Campanha contra o PL dos Venenos (PL 6.299/2002)
Uma campanha das secretarias e setoriais do PT: Agrária Nacional, Meio Ambiente e Desenvolvimento, Saúde, Segurança Alimentar, Combate ao Racismo, Assuntos Indígenas, Mulheres, Sindical, Defesa dos Direitos dos Animais, LGBT, Cultura e Juventude.
Publicado em
O Brasil é o maior produtor mundial de commodities agrícolas, e um dos maiores consumidores de agrotóxicos, garantindo os interesses econômicos do agronegócio. No país o consumo de agrotóxico está estimado em 7,6 litros por pessoa/ano. Em estados de intensa produção agrícola o consumo médio per capta é de 20 litros/pessoa/ano. Nos municípios onde a ocupação dos territórios é destinada à produção de commodities agrícolas, a exposição chega a ser acima de 200 litros/habitante. Cotidianamente as pulverizações de agrotóxicos por aviões agrícolas ou máquinas terrestres, além de exposição ao ser humano, ocasionam significativos impactos ambiental.
O atual modelo de ocupação territorial e de produção de commodities, (que não são alimentos para consumo humano, apenas artigos para exportação), contribui para a perda da vegetação nativa e da biodiversidade, levando a poluição dos recursos hídricos, exaustão e perda da qualidade do solo.
A produção agrícola brasileira se dá em grandes latifúndios de forma extensiva, mecanizada e depende do uso de agrotóxicos em grande quantidade. O modelo “químico-dependente” se faz pelo uso de agrotóxicos cujo objetivo é matar insetos, fungos, ervas daninhas e outros organismos vivos indesejáveis nas lavouras. A aplicação dos agrotóxicos com a pulverização aérea e terrestre agride indistintamente vastas regiões territoriais, comprometendo não somente o território de plantio, mas também nascentes, leitos de águas por onde são carreadas para rios volumosos nos diversos biomas. Nos últimos anos os biomas da Amazônia, Cerrado e Pantanal sofreram impactos ambientais incalculáveis, com o comprometimento do solo, a água, além de levar a extinção diversas espécies da flora e fauna brasileira.
Enquanto modelo produtivo de monoculturas e commodities, o agronegócio brasileiro, além de estimular a concentração de renda, agride sistemicamente o ambiente, provocando impactos socioambientais significativos, como o desmatamento e queimadas que afetam diretamente a saúde humana e a qualidade de vida de várias espécies nativas.
Este modelo agressivo afeta a vida e põe em risco a saúde de várias espécies de animais silvestres, além de contaminar alimentos, águas, animais utilizados para o consumo humano, bem como a saúde dos trabalhadores, trabalhadoras e habitantes dos territórios afetados pelo agrotóxico.
Estudos recentes mostram que o processo de ocupação, o uso indiscriminado e a exposição aos agrotóxicos (herbicidas, inseticidas, fungicidas) compromete diretamente a saúde humana em decorrência das propriedades cancerígenas, teratogênicas, neuro tóxicas e mutagênicas, entre outras propriedades do agrotóxico.
As exposições aos agrotóxicos em trabalhadores do campo e habitantes em municípios produtores de commodities são frequentes e podem causar: Irritação em pele e mucosas; alterações das funções renais; alterações hepáticas; sintomas digestivos como náuseas, vômitos, diarreias, dores abdominais; transtornos respiratórias; alterações neurológicas (Parkinson, paralisias por organofosforados, autismo); convulsões; alterações neuro tóxicas; alterações imunológicas; infertilidade; disfunções eréteis, aumento da incidência de casos de câncer infantojuvenil (0 a 19 anos), além do aumento das taxas de morbimortalidade por leucemias Linfoides; neoplasias malignas de encéfalo; neoplasias malignas de ossos; neoplasias malignas de glândula suprarrenal; linfomas não-Hodgkin; neoplasias malignas de tecido conjuntivo e tecidos moles; doenças Hematológicas; anemia aplastica; abortamentos; más formações fetais.
