Evento de comunicação em SP denuncia abusos da Globo e defende Lula

A placa sobre a entrada principal do auditório Vladimir Herzog, no Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, avisa: “Lotação: 90 pessoas”. Mas pelo menos 200 jornalistas, advogados, militantes de esquerda e estudantes participaram do evento Globo É Censura – Ato em Defesa da Liberdade de Expressão.

Durante mais de três horas, 15 personalidades de comunicação e da vida política do País falaram sobre o monopólio da Rede Globo, a tentativa de censura da emissora contra os blogs que denunciaram supostos casos de ilegalidade da família Marinho e sobre a perseguição da mídia ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Por unanimidade, a condução coercitiva de Lula à Polícia Federal na última sexta-feira (4) foi definida como sequestro.

Ao microfone, se revezaram figuras como a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ), o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS), o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), o senador Roberto Requião (PMDB-PR), a presidenta da União Nacional dos Estudantes, Carina Vitral; o presidente do Barão de Itararé, Altamiro Borges; a secretária de Formação da CUT e coordenadora do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Rosane Bertotti; os blogueiros Renato Rovai, Fernando Britto, além de advogados e membros do Sindicato dos Jornalistas. A vice-prefeita de São Paulo, Nádia Campeão, o deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP) e os jornalistas Palmério Dória, Paulo Henrique Amorim e Paulo Moreira Leite também compareceram ao evento.

A Globo e o golpe
O primeiro a ter a palavra foi o presidente do Barão de Itararé, Altamiro Borges. Durante o discurso, interrompido por muitos aplausos, o jornalista explicou que o ato se estendeu para Lula devido aos acontecimentos da última sexta. “A condução do Lula foi uma aberração sob todos os aspectos, um verdadeiro atentado à democracia. Este ato também virou um ato pela democracia contra o golpismo. O golpismo reside na Globo”, conclamou.

O monopólio de comunicação da emissora carioca, construído principalmente durante a ditadura militar (1964-1985), foi duramente criticado por Borges. Ele afirmou que “liberdade de expressão não pode ser liberdade de monopólio”.

No entanto, o presidente do Barão de Itararé relembrou que os profissionais da emissora “também sofrem com o constrangimento”. “Não há críticas aos profissionais da empresa. Profissionais que também sofrem com o constrangimento e a censura da emissora”, destacou.

“A condução do Lula foi uma aberração sob todos os aspectos, um verdadeiro atentado à democracia. Este ato também virou um ato pela democracia contra o golpismo. O golpismo reside na Globo”, Altamiro Borges

O deputado Paulo Pimenta alertou sobre um avanço conservador “que há muito tempo não se via” no Brasil e conclamou a militância a ir às ruas para frear o golpe. Ele lembrou, também, do papel fundamental da Globo para criar um clima de terror político no País. “O elemento pensante que articula a grande mídia é a Globo. E o discurso da Globo é carregado de ideologia”.

Sobre as reações inflamadas de alguns militantes de esquerda, Pimenta lembrou do cenário de violência criado no País pelas grandes empresas de comunicação. “Violenta é a mídia, que há dois anos põe o Lula como presidiário nas capas, que faz haver um clima de violência contra figuras ligadas ao PT em restaurantes, por exemplo”. O deputado ainda destacou que é o momento da esquerda deixar de lado as diferenças para se unir em nome da legalidade e da Constituição.

A militância estar atenta para rebater as mentiras da Globo na Justiça é um caminho que também pode trazer bons resultados, analisou Rosane Bertotti. Para ela, a perseguição midiática não põe em risco apenas o ex-presidente Lula, mas toda a sociedade. “Hoje é o Lula, amanhã é a CUT, depois o Barão de Itararé e, quando menos se espera, pode ser qualquer um de nós”. Altamiro Borges concordou: “O movimento não é petista. É de quem quer preservar o estado de direito”.

Para Marcelo Lavenère, ex-presidente da OAB que assinou o impeachment contra Fernando Collor de Mello em 1992, as iniciativas vistas contra Lula põem em risco o sistema judiciário. “Não defendo o Lula porque gosto dele. Defendo porque gosto da democracia. Neste caso, quem o ataca está atacando a sua própria integridade jurídica”.

Pluralidade de informação
O senador Roberto Requião voltou a defender a soberania nacional sobre o pré-sal contra os gigantescos interesses estrangeiros. E disse que a volta de forças conservadoras pretendem tirar do Brasil a soberania sobre seu futuro. “O Lula é um símbolo das mudanças feitas no País nos últimos anos. Mas o objetivo que querem atingir é o estado brasileiro e o fim da possibilidade de qualquer projeto nacional soberano. Há de existir, sem enfrentamentos nas ruas, resistência a essa direita orquestrada internacionalmente através dos meios de comunicação. A mídia é o instrumento de amortecimento da consciência nacional”, afirmou.

“A Globo não tem preocupação com a ética ou o combate à corrupção. Está numa guerra política. Se fosse questão de ética ou corrupção, o governo FHC foi o mais corrupto da República brasileira.”, Jandira Feghali

A deputada Jandira Feghali criticou o que chama de “verdade única” ditada pela Globo e defendeu a pluralidade de informações trazidas pelos blogueiros. Ela também criticou os sucessivos governos que não combateram o monopólio da informação e desvelou o método de ação da emissora carioca. “A Globo não tem preocupação com a ética ou o combate à corrupção. Está numa guerra política. Se fosse questão de ética ou corrupção, o governo FHC foi o mais corrupto da República brasileira. Foi o governo que vendeu este País por alguns tostões. Mas a Globo não vai lá, porque o que interessa é proteger o projeto que eles representam”.

Uma das vítimas dos avisos judiciais da Globo, o jornalista Fernando Brito, do Tijolaço, foi um dos últimos a falar. Ele explicou como um pequeno blog descobriu o caso do triplex dos Marinho e não nenhuma grande emissora, jornal ou revista. “Nós descobrimos tudo isso sem aparato algum. Os outros veículos não descobrem não por não terem bons jornalistas, mas por não haver mídia livre”.  E encerrou, alertando a todos: “Em 1964, nos tiraram o voto. Hoje, querem nos tirar o nosso candidato. O alvo da Lava Jato é o Lula”.

No fim do encontro, o jornalista Paulo Henrique Amorim, no corredor do Sindicato e com uma cara entre a irritação e a ironia, afirmou: “José Serra nos chamou de blogueiros sujos e é um adjetivo que nos orgulhamos muito. Ele deve ser limpo. Deve limpar muita coisa para se considerar um homem limpo”.

Entenda
O ato havia sido planejado pelo Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé há duas semanas para contrapor as tentativas de constrangimento judicial da Globo contra dois blogs e dois sites de notícias: O Cafezinho, Tijolaço, Rede Brasil Atual e Diário do Centro do Mundo. A família Marinho, dona da Globo, notificou o quatro veículos de comunicação por denunciarem que um triplex em Parati, no litoral fluminense, seria propriedade da família – a mansão está em nome de uma offshore registrada no Panamá e os Marinho negam sua propriedade.

Após o episódio com Lula, porém, o evento se tornou também uma possibilidade para combater a cobertura considerada parcial e ideológica da emissora contra o ex-presidente, Dilma, PT e entidades ligadas à esquerda, em contraposição ao tom ameno que dedica a figuras mais associadas a grupos tradicionalmente poderosos do País.

Por Bruno Hoffmann, da Agência PT de Notícias