Articulação de Esquerda: É preciso coerência para mudar o PT

Carta-manifesto da tendência petista Articulação de Esquerda à militância do PT de Minas

Paulo Pinto/Agência PT
Tribuna de Debates do PT

Ex-presidente Lula durante lançamento do 6º Congresso Nacional do PT

Carta-manifesto da tendência petista Articulação de Esquerda à militância do PT de Minas

1. O PT corre risco de morte, mas continua sendo o maior instrumento de luta da classe trabalhadora brasileira. Antes de tudo, é preciso reconhecer a gravidade da situação e que nosso partido vive a maior crise de sua história – não temos tempo para meias palavras. É fundamental que reconheçamos também que a direita nos ataca pelas nossas qualidades, mas somos atingidos pelos nossos erros. Corrigi-los, portanto, é questão de sobrevivência.

2. A Direção Nacional do PT convocou o seu 6º Congresso para a discussão sobre o cenário internacional e nacional, balanço dos governos nacionais petistas, estratégia, programa, organização e funcionamento do PT. O Congresso foi convocado, principalmente, por insistência nossa, mas não da forma como nós defendíamos: com plenos poderes para debater e deliberar sobre tudo, inclusive sobre o PED, que se tonou um assunto proibido pela atual maioria do partido. Apesar disso, o 6º Congresso é a oportunidade única para recuperar o fôlego e mudar o que precisa ser mudado. Não como um ponto de chegada, mas sim como um ponto de partida.

3. Vivemos a maior crise do capitalismo desde 1929. Mas o capitalismo também nunca foi tão hegemônico. Está em declínio a hegemonia dos EUA, epicentro da atual crise econômica e também política (vide a vitória de Donald Trump), sem nenhuma garantia de que qualquer outra potência assuma o seu lugar no mundo. O sistema capitalista está nos conduzindo para a barbárie e nunca foi tão urgente denunciarmos o seu caráter autodestrutivo. E na crise capitalista quem paga a conta são as (os) trabalhadoras (es). No plano global, quem mais sofre seus efeitos são os países periféricos. O neoliberalismo, que anunciava a falácia do fim da história, já nasceu velho e tem produzido efeitos cada vez mais catastróficos para a humanidade. É tarefa das organizações da classe trabalhadora apontarem a saída para a crise resgatando e reafirmando o socialismo como horizonte estratégico.

4. O golpe de 31 de agosto de 2016 encerrou um ciclo histórico no Brasil. Mas isso não se trata de um caso isolado, o que está ocorrendo por aqui é parte de uma contraofensiva reacionária na região que também produziu golpes em Honduras e no Paraguai, com sucessivas tentativas na Venezuela, e impôs duras derrotas às forças progressistas em vários outros países, como na Argentina, em que o neoliberal Macri venceu as últimas eleições, ou mesmo na Bolívia e Equador, onde os presidentes Evo Morales e Rafael Correa vêm perdendo apoio popular. Depois de aproximadamente uma década e meia de forças de esquerda e centro-esquerda terem alcançando o governo central na maioria dos países da América Latina, a direita retoma a ofensiva na região para reverter os processos de transformação ocorridos em maior ou menor medida em cada país, retirar os direitos da classe trabalhadora, interromper o avanço da integração regional e realinhar a região à política imperialista dos EUA.

5. Defender os direitos e derrotar o golpismo são nossas tarefas imediatas. Para isso, precisamos reconquistar o apoio da classe trabalhadora e nossa palavra de ordem deve continuar sendo Diretas Já. Mas é fundamental também avaliar onde erramos, porque, se reconhecemos que a direita brasileira nada mais fez do que cumprir o seu devido papel – sendo golpista como sempre foi –, por que nós fomos derrotados? Por que nós perdemos o apoio da classe trabalhadora? Àqueles que se recusam a fazer qualquer balanço ou autocrítica neste momento, insistimos que mais do que nunca precisamos fazê-lo. Não pretendemos, com isso, apontar culpados ou encontrar heróis, mas sim responsabilizar uma política que nos conduziu à derrota para que não cometamos os mesmos erros políticos.

6. A política de conciliação de classes que nos conduziu à Presidência da República em 2002 é a mesma que culminou no golpe. Desde 1995, quando a maioria do partido optou por moderar o nosso programa e fazer alianças com setores da burguesia para vencer as eleições, não só nos manifestamos contrários a essa política como vimos alertando sobre seus limites e contradições. À frente do governo, tivemos êxito na implementação de políticas públicas para o desenvolvimento social, na ampliação da renda da classe trabalhadora, na retomada do papel do Estado como pilar do desenvolvimento econômico, na reorientação de nossa política externa priorizando as relações sul-sul e os processos de integração regional no âmbito latino-americano, entre outras várias conquistas louváveis. No entanto, não fizemos nenhuma ruptura de fato com o neoliberalismo nem as reformas estruturais necessárias para outro modelo de desenvolvimento. Foi por isso que nosso governo optou por conduzir uma política econômica puramente neoliberal a partir de 2015 – mesmo depois de ganharmos as eleições mais polarizadas desde 1989 defendendo outro programa. É preciso reafirmar que essa política suicida rompeu os laços com a nossa base social e foi a grande responsável pelo êxito do golpe.

