Campello e Schwarzer: Bolsa Família e desenvolvimento com equilíbrio e inclusão social
Em 11 anos, o Bolsa Família se consolidou como um dos pilares da estratégia de combate à pobreza e à exclusão social no Brasil. O programa atende hoje cerca de…
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Em 11 anos, o Bolsa Família se consolidou como um dos pilares da estratégia de combate à pobreza e à exclusão social no Brasil. O programa atende hoje cerca de 14 milhões de famílias, sempre mantendo o foco nos mais pobres, característica que lhe rendeu reconhecimento internacional.
Nesse período, mais de 3,1 milhões de famílias deixaram o programa voluntariamente, por terem superado o limite de renda prevista no programa ou por terem deixado de atualizar suas informações no Cadastro Único dentro do prazo previsto, sugerindo que não precisavam mais do complemento de renda.
Os beneficiários devem atualizar seus dados no Cadastro Único a cada dois anos. Só no mês passado, ao final de mais um ciclo de revisão cadastral, quase 450 mil famílias tiveram o benefício cancelado.
Outras 3 milhões de famílias foram desligadas do Bolsa Família desde o início do programa em decorrência de rotinas de monitoramento e controle realizadas anualmente.
Sem fixarmos prazo para a superação da pobreza, consideramos desejável que as famílias beneficiárias consigam fazer uma saída sustentada do programa – e os números mostram que isso vem acontecendo com milhares de famílias nos últimos anos.
Criado em 2003, o Bolsa Família paga em média R$ 170 mensais às famílias mais pobres e, em contrapartida, exige que enviem suas crianças e jovens à escola, bem como cumpram uma agenda periódica de acompanhamento em saúde.
O programa monitora bimestralmente a frequência escolar de 15,7 milhões de estudantes, entre os quais 96,3% efetivamente cumprem uma presença mínima de 85% (de 6 a 15 anos de idade) ou 75% (de 16 a 17 anos de idade). Dos 5 milhões de crianças de até 6 anos com o calendário de vacinação acompanhado, 99% estão em dia. Entre as gestantes beneficiárias, aumentou o percentual daquelas que começam o acompanhamento pré-natal já nos primeiros 90 dias da gestação.
Os impactos do Bolsa Família estão amplamente documentados. Entre eles destaca-se a contribuição à queda da pobreza extrema no Brasil, com a retirada de 36 milhões de pessoas da miséria, das quais 22 milhões entre 2011 e 2014. Outro resultado relevante é o aumento da seguridade alimentar e nutricional, com queda pela metade no déficit de estatura das crianças beneficiárias, entre 2008 e 2012, bem como uma grande expansão no acesso à educação, resultando em maiores taxas escolares de frequência e aprovação no ensino fundamental e médio dos jovens beneficiários.
Os resultados, como se vê, vão muito além da garantia de renda às famílias e alcançam várias dimensões da pobreza, como o acesso à educação, saúde e serviços. Estudo baseado em metodologia do Banco Mundial atestou que em dez anos, desde a criação do Bolsa Família, o percentual de brasileiros vivendo privações múltiplas caiu de 8% para 1,1% da população. Essa queda foi mais relevante justamente onde a pobreza era maior: no Nordeste, entre negros e nas famílias com filhos menores.
Tão importantes quanto os efeitos imediatos no acesso a renda, serviços e bens são os impactos de longo prazo na formação dos jovens que permanecem na escola. Trata-se de uma contribuição estratégica para o desenvolvimento. Níveis mais elevados de escolaridade são necessários para que os jovens tenham oportunidades de inclusão social via trabalho decente na etapa adulta, numa trajetória diferente da que seus pais tiveram. Ao mesmo tempo, a maior escolaridade é fundamental para aumentar a produtividade da economia brasileira.
Essa produtividade também melhora com os esforços do Plano Brasil Sem Miséria para ampliar a inclusão econômica das famílias. Mais de 1,7 milhão de vagas de qualificação profissional do Pronatec foram ocupadas por pessoas de baixa renda desde 2011. E quase meio milhão de beneficiários se tornaram microempreendedores individuais no mesmo período.
Neste contexto de resultados obtidos, surpreende ouvir manifestações de que o Bolsa Família tiraria pessoas do mercado de trabalho e criaria dependência, manifestações essas associadas à defesa de um tempo limite de permanência no programa. O suposto “efeito preguiça” não tem amparo nos fatos, já que a taxa de atividade dos adultos das famílias beneficiárias – de 75% – é equivalente à das famílias não beneficiárias. De fato, o Bolsa Família não substitui a renda do trabalho, mas a complementa.
Outros argumentos, como o que o Bolsa Família incentivaria as famílias a terem mais filhos, são cabalmente contrapostos pelos fatos. Conforme o IBGE, entre 2003 e 2013, o número de filhos por mulher caiu mais acentuadamente entre os 20% mais pobres, na faixa de renda atendida pelo programa, 50% mais do que na média da população.
Em resumo, o Programa Bolsa Família presta contribuições essenciais à sociedade brasileira: alívio massivo da pobreza extrema, apoio ao acesso universal à escola e a serviços de saúde, mais paz e coesão social, fortalecimento da demanda interna e geração de emprego e renda com impacto sobre o crescimento econômico, sobretudo dos setores de consumo popular. Nenhum país pode prescindir de um sistema de proteção social eficiente para o seu desenvolvimento.
O Bolsa Família articula virtuosamente renda e serviços para um a cada quatro brasileiros, os 25% mais pobres, e custa apenas 0,5% do PIB, em gastos que retornam para estimular a economia. Ele não é peça passageira de um paradigma “que se esgotou”, mas elemento chave para um modelo de desenvolvimento includente e equilibrado no Brasil no longo prazo.
(Artigo originalmente publicado no jornal “Valor Econômico“, no dia 13 de maio de 2015)
Tereza Campello é ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
Helmut Schwarzer é secretário nacional de Renda de Cidadania do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome