Soberania: IBGE prepara os alicerces da transição digital do Brasil
Presidente do instituto, Marcio Pochmann diz que mudança do marco legal das estatísticas oficiais públicas vai resguardar dados dos órgãos governamentais da ganância das big techs
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A transição digital democrática e inclusiva, como pretendida pelo governo Lula para o Brasil, é uma das prioridades do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2024. Enquanto a regulação das big techs segue sem rumo, o que representa sérios riscos à democracia, o IBGE prepara proposta de alteração do marco legal das estatísticas oficiais no país, a ser apresentada e debatida no fim de julho, durante a Conferência Nacional da Era Digital, no Rio de Janeiro. A revisão da legislação prevê a criação de mecanismo capaz de centralizar todas as informações produzidas por diferentes órgãos de Estado: o Sistema Nacional de Geociências, Estatísticas e Dados (Singed).
Essa é uma das mais relevantes bandeiras encampadas pela gestão de Marcio Pochmann à frente do IBGE. Por meio do “X”, o economista enfatizou, nesse domingo (16), o imperativo de o Congresso Nacional apreciar o plano do instituto de conceder mais segurança aos dados oficiais públicos. “Para que a sugestão de nova legislação do país possa ser considerada e decidida pelo parlamento da nação, o debate fecundo, democrático, transparente e participativo deve acontecer como um piloto experimental para o mundo”, defendeu.
“Por isso, a realização da Conferência Nacional da Era Digital, que reunirá os agentes produtores e usuários de dados, além de representantes da sociedade civil e observadores internacionais”, completou Pochmann.
Novo protagonismo do Brasil na transição transição para a Era Digital
O presidente @lulaoficial há décadas faz o debate sobre a desigualdade, em especial a luta para erradicar a pobreza. É reconhecido mundialmente por concretizar políticas públicas exitosas no país, inclusive…
— Marcio Pochmann (@MarcioPochmann) June 16, 2024
Em recente reunião com líderes do G7 (grupo das sete economias mais ricas do mundo), o presidente Lula falou da relevância de as novas tecnologias protegerem dados pessoais e garantirem a integridade das informações. A proposta em debate no IBGE, de acordo com Pochmann, está ancorada em nove eixos fundamentais da Organização das Nações Unidas (ONU).
“As falas do presidente ocorrem no momento em que o IBGE produz um robusto diagnóstico sobre o Singed, a proposição soberana do Sistema Nacional de Geociências, Estatísticas e Dados”, esclarece o economista.
Big Techs
A questão da transição digital será levada pelo presidente Lula também à Cúpula do G20 (os 20 países mais industrializados), em novembro, da qual o Brasil exerce a presidência rotativa. Na entrevista que concedeu ao site G20 Brasil, Pochmann alertou para o crescente poder das big techs sobre as estatísticas produzidas pelos institutos nacionais. Segundo o presidente do IBGE, essas multinacionais não respondem por número relevante de vagas de emprego, não pagam tributos e operam de longe, desconectadas das realidades de cada país.
“Entendemos que é um ponto importante de ser tratado no âmbito do G20, porque decorre de uma nova forma de subdesenvolvimento, que é os países produzirem ou disponibilizarem seus dados pessoais brutos, esses dados a serem trabalhados, aperfeiçoados, e transformam-se num grande modelo de negócio”, criticou.
“Essa é uma temática que o IBGE vem trazendo, do ponto de vista de criar um Sistema Nacional de Geociências, Estatísticas e Dados. É algo que não existe de maneira ainda tão completa em diferentes países, sobretudo no G20, mas a ONU está preocupada em ter um sistema que acople os diferentes bancos de dados do FMI, do Banco Mundial, do Unicef, da Unesco, por exemplo”, acrescenta.
Pochmann argumenta que, sob a coordenação do IBGE, o Singed, além de poupar gastos ao governo, integrará informações dos órgãos da administração federal, como a Receita Federal (RF), a Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência (Dataprev), o Banco Central (BC) e o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) – tal qual era até antes do Golpe Militar, em 1964.
PL das Fake News
Embora o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já tenha reconhecido a inevitabilidade da responsabilização das empresas de tecnologia, elas seguem lucrando com a disseminação de notícias falsas e com o discurso de ódio. “O que podemos contribuir para efetivação da solução desse debate que se travou nos últimos dias é entregar marcos legislativos que sejam inteligentes e eficientes para poder disciplinar o uso dessas redes sociais no país”, disse, no início de abril.
Ainda não há, contudo, consenso no Congresso sobre a regulação das big techs. O Projeto de Lei (PL) 2630/2020, apresentado pelo senador Alessandro Vieira (MDB-SE) em 2020 e aprovado no mesmo ano, passou por apenas uma comissão na Câmara. O chamado PL das Fake News versa sobre regras de combate à desinformação na internet, responsabilização de plataformas e garantia de fiscalização e aplicação de sanções.
A coordenadora do Comitê Gestor da Internet, Renata Mielli, criticou duramente o abandono do PL das Fake News pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL). “Tirando o setor conservador que se beneficia da ausência da regulação, que se beneficia da desinformação, do discurso do ódio, para manter a sua articulação política e as próprias plataformas, havia um amplo acordo”, lamentou, em entrevista à Folha de S.Paulo.
Eleições municipais
“O algoritmo do ódio, visível e presente, apresenta-se à mesa de todos”, declarou Cármen Lúcia, ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), ao assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), há duas semanas. Ela comandará as eleições municipais de 2024 e terá que lidar com as desinformações produzidas pela recém chegada inteligência artificial (IA).
“A mentira espalhada pelos poderosos ecossistemas das plataformas é um desaforo tirânico contra a integridade das democracias. Um instrumento de covardes e egoístas”, censurou a ministra, em seu discurso de posse. “O que distingue esse momento da história de todos os outros é o ódio e a violência agora usados como instrumentos por antidemocratas para garrotear a liberdade, contaminar escolhas e aproveitar-se do medo como vírus e adoecer pela desconfiança cidadãs e cidadãos.”
Da Redação, com agência Senado, G20 Brasil, Agência Brasil, Folha de S. Paulo