Café PT: Dirigente do MST fala sobre reforma agrária, agroecologia e solidariedade
Em entrevista, Gilmar Mauro defende produção de alimentos saudáveis, enfrentamento à crise climática e aliança ampla com as classes trabalhadoras para transformar a realidade do campo e da cidade
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Ao Café PT desta sexta-feira (16), o dirigente do MST Gilmar Mauro destacou a trajetória da Feira Nacional da Reforma Agrária, que chegou à quinta edição em 2025. “É uma experiência histórica que lá atrás nós começamos a debater. Era uma forma de tentar trazer para a maior metrópole esse país uma amostra que é produzida nos assentamentos”, afirmou.
A edição deste ano contou com mais de 180 cooperativas, 23 cozinhas típicas, cerca de 2 mil produtos, e atraiu mais de 300 mil pessoas. Também foram distribuídas 40 toneladas de alimentos para entidades sociais e quase uma tonelada de sementes. “A feira existe porque existem assentamentos e assentamentos existem porque existiram e existem lutas, e ocupações de terra”.
A diversidade dos produtos levados à feira é, segundo Gilmar Mauro, uma resposta concreta ao modelo industrializado de alimentação que domina o mercado. “Quatro produtos, arroz, feijão, milho e trigo, conformam quase 60% dos alimentos levados aos supermercados no Ocidente. Esses produtos foram ultraprocessados, com um monte de consequências para a saúde humana”, criticou.
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Ele também reforçou o papel das agroindústrias do MST. “Só no PAA, por exemplo, entregamos 400 tipos diferentes de alimentos. É possível alimentar toda a humanidade de forma agroecológica, evidentemente com tecnologia”.
O dirigente destacou o plano do MST de plantar 100 milhões de árvores em 10 anos. “Já estamos chegando a 40 milhões. Plantar árvores é plantar cuidado. Doar alimentos é solidariedade plantar”, afirmou.
Mauro citou ainda ações com a juventude e a importância da educação ambiental. “Os mais prejudicados pela questão ambiental sequer nasceram”.
“Mandamos brigadas para a África, Haiti, Cuba, Venezuela e Palestina. Quando a gente faz isso, a gente planta o internacionalismo em nós”, disse. Sobre as doações da feira, Gilmar relatou: “Esses alimentos vão servir para resolver um problema objetivo de alimentação saudável e para fortalecer a aliança entre campo e cidade”.
Reforma agrária
Durante a feira, o MST promoveu o encontro “Café com Parlamentares”, reunindo mais de 60 parlamentares. “Foi muito importante. Temos 65 mil famílias acampadas há 10, 15, 20 anos. Precisamos de orçamento. Pressionamos o governo federal e buscamos apoio do parlamento”, explicou.
“A reforma agrária não interessa só às famílias sem-terra. É uma das coisas mais modernas a ser feita na atualidade e interessa a todas as classes trabalhadoras do Brasil”.
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Urgência climática
Durante a entrevista, Gilmar Mauro falou sobre a afirmação do cientista Carlos Nobre de que o MST pode liderar a transição agroecológica no Brasil. “Já chegou a 1,5 grau de aquecimento acima da média histórica. Tem impactos graves. Mais pessoas pelo clima do que por guerras”. Para ele, é preciso plantar bilhões de árvores e fazer uma revolução na agricultura.
“O MST defende uma reforma agrária com agrofloresta e agroecologia”, explicou.
Ele destacou o esforço do MST em dialogar para além da base sem-terra. “Ocupar terra junto com pensar um projeto de futuro. A agricultura ensina: se a gente quiser colher abacate, é preciso plantar abacate. E nós queremos plantar cuidado com a natureza, com o ser humano, com a felicidade humana”.
O dirigente destacou que, durante a feira, 970 kg de sementes orgânicas foram distribuídos.
“Somos o maior produtor de sementes orgânicas da América Latina. Os guardiões das sementes fizeram um seminário extraordinário. Coletores de sementes de árvores em extinção trouxeram sementes nativas”.
Ele também celebrou a adesão de grupos como a torcida corintiana à meta de plantio. “A simbologia disso é fundamental”.
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Alianças internacionais
Gilmar Mauro ressaltou o caráter internacionalista do MST. “Estamos em duas construções importantes, a Via Campesina, com mais de 70 países, e a Articulação Internacional dos Povos. Fazemos isso sem nariz empinado, mas buscando gente do mundo inteiro para construir lutas em todos os continentes”.
E reforçou a mobilização por mais assentamentos, com o Abril Vermelho, que em 2025 contornou com mais de 40 ações em 17 estados. “Foram 17 mil a 18 mil famílias mobilizadas. Precisamos assentar 65 mil famílias. Com um custo médio de R$ 100 mil por assentamento, seriam necessários R$ 6,5 bilhões. Um ponto percentual da Selic consome R$ 48 bilhões”, comparou.
Gilmar Mauro falou ainda sobre a eleição de 133 candidaturas ligadas ao MST em 2024. “Há quem ache que estamos nos institucionalizando. Mas temos três frentes: luta pela terra, produção com agroindústrias e cooperativas, e a disputa institucional. Não vamos abrir mão de nenhuma”.
Para ele, disputar espaços como câmaras municipais e conselhos tutelares é estratégico: “Se deixarmos esse espaço livre, outros ocupam. Precisamos avaliar se essa experiência está acumulando forças como queremos”.
O dirigente do MST finalizou uma entrevista agradecendo o apoio da militância do PT ao longo da trajetória do MST.
“Essa construção não é só nossa. O MST é um patrimônio da classe trabalhadora, porque sempre conto com a participação e a solidariedade da classe trabalhadora”.
Da Redação