Chico D’Angelo: Calero é política falida travestida de jovialidade
Há uma ação articulada do governo interino Temer com o objetivo de atacar e promover o desmonte de setores estratégicos
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A criação do Ministério da Cultura, em 1985, está entre as ações mais importante ocorridas no âmbito da redemocratização do Brasil, pois assinalou o reconhecimento ao papel que a arte e a cultura brasileiras desempenham para a construção da cidadania e para a valorização da pluralidade e da diversidade do nosso povo.
É triste, portanto, perceber que, com os mesmos intuitos pequenos que moveram Collor a rebaixar a Cultura ao status de uma Secretaria, o governo interino de Michel Temer tentou rebaixar a cultura a uma das secretarias do Ministério da Educação com a intenção de penalizar os artistas brasileiros que se engajaram contra a farsa do seu governo.
Tragédia impedida pela mobilização dos artistas e ativistas da cultura em todo o país, através das ocupações e de ações de protesto que se constituíram como uma das mais importantes ações de resistência no nosso país.
É evidente, como podemos observar pelas das demissões em massa realizadas na última semana, que o plano de desmonte do Ministério da Cultura não morreu e segue curso acelerado. O ministro interino, Marcelo Calero, se revela completamente despreparado e sem qualificação para o cargo, conduzindo a farsa do “desaparelhamento” do Estado.
Essas demissões de funcionários com perfis técnicos mostram que Calero conduz uma política de terra arrasada, causando um estrago no Ministério com a saida de profissionais experientes, competentes e conhecedores do seu funcionamento. A maioria desses funcionários, inclusive, sequer apoiou ou votou na presidenta Dilma Rousseff.
Calero mistura um discurso macartista de caça às bruxas com as birras de uma criança mimada. Para ser coerente, deveria complementar esse discurso de defesa de funcionários concursados se demitindo do próprio cargo em nome de um funcionário de carreira.
Há uma ação articulada desse governo interino Temer com o objetivo de atacar e promover o desmonte de setores estratégicos, como a cultura, a educação, a saúde e os direitos sociais e trabalhistas. Esse ministro se revela um tecnocrata raivoso, a serviço de um governo fragilizado no campo simbólico pela maneira como alcançou o poder, e empresta seu nome, revestido da imagem jovial, ao projeto carcomido das velhas elites. Recorre a práticas truculentas, dignas de um capitão do mato a serviço de um senhor.
Parece até que o sentido da recriação do MinC finalmente se explica em uma lógica perversa e revelada: voltar com o Ministério, estrategicamente, como um passo decisivo para a sua destruição, acabando de maneira rápida com áreas responsáveis pela condução de importantes políticas públicas, como a Diretoria do Livro, Literatura e Leitura, que articulava e promovia o Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas, uma das políticas mais bem sucedidas do país.
Se for concretizado, isso será um desastre para o MinC, que desde 2003, sob a gestão de Gil, passou a adotar uma visão integral da cultura. Aprimorando os mecanismos de fomento cultural, afirmando a diversidade cultural, rompendo com as falsas oposições entre a cultura popular e a alta cultura e afirmando que todo o povo brasileiro possui cultura e tem o direito de usufruir dos bens culturais que ele produz. Uma experiência exitosa que se tornou exemplo internacional.
Um Ministério que já foi encabeçado por figuras tão importantes como Celso Furtado e o grande Gilberto Gil, que mudou a face e o conteúdo das políticas culturais no Brasil, não merece ser comandado por alguém tão despreparado, desqualificado e mesquinho como Marcelo Calero.
Chico D’Angelo é deputado federal pelo PT-RJ e Presidente da Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados