Pacto Nacional contra Feminicídios: desafio é envolver todos os estados

Ministra das Mulheres destaca avanços à frente da pasta, envolvimento de Lula contra violência de gênero, fortalecimento federativo e retomada da participação social

Fábio Rodrigues Pozzebom - Agência Brasil

"Lula agora é líder desse movimento para a gente interromper esse ciclo de violência contra as mulheres", diz a ministra Márcia Lopes

Um país de dimensões continentais, com mais de 110 milhões de mulheres. Ao assumir o Ministério das Mulheres em maio deste ano, Márcia Lopes, assistente social e professora aposentada da Universidade Estadual de Londrina (UEL), encarou a missão de percorrer o país para conhecer as reais necessidades das mulheres brasileiras e promover um Brasil em que elas sejam mais protegidas, respeitadas, protagonistas e com acesso efetivo às políticas públicas, para além da abordagem exclusiva na violência. 

Em entrevista à Secretaria Nacional de Mulheres do PT, a ministra destacou os principais desafios e avanços da pasta. Com o objetivo de fortalecer o diálogo interministerial, Márcia Lopes tem percorrido a Esplanada e se reunido com ministros e ministros para compreender as ações já em curso e as lacunas existentes no atendimento às mulheres. Ela ressalta a necessidade de apoio institucional, e a cooperação de todo o governo para a execução de programas e políticas públicas.

Por meio das três secretarias — Secretaria Nacional de Articulação Institucional, Ações Temáticas e Participação Política (SENATP), Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres (SENEV) e Secretaria Nacional de Autonomia Econômica e Políticas de Cuidados (SENAEC) — o Ministério realiza ações com foco na promoção de direitos, incentivo à participação social, fortalecimento de equipamentos públicos e na articulação interfederativa com estados e municípios.

“Aceitei essa tarefa árdua, que já vinha sendo realizada pela ex-ministra Cida Gonçalves ao longo de dois anos e meio, a partir do que já existia no Ministério, aprimorando e ampliando as ações”, relembrou Márcia Lopes.

“A tarefa que assumi é passar por todos os ministérios — faltam poucos — para entender e conhecer o que já se faz e o que ainda precisa ser feito nas áreas da saúde, educação, assistência social, previdência, trabalho, indústria e comércio, entre outras políticas públicas setoriais”, explicou.

Nos sete meses à frente do Ministério das Mulheres, visitou 21 estados, onde se reuniu com governadores, parlamentares, movimentos sociais e entidades. “Entendemos que, sem esse fortalecimento federativo, não conseguiremos atingir as mulheres que estão em todo o Brasil”, afirmou.

Violência contra as mulheres: enfrentamento e pacto nacional

A ministra ressaltou que a violência é uma característica estrutural e cultural, não apenas responsabilidade do Estado, mas de toda a sociedade. “Obviamente quanto mais acesso às políticas públicas, quanto mais informação, quanto mais participação as mulheres tiverem, menos elas sofrerão violência”, observou a ministra.

Com os recentes casos de feminicídios que chocaram o país, o presidente Lula assumiu o enfrentamento à violência contra a mulher como uma bandeira. “Ele agora é líder desse movimento para a gente interromper esse ciclo de violência contra as mulheres, principalmente o feminicídio.”

Ela defendeu ainda a necessidade de mudança de atitude, especialmente no que diz respeito à falsa ideia de que a violência no espaço privado é aceitável. Márcia Lopes relembrou a reflexão da presidente do Tribunal Superior Eleitoral e ministra do Superior Tribunal Federal, Cármen Lúcia, ao destacar que o réu, no momento em que vai receber a pena, fica admirado porque, para ele, crime só é o praticado na rua, e não dentro de casa. “Alguns homens têm essa ideia de que no âmbito privado se pode fazer qualquer coisa. Então essa é uma realidade fruto do próprio sistema global que nós temos.” 

Prevenção, educação e papel da mídia

Márcia Lopes informou que tem reivindicado que o Ministério da Educação (MEC) faça a regulamentação de lei que estabelece o ensino da Lei Maria da Penha nas escolas, porque, para ela, é disso que o país precisa: que desde crianças as meninas e os meninos entendam a dimensão da igualdade de gênero, do direito das mulheres viverem sem violência. 

Durante a sessão na Câmara dos Deputados, ela ressaltou o diálogo com o MEC para levar o protocolo de enfrentamento às violências para universidades e institutos federais. O Ministério prevê, em 2026, ampliar acordos que incorporem a Lei da Igualdade Salarial.

Como parte do enfrentamento à violência, ela defende “o investimento na prevenção, na aplicação das leis, na mudança dessa cultura e dessa mentalidade”. Por isso, em sua avaliação, a imprensa exerce papel fundamental.

“Quantos mais veículos de comunicação entram nesse movimento de denúncias, falando disso, fazendo chegar informação em todos os lugares, como mulheres, especialmente e os homens porque eles têm que mudar, porque são eles os grandes responsáveis ​​por essa matança, como disse o presidente Lula”, afirmou.

Pacto Nacional contra o Feminicídio

Como parte da estratégia de enfrentamento à violência, há o Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios, instituído em março de 2024 . Segundo Lopes, a iniciativa conta com a parceria de 11 ministérios por meio de comissão interministerial, além da parceria de 19 estados, que já reforçaram a adesão ao Pacto. O objetivo é fazer com que os 26 estados mais o Distrito Federal assinem compromisso. 

“Não pode ser só um compromisso político, tem que ser um compromisso concreto. E eu tenho ido em caravanas, e falado com os prefeitos. Porque se cada prefeito ou prefeita disser todos os dias ‘aqui nesse município não teremos violência contra a mulher’ muda isso, e a população vai introjetando porque alguém está falando alguma coisa que diz respeito à atitude, seja um empurrão, um xingamento, uma ofensa, um tapa, até o feminicídio”, sugere a ministra.

Vinte anos do Ligue 180

Criado em 2005, durante o primeiro governo do presidente Lula, a Ligue 180 – Central de Atendimento à Mulher

completou 20 anos. No período, foram realizados 16 milhões de atendimentos. Até outubro deste ano, mais de 520 mil mulheres registraram algum tipo de violência pela Central. 

O serviço funciona 7 dias por semana e 24 horas por dia, e conta com uma equipe de atendimento de 350 mulheres que recebem denúncias e localizam onde a vítima mora, orienta, encaminha, articulada com os serviços da ponta. 

“É um trabalho fundamental. Então se a sociedade usar o 180 muita coisa pode melhorar”, defende o ministro. Ela revelou que esteve reunida com a farmacêutica Maria da Penha, que deu nome à lei 11.340/2006, onde debateram sobre a busca de novas formas e estratégias para ampliar a rede de proteção às mulheres, pois “muitas mulheres têm medo de ligar para o 180, ou não conhecem o serviço.”

Gestão, orçamento e execução de políticas

A ministra destacou os desafios na execução de emendas parlamentares, que devem atender aos requisitos de adequação técnica e jurídica, mas reafirmou o compromisso em cumprir-las com responsabilidade.

“Estávamos com a execução orçamentária muito baixa. Mas agora vamos efetivar em algumas áreas praticamente 100% do orçamento”, informou. As ações são voltadas para a Promoção da Igualdade de Direitos, Autonomia Econômica das Mulheres e Cuidados, com orçamento disponibilizado de R$ 27,7 milhões.

Durante a apresentação na Câmara Federal sobre a aplicação de emendas para ações do Ministério das Mulheres , o ministério detalhou a execução de R$ 108 milhões em emendas parlamentares. Do total, foram R$ 33 milhões de relatoria setorial de Mulheres e Direitos Humanos e R$ 75 milhões de emendas individuais.

A pasta aplicou R$ 79,2 milhões em recursos para as iniciativas, que incluem os programas: Mulher Viver sem Violência, Autonomia Econômica das Mulheres e Igualdade de Decisão e Poder para as Mulheres.

O Programa Igualdade e Poder de Decisão para as Mulheres, voltado ao fomento da participação efetiva das mulheres nos espaços de poder e decisão, também apresenta previsão de execução de 100% de seu orçamento, no valor de R$ 34,5 milhões. A ministra destacou, ainda, que houve aumento da liquidez orçamentária superior a 20%, na comparação entre os anos de 2024 e 2025.

Estrutura do Ministério e Articulação Federativa

Márcia Lopes, que já foi ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome no primeiro mandato do presidente Lula, explicou que a pasta conseguiu articular a ampliação de Organismos de Políticas para Mulheres. 

“Temos o interesse de que todos os estados tenham uma Secretaria de Estado de Políticas para as mulheres;

Retomada da participação social 

O incentivo à participação social sempre foi marca dos governos do presidente Lula. Por isso, um dos principais destaques deste ano foi a realização – após 10 anos – 5ª Conferência Nacional de Políticas Para Mulheres, que contou com aproximadamente seis mil mulheres na abertura. Como resultado das contribuições realizadas durante os dias de trabalho do grande encontro, será elaborado um novo Plano Nacional de Políticas para Mulheres.

“Tivemos uma boa participação. Foram quase mil conferências livres, onde apoiamos os estados e os municípios, uma grande parte, e a nossa grande conferência nacional que na abertura deliberada cerca de seis mil mulheres e depois contínua nos dias seguintes com cerca de cinco mil mulheres participando.”

O Ministério também foi parceiro e apoiador institucional da 1ª Conferência Nacional de Mulheres Indígenas, da 4ª Marcha das Mulheres Indígenas e da 2ª Marcha Nacional de Mulheres Negras.

Outro destaque foi a criação de fóruns temáticos. Ao todo, são 12 grupos que contam com mulheres com representação de todo o Brasil, contam com re. fórum das centrais sindicais, das mulheres quilombolas, indígenas, pescadoras e marisqueiras, quebradeiras de côco e babaçu, mulheres do Hip-Hop, mulheres LBTs, das águas, campos e florestas. E também temos um Fórum de outra natureza que é o Fórum que reúne as secretárias de estado de políticas para mulheres,

“Entendemos – e essa também é uma orientação do presidente Lula – que o nosso trabalho é de conhecer as realidades das mulheres no Brasil, mobilizá-las, dialogar com elas para as pessoas qualificar essas realidades, como elas vivem, onde elas vivem, o que elas têm vivido.”

Equipamentos da rede de atendimento e proteção

Marca dos governos do PT, a Casa da Mulher Brasileira (CMB)   é um equipamento público que integra uma série de serviços especializados para os mais diversos tipos de violência contra as mulheres, como acolhimento e triagem, apoio psicossocial, alojamento de passagem, serviços de saúde, central de transportes, promoção da autonomia económica, brinquedoteca. Além de contarem com profissionais de Delegacia Especializada, Promotoria Especializada do Ministério Público, Núcleo Especializado da Defensoria Pública, e Juizados e Varas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. 

Segundo informações do Ministério , desde 2023 foram investidos R$ 389 milhões em novas unidades, há 31 unidades em implementação e/ou em obras, e 11 em funcionamento. Somente em 2024 foram realizadas 440 mil atendimentos.

Completando a rede de equipamentos públicos há os Centros de Referência da Mulher Brasileira, que são serviços menores que a CMB, mas eles exercem papel fundamental. Atualmente são 12 Centros de Referência da Mulher Brasileira em funcionamento, oito em contrato de passe em trâmite de assinatura, cinco com obras em andamento e quatro em processo de licitação. Para esses processos, o investimento do governo federal foi de R$ 45 milhões.

O planejamento do MMulheres prevê a entrega das Casas da Mulher Brasileira nas cidades de Macapá (AP), Aracaju (SE), Vila Velha (ES), Belo Horizonte (MG), Foz do Iguaçu (PR) e Rio Branco (AC), e dos CRMBs em São Raimundo Nonato (PI), Picos (PI), Guarapuava (PR), Tubarão (SC), Cristalina (GO) e Cariacica (ES), entre outras.

Os dois equipamentos integram o Programa Mulher Viver sem Violência, retomado pelo Ministério das Mulheres em março de 2023. É possível acompanhar a construção das novas unidades das Casas e dos Centros de Referência através do Painel de Monitoramento, no site do Ministério das Mulheres, clicando aqui .     

Violência política de gênero e participação nas eleições

A ministro apontou que tanto ela quanto as parlamentares da Bancada Feminina têm reforços sobre o direito e a necessidade de as mulheres se colocarem como candidatas em cargos eletivos. “E nisso os partidos políticos têm papel fundamental, principalmente os partidos mais democráticos, no caso do Partido dos Trabalhadores”, defende.

Durante reunião do Diretório Nacional da legenda, ela defendeu que o maior partido de esquerda da América Latina paute a questão de gênero. “Fomos pedir estímulo para que as mulheres se colocassem como candidatas e, de fato, que tivessem justiça em todos os sentidos, inclusive na repartição do fundo eleitoral. Mas que as mulheres e jovens fossem incentivadas a participar”, afirmou.

Ela destacou ainda a urgência em oferecer segurança e apoio às companheiras que decidem disputar uma eleição: “Quando se elege uma vereadora, deputada, prefeita, governadora ou senadora, elas precisam de apoio, de acompanhamento, de incentivo o tempo todo.

Márcia Lopes fez ainda um pedido: para que no ano que vem não se vote em homens que sejam agressores ou que banalizem a violência contra a mulher: “Se isso acontecer, nós teremos uma mudança de perfil, porque queremos mais mulheres na Câmara. Dos 513 deputados, apenas 91 são mulheres, é muito pouco.”

Marina Marcondes, da Redação do Elas por Elas, com informações do Ministério das Mulheres  

 

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