Arma no campo é carta branca para assassinato de indígenas
Preocupação de indígenas aumenta diante do debate sobre o uso de armas de fogo no Brasil, que ganhou fôlego nos últimos anos com avanço conservador
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Em abril do ano passado, o líder indígena do Maranhão, Inaldo Serejo Gamela, foi vítima de um ataque arquitetado por fazendeiros atuantes no estado. A ação ocorreu durante a tentativa de retomada de uma terra originalmente indígena que foi grilada nos anos 70 e hoje é alvo de um intenso conflito entre povos tradicionais e latifundiários.
No episódio, mais de dez indígenas saíram feridos, sendo cinco deles por arma de fogo. Inaldo levou um tiro na cabeça, passou dois meses com sérios problemas de audição e ainda hoje precisa conviver com as sequelas da violência.
Para ele, o uso de armas agrava os resultados dos conflitos agrários. Essa avaliação encontra respaldo em números da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Somente em 2017, foram registrados 71 assassinatos no campo. Em 2016, foram 61 mortes, contra 50 em 2015. O ano de 2014, por sua vez, registrou 36 homicídios.
“Se o grileiro puder usar legalmente uma arma pra defender aquilo que ele considera como propriedade [sua], isso vai ser uma carta branca pra continuar matando índio, quilombola, camponês, ribeirinho”, afirma Inaldo.
A preocupação do indígena se referencia na emergência do debate sobre o uso de armas de fogo no Brasil, que ganhou fôlego nos últimos anos em meio ao contexto de avanço do pensamento conservador. Na Câmara dos Deputados, por exemplo, tramitam diferentes medidas que propõem a liberação dessa prática no campo.
Uma delas é o Projeto de Lei 6717/2016, do deputado Afonso Hamm (PP-RS), que autoriza o porte de armas de fogo meio rural para qualquer pessoa maior de 21 anos. O texto não impõe, por exemplo, a necessidade de exame de aptidão psicológica do usuário.
A medida já foi aprovada em dois colegiados diferentes e aguarda avaliação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa.
No Senado, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou em novembro de 2017, o Projeto de Lei do Senado (PLS 224/2017), de autoria do senador Sérgio Petecão (PSDB-AC) abrindo a possibilidade de moradores de áreas rurais poderem adquirirem armas de fogo para proteção da “família e da propriedade”. O projeto está pronto para deliberação em plenário.
Na oportunidade, o líder do PT no Senado, Lindbergh Farias (RJ), se posicionou contra a proposta afirmando que os níveis de criminalidade no País não serão reduzidos ampliando as possibilidades de armamento da população.
“Vocês [senadores favoráveis à proposta] não estão pensando nos efeitos colaterais dessa medida e estão desestruturando uma política correta, prevista no Estatuto do Desarmamento”, criticou.
Atualmente, o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.823/2003) prevê a liberação do porte de arma para moradores da zona rural que tenham a partir de 25 anos de idade, mas nos casos em que o trabalhador pratica a caça como atividade de subsistência da família. Diante dessas condições, é possível obter o porte de armas junto à Polícia Federal.
Do PT no Senado, com informações do Brasil de Fato