A elevada incidência de câncer infantojuvenil decorrente da exposição prolongada e excessiva aos agrotóxicos, em municípios de alta produção de commodities do agronegócio, que resulta em agravos frequentes, tem como resultado a sobrecarrega ao Sistema Único de Saúde (SUS), muitas vezes precário e insuficiente para o adequado acesso e condições de cuidados à saúde de trabalhadoras, trabalhadores do campo e seus familiares. Vale considerar que são deficientes os registros e notificações dos agravos sanitários em decorrência de exposições aos agrotóxicos.
Estes tantos problemas socioambientais exigem imediata intervenção do Estado brasileiro, no entanto, a aviltante necropolítica do atual (des) governo federal tem sido inconsequente ao liberar, em 2019, mais de 500 princípios ativos de agrotóxicos, muitos destes proibidos na União Europeia por propriedades cancerígenas. Mas nos três anos do governo Bolsonaro foram liberados 1.552, agrotóxicos, desmentido a justificativa do PL do Veneno de que há muita demora na análise dos produtos químicos para uso em lavouras.
No campo político é importante considerar a influência das indústrias de agrotóxicos que forçou “seus” parlamentares a aprovarem na Câmara Federal, em primeira instância, o PL 6299/02 ou PL do Veneno, que agora tramita no Senado Federal PL, sem que possua análise técnica e científica que justifiquem a liberação do uso dos agrotóxicos sem os adequados critérios sanitário.
O PL do Veneno apresenta dispositivos que significam riscos à saúde, ao ambiente, à segurança e soberania alimentar, além de riscos aos territórios e à economia do país, uma vez que oportunizará a flexibilização do uso de agrotóxicos, a precarização da atuação fiscalizatória e regulatória, na contramão dos movimentos internacionais de redução e regulação do uso.
O PL do Veneno pretende concentrar o poder de decisão no Ministério da Agricultura, excluindo o controle dos órgãos do Meio Ambiente e Saúde da análise e deliberação sobre os agrotóxicos propostos. De acordo com as propostas do PL o IBAMA e a Anvisa seriam apenas órgãos homologadores dos estudos apresentados pelas empresas interessadas no lucro da venda dos agrotóxicos.
Além de minimizar os riscos à saúde e ao ambiente e invisibilizar ainda mais os riscos de doenças crônicas decorrentes da exposição aos agrotóxicos, tais como câncer, malformações fetais, doenças neurológicas e psiquiátricas, doenças endócrinas e metabólicas, a PL não se propõe a reavaliar a utilização de agrotóxicos já proibidos em outros países, permite o registro das moléculas sem avaliação adequada dos riscos, ainda que haja evidências científicas robustas que justifiquem sua proibição, mesmo após autorização de registro.
Enquanto o Brasil libera e multiplica o uso de agrotóxicos, outras regiões do mundo diminuem. A Europa reduziu esse uso de mais de mil produtos em 1990 para 400 hoje em dia. Ao mesmo tempo que o PL do veneno libera o uso das substâncias cancerígenas objetivando o lucro fácil, e outros países consideram a possibilidade de colocar barreiras para o consumo de países com a produção ligada ao desmatamento, queimadas e uso de agrotóxicos proibidos.
Outro ponto importante a se destacar é a nomenclatura que passa a definir agrotóxico como pesticida ou produto de controle ambiental, excluindo o termo “tóxico” assim forjando uma narrativa mais “amena”, o que contribui ainda mais para a normalização do uso de agrotóxicos sem os devidos cuidados, inclusive em ambiente doméstico. Dessa forma, entende-se que a aprovação deste PL aumentará ainda mais os já elevados níveis de resíduos de agrotóxicos nas águas, nos alimentos, no ar, na chuva, além de contribuir para o aumento da incidência de intoxicações agudas e subagudas e das prevalências de doenças crônicas, onerando e pressionando o setor saúde.
Este “PL do Veneno” assim como demais políticas públicas para este setor necessitam ser amplamente discutidas a partir de critérios científicos e sanitários, para tanto é imprescindível a mobilização popular e a participação da sociedade civil em defesa da vida.
