“Veja abdicou do jornalismo há algum tempo”, diz presidente da Fenaj
Comportamento tendencioso da revista e de outros veículos foi criticado por profissionais da comunicação e academia
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Veículos de comunicação fazem “proselitismo eleitoral disfarçado de Jornalismo”, na opinião do presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Celso Schröder. “A Veja está dizendo a verdade ou não? Não sei. Por que eu não sei? Porque a Veja abdicou de fazer jornalismo há algum tempo”, avaliou Schröder.
Para ele, a credibilidade da revista está comprometida. “Ela se joga de tal maneira num jogo político, reproduzindo dossiês sem verificação, produzindo factoides políticos, interferindo, adjetivando seus textos, fazendo julgamento de valor nas suas capas, que eu não sei se é ou não verdade.”
Schröder lamenta o mesmo comportamento de outros veículos. “Teremos que fazer um esforço para recompor um padrão de jornalismo em que a população possa acreditar”. Na análise do presidente, a postura partidária de alguns veículos de comunicação é inadmissível. “É um golpe de morte no jornalismo porque tira o que é estruturante nele, a credibilidade.”
Assumir e exercer, publicamente, a posição partidária é uma prerrogativa do jornalista. O que não pode, na visão de Schröder, é levar as preferências partidárias às redações dos jornais. “Eu nunca havia visto um abandono, por completo, de qualquer pudor, do ponto de vista partidário, por parte das grandes empresas”.
Mas, para ele, a cobertura tendenciosa “radicalizou” nessas eleições. Renato Rovai, editor da revista Fórum e professor de Jornalismo da Cásper Líbero, também condena o comportamento da revista Veja. Ele considerou a capa anunciada como “ridícula” e “bizarra”. “Ela é, inclusive, insustentável para outros veículos, pois é capaz que eles nem noticiem ou noticiem de forma comedida no Jornal Nacional.
Rovai observa a pouca repercussão da capa da revista “O Globo dá a matéria praticamente desmentindo a notícia. Só não é mais claro nisso porque eles têm uma relação de parceria.” Schröder também comparou o comportamento da revista com a cobertura televisiva do jornal da Globo. Segundo ele, as notícias veiculadas à noite são contrárias às divulgadas no dia. “As notícias do crescimento do Brasil são desmentidas quase que imediatamente por uns gráficos malucos, apresentados pelos jornalistas ou supostos jornalistas que, visivelmente, tem um objetivo político de atuar sobre a escolha do próximo governo”.
A doutora em Comunicação da Universidade Católica de Brasília, Sofia Zanforlin, compartilha a opinião de Schröder. Ela conta que o Jornal GloboNews noticiou, recentemente, a menor taxa de desemprego dos últimos 12 anos. No entanto, o viés foi negativo. “Eles anunciaram que a taxa está baixa não porque as pessoas estão empregadas, mas porque desistiram de procurar emprego. Essa notícia é completamente falaciosa, é absurda”, avaliou.
Os bons tempos – Schröder lembra os tempos de glória da revista Veja “Ela foi determinante para a democratização do país, com grandes jornalistas como Mino Carta. Teve momento importantíssimo na atuação, na denúncia, na investigação”. No entanto, considera, “foi abandonando e optando por um outro tipo de comunicação. Deu um custo muito alto para o jornalismo brasileiro e para a democracia.”
Para Schröder a Veja selecionou, ao longo do tempo, jornalistas com perfil conservador e não vê com bons olhos a mudança, copiada por outros veículos.”É só olhar a história do jornalismo, dos prêmios, a contribuição para o jornalismo. São de jornalistas com perfil de esquerda”, disse. Ele lamentou a “função partidária” que a Veja se permite assumir enquanto empresa jornalística. E considera a atitude como uma “usurpação de poderes e de um espaço a qual nós não estamos autorizados”.
Ele lembra da pluralidade do jornalismo, quando reproduziam dentro das redações a diversidade contida na sociedade. Para ele, a tradição do bom jornalismo brasileiro foi marcada pelos jornalistas de esquerda. “Política partidária eu faço dentro do partido; política sindical eu faço no sindicato; jornalismo, dentro da minha redação. São coisas diferentes, eu não posso confundir essas atividades porque senão eu maculo a todas.”
Manchetômetro – O Manchetômetro é um site de pesquisadores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), que acompanha, diariamente, a cobertura das eleições de veículos como o jornal Folha de S. Paulo, O Globo, Estado de S. Paulo e Jornal Nacional, da TV Globo. As análises mostram o favorecimento da mídia à eleição de Aécio Neves (PSDB).
Sofia Zanforlin citou o site para demonstrar o comportamento da mídia nas eleições. “Ali fica comprovado. Sai do âmbito da opinião para comprovar o enquadramento (enfoque) que é dado para um e para outro candidato”, disse. “A mídia é ideológica. Na questão de enquadramento e na questão de valor notícia. E todo enquadramento é ideológico.”
Por Aline Baeza, da Agência PT de Notícias