Bolsonaro tem responsabilidade em atentado contra indígenas, diz Cimi
Duas lideranças foram assassinadas neste sábado (7), no Maranhão, um mês após assassinato de outro líder da etnia; Conselho culpa governo por discursos de ódio
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Indígenas do povo Guajajara foram atacados a tiros no sábado (7), próximo à aldeia El Betel, na Terra Indígena Cana Brava, no município de Jenipapo dos Vieiras, no Maranhão. Dois caciques foram mortos, Firmino Praxede Guajajara, da TI Cana Brava, e Raimundo Belnício Guajajara, da TI Lagoa Comprida. Outros dois indígenas da etnia ficaram feridos, mas já estão fora de perigo e sendo atendidos em um hospital no município de Presidente Dutra.
De acordo com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), as lideranças participavam de uma reunião com a Eletronorte para discutir projetos que a empresa do setor elétrico se comprometeu a desenvolver junto ao território do povo Guajajara. Quando retornavam do encontro pela rodovia BR-226, atiradores, de dentro de um automóvel branco, alvejaram as lideranças. Esse é o segundo ataque a tiros contra indígenas Guajajara em menos de dois meses.
Em 1º de novembro, em uma emboscada preparada por invasores, o líder Paulo Paulino Guajajara foi assassinado na TI Araribóia, também no Maranhão. O indígena Laércio Souza Silva Guajajara também chegou a ser ferido pelos tiros, mas conseguiu sobreviver. Para o coordenador-regional do Cimi no Maranhão, Gilderlan Rodrigues da Silva, não há mera coincidência nestes crimes, como alerta em entrevista à jornalista Marilu Cabañas, da Rádio Brasil Atual.
“Nós avaliamos que o discurso do presidente (Jair Bolsonaro) de fato tem estimulado a violência contra os povos indígenas, e o resultado disso é o que a gente está vendo”, afirma Silva. “As terras indígenas, que estão na área da Amazônia, estão sofrendo cada vez mais com invasões potencializadas por esse discurso presidencial que ele tem feito desde a sua campanha. Logicamente isso também (ocorre pela) certeza da impunidade, porque uma coisa vai levando à outra, até então vários que cometeram crimes contra os indígenas não foram responsabilizados e isso também garante, potencializa, essa violência contra os povos indígenas na região”.
Coordenadora-executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Sonia Guajajara também atribuiu o novo episódio de violência ao presidente Bolsonaro. Em um vídeo divulgado em suas redes sociais, Sônia disse que esses crimes “não são casos isolados”. “São reflexo do ódio que vem sendo disseminado pela autoridade máxima do país contra nós, povos indígenas. O presidente deveria cumprir a Constituição Federal e garantir a proteção às nossas vidas e ao meio ambiente. Infelizmente o que vemos é o contrário, um comportamento que não condiz a um presidente”, contestou.
Até hoje, o assassinato do líder Paulo Paulino ainda não foi solucionado e nenhum dos criminosos foram identificados ou presos. Diante da impunidade que assola a comunidade, os indígenas impediram o acesso de veículos à BR 226 na tarde do sábado.
“O povo está com medo e o medo não vem só por conta das mortes. Há muito tempo eles (indígenas) vêm denunciando essas práticas de invasão, as ameaças que as lideranças estão sofrendo, o aumento da violência contra eles, isso há muito tempo já se sabia. Logicamente com os últimos acontecimentos esse medo está potencializado e leva os indígenas a pedirem mais proteção em seus territórios àquelas lideranças que estão sendo ameaçadas, para que eles não possam perder mais suas pessoas, os lutadores do povo, e que a proteção seja efetivada em seus territórios, isso é o que eles têm pedido desde sempre”, ressalta o coordenador-regional do Cimi.
Moro também é responsável
No entanto, de acordo com Gilderlan, apesar das ameaças a Funai tem seu trabalho “limitado” e foi entregue pelo governo Bolsonaro “nas mãos dos ruralistas”, com apoio do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, pasta na qual a Funai está ancorada. “Ele não tem cumprido o seu papel, deixando as terras indígenas totalmente desprotegidas, apesar das denúncias que os indígenas fazem, denúncias concretas. E, por conta deles não estarem protegidos, acaba acontecendo isso, é responsabilidade do ministério da Justiça também”.
Pelo Twitter, Moro se limitou a dizer que uma equipe foi deslocada ao local para investigar o crime e as motivações. Mas, segundo o coordenador-regional do Cimi, o ministro tem na verdade se recusado a receber representantes indígenas para tratar dessas denúncias e da demanda por demarcação de TIs. “Fica se manifestando pelo Twitter, ao invés de pensar uma política de proteção para os territórios e lideranças indígenas. Uma postura omissa e apática daquilo que é atribuição do ministério da Justiça”, destaca Gilderlan.
A jornalista Eliane Brum, reconhecida pela cobertura na área ambiental, afirmou que “estamos testemunhando o massacre dos povos indígenas”, e cobrou da sociedade uma mudança de postura diante dessa violência. “A maioria dos brasileiros vai continuar se omitindo?”, questionou.