7. Quando não existe espaço para a autocrítica, corremos o risco de recorrer no erro e dobrar a aposta justamente naquilo que nos conduziu à derrota. Negar que a estratégia política de nosso partido foi a grande responsável por nos conduzir a essa situação ou mesmo que a conciliação de classes não ocorreu em nossos governos, nos leva a repetir as doses de um antigo “remédio” para novos problemas. É o caso da postura passiva e conciliatória de nossos governos estaduais frente à política do governo golpista, ou mesmo da atitude de parte da nossa bancada de parlamentares na eleição das mesas diretoras da Câmara e do Senado, o que foi referendado pela maioria dos membros do Diretório Nacional do PT. Da mesma forma, continuar acreditando que vivenciamos uma “revolução democrática” em nossos governos e que a saída para essa conjuntura é seguir fazendo a defesa do “republicanismo” nos leva a confiar nas mesmas instituições políticas que referendaram o golpe, e que nunca foram neutras.

8. O Partido dos Trabalhadores não está superado. Muito se diz sobre o esgotamento do PT como instrumento de luta da classe trabalhadora, mas, se isso fosse verdade, a direita não continuaria sua campanha de cerco e aniquilamento do nosso partido, mesmo depois do golpe consumado. Se o PT for derrotado hoje, será também uma derrota do conjunto da esquerda política e social brasileira, que, possivelmente, enfrentará um longo período de dispersão até construir outra organização capaz de cumprir o mesmo papel que o PT cumpre atualmente. Aos que pretendem construir uma cópia fidedigna do PT, é preciso dizer que o mesmo não foi produto de uma receita pronta, mas fruto de um contexto histórico específico que conseguiu aglutinar num partido socialista de massas, entre os quais o operariado do novo sindicalismo, a igreja progressista e a intelectuais da esquerda, vindo de diversas tradições. É por isso que estamos entre aqueles e aquelas que querem mudar o PT e não mudar do PT.

9. Mas queremos mudar o PT fundamentalmente a partir da política. Nesse sentido, não podemos transferir a responsabilidade dos erros de nosso partido exclusivamente para as pessoas que ocupam a atual direção do PT, ou mesmo para a presidenta Dilma – a política que as orientam hoje foi traçada há mais de 20 anos. Inclusive, o problema maior de se responsabilizar pessoas aparece quando a paridade de gênero e as cotas geracional e étnico-racial, presentes hoje em nossas direções, passam a ser culpadas pela conjuntura. É um erro, igualmente, achar que nossos problemas decorrem de questões organizativas ou da narrativa que adotamos. Se fosse assim, bastaria mudar as pessoas que ocupam cargo nas direções, o modelo organizativo ou tal “narrativa”.

10. Sendo assim, defendemos que o PT retome a estratégia democrático-popular & socialista e, a partir disso, construa um outro programa capaz de implementar as transformações estruturais necessárias para superar o capitalismo e uma tática que nos dê condições para enfrentar as lutas de curto, médio e longo prazo. Com essa reorientação em sua política, as novas direções do PT devem estar à altura dos novos desafios, bem como a organização partidária.

11. Não podemos afirmar que a conjuntura atual seria mais favorável para o PT se a nossa política tivesse sido majoritária no partido nesse último período, o que seria um anacronismo. O que é possível dizer com todas as letras é que a estratégia adotada até aqui está falida e, se ela nos serviu em algum momento, hoje já não nos serve em mais nada. Não temos a prepotência em nos colocar como os únicos capacitados por mudar o PT, essa é uma tarefa de todos os setores do petismo, inclusive daqueles militantes que não se organizam em nenhuma tendência. Mas nos colocamos à disposição para ajudar a cumprir essa tarefa que é urgente e pela qual temos inteira responsabilidade, ou em ouras palavras, “façamos nós por nossas mãos, tudo que a nós nos diz respeito”.

12. Desde 2015 participamos do movimento Muda PT, que surgiu fazendo a defesa de outra política econômica no início do segundo mandato da presidenta Dilma. De lá para cá, temos intervindo conjuntamente nas instâncias do partido pautando a urgente e necessária mudança nos rumos do PT. É fundamental que as forças que compõem o Muda PT assumam o protagonismo do 6º Congresso, com as quais iremos priorizar o diálogo. Mas, para que o Muda PT cumpra seu devido papel, é imprescindível que a coerência política paute qualquer intervenção conjunta no 6° Congresso, inclusive para a composição de chapas e lançamento de candidaturas.

13. É dessa forma que nós, da Articulação de Esquerda, iremos disputar os rumos do 6° Congresso do PT. Em Minas Gerais, iremos construir uma chapa estadual para o PED que contenha as diretrizes políticas dessa carta-manifesto, de nossa tese nacional e das nossas resoluções. Fazemos um chamado à nossa militância para essa construção e convidamos o conjunto da militância petista no Estado que se identifica com as nossas posições a se somar com a gente na luta por um PT socialista, democrático e revolucionário. A esperança é vermelha!

Da Articulação de Esquerda, para a Tribuna de Debates do 6º Congresso. Saiba como participar.

ATENÇÃO: ideias e opiniões emitidas nos artigos da Tribuna de Debates do PT são de exclusiva responsabilidade dos autores, não representando oficialmente a visão do Partido dos Trabalhadores

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