Violência contra parlamentares negras e transexuais é denunciada à OEA

Mulheres negras eleitas, cis e trans, denunciaram a perseguição sistemática que sofrem no Brasil à Comissão Interamericana de Direitos Humanos

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Participantes da audiência pública realizada na terça-feira: ameaças constantes

“Colocar em dúvida minha idoneidade, expor minha privacidade com circulação de materiais, são tentativas de silenciamento, práticas rasteiras e desumanizantes de sujeitos que não reconhecem a mulher negra como sujeita de direito, desrespeitando e ferindo o processo democrático que me elegeu.” O relato é de Ana Lucia (PT-SC), primeira vereadora negra eleita em Joinville (SC), sétima candidata mais votada no último processo eleitoral, com 3.126 votos.

A vereadora denunciou a perseguição que sofre sistematicamente em audiência pública, realizada na terça-feira (23), sobre os constantes casos de violência contra líderes brasileiras negras e transexuais. O evento on-line, promovido pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), reuniu parlamentares negras — cis e trans —, além de organizações da sociedade civil. O objetivo é reivindicar do governo brasileiro e viabilizar uma atuação coordenada para proteger a vida e os direitos políticos das candidatas eleitas, diante do fenômeno da violência política e eleitoral.

Denúncias foram formalizadas e entregues a Bruna Benevides, secretária de Articulação Política da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), que levará as recomendações à CIDH, que integra a Organização dos Estados Americanos (OEA). O objetivo da mobilização é combater a transfobia e o racismo e cobrar do Estado brasileiro a garantia de direitos e de um exercício pleno dos mandatos, sem ameaças ou violências, diante das tensões políticas que marcaram o processo eleitoral de 2020, um dos mais violentos dos últimos anos.

Segundo a vereadora Ana Lucia, o racismo estrutural estampa a omissão do governo federal, que ignora as mortes diárias da população negra do Brasil. “O Estado não cuida das nossas vidas e não garante o nosso direito à democracia. Essas violências afetaram minha liberdade, meu direito de ir e vir, minha saúde mental e emocional, me desestruturam e me deslocam do lugar de tranquilidade e segurança que homens e mulheres não negros se acomodam”, lamenta.

Casa alvejada a tiros

Um dos casos denunciados é o de Carolina Iara (PSOL-SP), covereadora negra e intersexo da mandata coletiva da Bancada Feminista de São Paulo, que teve sua casa alvejada por tiros e, mesmo assim, não teve direito a escolta pela Câmara de São Paulo. A casa legislativa alegou que a legislação não prevê segurança para mandatas coletivas.

Carolina destaca que muitas mulheres intimidadas temem por suas vidas e preferem não denunciar porque, ao fazer isso, ficam ainda mais vulnerabilizadas perante os agressores. Ela observa que a promoção de uma agenda antigênero pelo governo fomenta a violência de gênero e, consequentemente, a transfobia.

“A violência contra a população trans precisa ser interrompida urgentemente no país. A violência transfóbica é sempre política e é através da política que vamos mudar essa realidade”, defende a vereadora Carolina Iara.

Três anos do assassinato de Marielle Franco

A violência política que priva mulheres negras e trans de manifestar suas posições políticas foram ressaltadas por Anielle Franco, diretora executiva do Instituto Marielle Franco. “Neste mês, três anos do assassinato de minha irmã Marielle, estamos avançando para que nenhuma mulher tenha que sofrer mais nenhum tipo de violência”, disse.

“Acessar mecanismos internacionais para denunciar a violência política contra mulheres negras, LGBTQIA+ e periféricas no Brasil é importante para expandir esta pauta globalmente, trazer novos atores que nos ajudem a pressionar o estado brasileiro a adotar medidas de segurança e proteção”, complementou a irmã de Marielle.

A audiência foi resultado da articulação das organizações Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA); Criola; Terra de Direitos; Instituto Marielle Franco; Justiça Global; Rede Nacional de Negras e Negros LBGT e Instituto Raça e Igualdade.

Da Redação

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