É fundamental a implementação de modelos produtivos que contribuam com a segurança alimentar saudável, bem como a implementação de políticas públicas e programas para a erradicação da fome. São importantes novos padrões produtivos que estimulem experiências para a transição agroecológica nos sistemas de produção e a redução imediata do uso de agrotóxicos. Um modelo alternativo de produzir para a população brasileira, sem agrotóxicos, sem emissões de carbono pelas queimadas e devastações já existe no Brasil em várias experiências, precisamos apoiar e estimular essas experiências.
Um estudo realizado sobre as intoxicações agudas por agrotóxicos, realizado junto ao NEAST – Núcleo de Estudos Ambientais e Saúde do Trabalhador do Mato Grosso (NEAST) entre os anos de 2007 a 2016, demonstrou que no Brasil as intoxicações por agrotóxicos ocuparam o segundo lugar dentre todas as intoxicações exógenas, com crescente número de casos e incidência no decorrer dos anos, apresentando elevada letalidade dentre todos agentes tóxicos. Este mesmo estudo, encontrou associação positiva entre o consumo de agrotóxicos e exposição ambiental com as incidências médias de intoxicação por agrotóxicos agrícolas. Foi na lavoura de soja que houve o maior número de intoxicações ocupacionais, posteriormente a de milho, arroz, pastagem e algodão (LARA, 2018).
No que se refere às doenças respiratórias e à relação com a exposição aos agrotóxicos, um estudo realizado entre os anos de 2015 a 2018, identificou 26.949 internações por doenças respiratórias no período de estudo, sendo que o uso médio de agrotóxicos foi de 209.274.692,33 milhões de litros. (SANTOS, 2020).
Sobre os acidentes de trabalho(AT) em nível nacional, observou-se entre as UF, que o Mato Grosso apresentou a maior taxa de mortalidade com 19,5 mortes/100 mil trabalhadores formais e a segunda maior taxa de letalidade com 8,7 mortes/mil acidentes. Ao se comparar com as taxas do Brasil, a mortalidade do Mato Grosso foi o triplo, enquanto a letalidade foi o dobro da média nacional, do total dos acidentes do trabalho, entre 2008 a 2017. A maior taxa de incidência dos AT relacionada ao agronegócio foi em Alagoas, com 37,9/100 mil, seguido de Mato Grosso com 30,4/100 mil e Rondônia com 30,3/100 mil. A maior taxa de mortalidade encontra-se no Amapá com 41,6/100 mil trab., seguido de Rondônia com 32,8 e Mato Grosso com 31,8. Identificou-se que nas atividades econômicas do agronegócio estão concentrados os maiores percentuais de AT, sendo o primeiro em frigorífico (16,9%), o segundo na agricultura (12,3%) e o sexto na pecuária (3,5%), mostrando correlações positivas entre taxas de incidência, mortalidade e letalidade de AT. (FAVA, 2020)
Outro agravo relacionado à exposição aos agrotóxicos, segundo a literatura, são os abortos espontâneos. Um estudo realizado por Soares (2020), identificou que entre o período de 2016 a 2018, foram registradas 10.073 internações hospitalares por aborto; destas, 2.700 são por abortos espontâneos, com média anual de 900 abortos. A taxa média de aborto variou de 0,8 a 36,2 abortos/10.000 mulheres em idade fértil, com a maior taxa correspondente ao município de Nova Lacerda. (SOARES, 2020).
Uma campanha pela vida e pela sustentabilidade
Por conta dessas evidências científicas, os setoriais e secretarias do Partido dos Trabalhadores se somam à grande mobilização da Sociedade para derrubarmos o PL do Veneno no Senado. Precisamos dialogar com os senadores, com os movimentos sociais, os meios de comunicação e a população em geral para alertar sobre as consequências do modelo de produção agrícola que já está consolidado no Brasil e deve se degradar mais ainda com essa liberalização dos agrotóxicos. Participe, mande mensagens para os senadores, mobilize a campanha nas redes sociais e em movimentos presenciais.
A Campanha proposta pretende ampliar o debate público, sobre o combate à fome, a partir da produção de alimentos saudáveis, com incentivos à agricultura familiar, bem como o acesso dos trabalhadores e trabalhadoras do campo à terra, e dos povos autóctones aos territórios à demarcação de seus territórios tradicionais. Propomos modelos solidários que vão muito além do lucro para poucos, mas a vida para todos. Propomos a implementação da Vigilância do Desenvolvimento para além da Vigilância em Saúde.
Esta campanha em consonância com campanhas institucionais semelhantes, como a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, pretende ampliar o debate para a elaboração de projetos para a redução do uso de agrotóxicos. Agradecemos aos pesquisadores e instituições apoiadoras desta campanha, especialmente as principais referências destas propostas, a Karen Friedrich e Wanderlei.
Uma campanha das secretarias e setoriais do PT: Agrária Nacional, Meio Ambiente e Desenvolvimento, Saúde, Segurança Alimentar, Combate ao Racismo, Assuntos Indígenas, Mulheres, Sindical, Defesa dos Direitos dos Animais, LGBT, Cultura e Juventude.
REFERÊNCIAS:
Costa VLS. Aspectos socioeconômicos, culturais e ambientais presentes no suicídio de trabalhadores e trabalhadoras inseridos no Agronegócio. [Dissertação]. Cuiabá:
Instituto de Saúde Coletiva da UFMT; 2018.
Fava NR. Relação dos acidentes do trabalho com o agronegócio em Mato Grosso e no Brasil, 2008 a 2017 [dissertação]. Cuiabá: Instituto de Saúde Coletiva da UFMT; 2020.
Friedrich, Karen (org.) 2021
Lara SS. Intoxicação aguda por agrotóxicos: um estudo do registro nas regiões agrícolas do agronegócio [dissertação]. Cuiabá: Instituto de Saúde Coletiva da UFMT; 2018.
Montanari Corrêa ML, Pignati WA, Pignatti MG, Lima FANS, Machado JHM. Alimento ou mercadoria? Indicadores de autossuficiência alimentar em territórios do agronegócio, Mato Grosso, Brasil. Saúde em debate, 2020. 35.Montanari Corrêa ML,
Oliveira, LK, Pignatti MG, Beserra L; Pignati WA. Processo sócio-sanitário-ambiental da poluição por agrotóxicos na bacia dos rios Juruena, Tapajós e Amazonas em Mato Grosso, Brasil. Saude soc. [online]. 2018, vol.27, n.2, pp.573-587.
Pignati WA, Lima FANS, Lara SS, Correa MLM, Barbosa JR, Leão LHC. Distribuição espacial do uso de agrotóxicos no Brasil: uma ferramenta para a Vigilância em Saúde. Ciênc. saúde coletiva. 2017; 22(10): 3281-3293.
Pignati WA, Montanari ML, Neri FA, Neves MS, Pistório BV. As injustiças sócio-sanitárias-ambientais: o agronegócio como violador do direito fundamental à saúde. In: Inácio Werner; Michèle Sato; Déborah Santos;. (Org.). Relatório estadual de direitos humanos e da Terra 2019. Mato Grosso, Brasil.. 1ed.Cuiaba: Associação Antônio Vieira, 2019, v. 1, p. 1-132.
Pignati WA. Segurança alimentar, produção de alimentos e saúde: um olhar para os territórios agrícolas de Mato Grosso. Aceno – Revista de Antropologia do Centro-Oeste, 2020.
Pistório BV, Pignatti MG, Leão LHC. Sofrimento Social de Trabalhadores Rurais Assentados na Contracorrente do Agronegócio, na Bacia do Juruena-MT. PSICOLOGIA: CIÊNCIA E PROFISSÃO (ONLINE), 2019.
Santos LB. Doenças do Aparelho Respiratório em Crianças Menores de 5 anos e Exposição Ambiental aos Agrotóxicos em Mato Grosso. 40f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Saúde Coletiva) – Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá-MT, 2020.
Soares MR. O uso de agrotóxicos e a relação com os indicadores de saúde materna e infanto-juvenil em Mato Grosso [Dissertação]. Cuiabá: Instituto de Saúde Coletiva, 2020.