de que as 14,5 milhões de crianças entre 4 e 6 anos de idade de hoje serão só cinco milhões em 2050; e as 32 milhões entre 5 a 14 anos atuais não vão passar de 13,8 milhões de indivíduos na metade deste século.
O estudo que fala sobre o assunto foi publicado, esta semana, pelo Ipea. “Novo regime demográfico: uma nova relação entre população e desenvolvimento econômico” é a reunião de 21 trabalhos de 25 pesquisadores do instituto.
Rombo – Os estudos fazem um alerta: as contas para bancar saúde pública e previdência social no futuro não batem. O contingente maior de população idosa vai requerer mais atenção à saúde e ampliação das demandas previdenciárias, mas, ao mesmo tempo, o grupo produtivo, responsável pelo pagamento da conta (via contribuições do trabalho e pagamento de impostos) entra em declínio numérico.
“Você tem uma balança desequilibrada”, informou a especialista Ana Amélia Camarano, em entrevista ao programa Panorama Ipea, do canal web do instituto. Ela é técnica em planejamento e pesquisa.
Segundo Ana Amélia, os estudos indicam que os impactos desse fenômeno sobre o país serão imensos. Serão de ordem fiscal, com a perda de receita e aumento de gastos com saúde e previdência; perda na taxa de poupança nacional, pois idosos tendem a poupar menos e gastar mais; queda na produtividade, pois quanto mais velha, menor a produção da população; e implicação no empreendedorismo: a população envelhecida tem menos estímulos, oferece menos inovações e ideias novas – atitudes mais presentes em pessoas jovens.
Há indicativos de repercussões também na estrutura da economia. Isso porque os velhos tendem a consumir menos e produtos diferentes daqueles consumidos pela população mais jovem. O mesmo deverá ocorrer em relação às divisões sociais, pois a idade mais avançada produz atitudes mais conservadoras, inclusive do ponto de vista político – o que intensificará a dicotomia entre as faixas de idade.
O impacto positivo, na visão de Ana Amélia Camarano, é ambiental, pois o padrão do consumo do idoso é de gastar menos água e deteriorar menos a terra com a produção de alimentos. “Isso deveria servir de exemplo para outros grupos etários, é um padrão ecologicamente mais sustentável de dieta”, explica.
Fatores – A especialista afirma que o principal fator do envelhecimento é a queda da fecundidade (taxa que mostra a quantidade de filhos gerados por uma mulher), responsável pela mudança de pesos na distribuição da população por idade.
“A fecundidade em alta resultou no baby boom (explosão de nascimentos) das décadas de 50 e 60, mas essa população está sobrevivendo muito e isso reduz a massa de poupança para pagar os custos previdenciários”, diz Ana Amélia.
“Teremos problemas para fechar a conta”, acentua a pesquisadora. Segundo ela, o grande esforço do país, de agora em diante, será fazer com que os jovens de hoje se tornem muito mais produtivos. “Um número muito menor (de gente) terá de gerar renda muito maior, e daí tirar o financiamento (da previdência)”, alerta.
A solução do problema, diz Amélia, está nas políticas públicas para educação com capacitação continuada, que permitam ao indivíduo acompanhar e se adequar às mudanças no campo do conhecimento. Segundo ela, é preciso também investir na saúde funcional, que vai retardar a aposentadoria, e na mobilidade, pois “demorar no deslocamento afeta a produtividade”.
Dever de casa – A importância desses investimentos deve-se, segundo ela, ao fato de quase 70% dos nascimentos dos próximos 20 anos estejam na faixa da população mais pobre, sem recursos para gastar em conhecimento e produtividade pessoal. O dever de casa hoje, afirma, é preparar a população para envelhecer de forma produtiva e competitiva.
“Mais investimentos em educação e saúde vão compensar o menor número de entrantes (no mercado de trabalho), que são as pessoas que terão de financiar o custo do envelhecimento”, afirma. “A ausência de políticas para preparar a população já começa a produzir uma nova geração “nem-nem”, que não é a dos jovens que não estudam e nem trabalham”, relata a pesquisadora.
Os novos “nem-nems”, na faixa de idade de 50 anos, estão fora do mercado de trabalho, tem baixa escolaridade e não conseguiram contribuir para a aposentadoria. “O aumento da expectativa de vida poderia levar a se pensar que é possível sair mais tarde do trabalho, o que não está acontecendo”, analisa Ana Amélia.
Para o professor Jorge Arbache, da Universidade de Brasília (UnB), que também participou do programa, está na hora de começar a se repensar a idade média da aposentadoria no país. “O Brasil vai ter de se aposentar mais tarde”, sugere. Para ele, sem ambiente para gerar conhecimento, ensino melhor e riquezas, as dificuldades não tardarão a chegar.
Por Márcio de Morais, Agência PT de Notícias