Carta de Franco Ippolito, presidente da Fondazione Basso
Fundação italiana de promoção dos direitos humanos e dos direitos dos povos
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A exclusão do ex-presidente Inácio Lula da Silva da vida política brasileira se conclui entre as manifestações de júbilo das forças reacionárias daquele país.
O Supremo Tribunal Federal rejeitou o pedido de habeas corpus, abrindo assim o caminho para a prisão preventiva de Lula, mesmo na ausência de motivos cautelares, sem esperar o desenvolvimento do último juízo da sentença que o condenou por corrupção, concluindo um procedimento penal marcado por evidentes violações do devido processo, já destacado por juristas conceituados de vários países.
Ao anacronismo de um procedimento penal inquisitório, no qual magistrado, instrutor e juiz se concentram na mesma pessoa, acrescente-se pesadas campanhas da mídia, com a participação ativa do mesmo juiz que pronunciou a sentença de primeira instância e com a singular declaração do presidente do Tribunal de Apelação, no qual deveria ocorrer a audiência de segundo grau, que definiu a primeira sentença “tecnicamente irrepreensível”, definindo assim antecipadamente o resultado do recurso.
Entre os juízes do Supremo Tribunal Federal, acerca da presunção de inocência até que a sentença de condenação tivesse sido julgada, pervaleceu a curiosa opinião de que aguardar a sentença definitiva constituiria uma garantia de impunidade.
É impossível não constatar que às vésperas de tal decisão vários expoentes militares e até o chefe das Forças Armadas intervieram para sustentar publicamente a prisão preventiva de Lula justamente com o argumento do repúdio à impunidade.
A pesada ingerência dos militares na vida política brasileira, pela primeira vez desde a restauração da democracia, evoca lembranças sinistras da ditadura que oprimiu o Brasil de 1964 a 1984, que havia sido arquivada definitivamente justamente no governo Lula.
A exclusão de Lula por meio de um processo judicial marcado por anomalias clamorosas, que em todos os ordenamentos teriam imposto a rejeição dos juízes, e os trágicos acontecimentos que nas últimas semanas abateram a vida e a convivência civil do Brasil, devem causar preocupação e alarme em todos aqueles que estiveram próximos da América Latina na luta contra as ditaduras militares e pelos direitos humanos e dos povos.
É forte a impressão de que o ataque à democracia que ameaça fazer o Brasil recuar rumo a um regime baseado na discriminação e na violência constitua a prova geral para apagar em toda a América Latina a esperança de um desenvolvimento pacífico e sustentável e de um progresso real também para as classes menso favorecidas sociedade.
Roma, 6 aprile 2018
Franco Ippolito
*Tradução livre
Lelio Basso, falecido em 1979, advogado e ex-senador do Partido Socialista italiano, participou da luta contra a ditadura fascista de Mussolini e como tal foi preso. Em 1946 foi eleito deputado do PSI para a Assembleia Constituinte.
Foi um dos criadores das sessões italianas do Tribunal Bertrand Russell I e II sobre o Vietnã e as ditaduras na América Latina (1974 a 1976). Em 1979, Lelio Basso cria o Tribunal Permanente dos Povos.
A Fundação Lelio Basso foi criada em 1973 e atua nas áreas de promoção dos direitos humanos e direitos dos povos, política, cultura e formação política.