Eleições 2020 | Tudo que as pré-candidatas precisam saber sobre financiamento coletivo
Artigo da advogada eleitoral Gabriela Araújo
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De acordo com o artigo 22-A, §3º, da Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições), a partir do dia 15 de maio do ano eleitoral, é facultada às pré-candidatas e aos pré-candidatos a arrecadação prévia de recursos por meio de instituições que promovam técnicas e serviços de financiamento coletivo, que pode ser realizado por meio de sítios na internet, aplicativos eletrônicos e outros recursos similares.
No entanto, a liberação de recursos por parte das entidades arrecadadoras fica condicionada ao registro da candidatura, e a realização de despesas de campanha deverá observar o calendário eleitoral.
Em outras palavras, os recursos até já podem ser arrecadados durante a fase da pré-campanha, mas não serão disponibilizados de imediato às pré-candidatas e pré-candidatos que optarem pelo financiamento coletivo, também conhecido como “crowdfunding” ou vaquinha eleitoral.
Ocorre que, na operação do financiamento coletivo, as entidades arrecadadoras servem como verdadeiras intermediárias entre os doadores e as pré-candidatas ou pré-candidatos, figurando tais empresas como fiéis depositárias dos recursos arrecadados, até que se dê o efetivo registro das candidaturas, com a consequente emissão de CNPJ eleitoral e abertura de conta bancária específica de campanha, por meio da qual será então realizada a movimentação dos recursos eleitorais.
Considerando que o último dia do prazo para registro das chapas é o dia 15 de agosto, e que a propaganda eleitoral oficial começa a partir do dia 16 de agosto, pode-se considerar que os recursos arrecadados na pré-campanha começarão a ser disponibilizados às candidatas e candidatos perto dessa data.
Como se pode observar, portanto, existe um alto grau de responsabilidade na gestão e guarda dos recursos financeiros arrecadados, de modo que não é qualquer empresa que está autorizada a promover o financiamento coletivo para fins eleitorais. A Justiça Eleitoral apenas credenciará aquelas que atenderem, nos termos da lei e da regulamentação expedida pelo Banco Central do Brasil, os critérios para operar arranjos de pagamento, e desde que estejam aptas a assumir algumas responsabilidades, tais como:
i) identificação obrigatória, com o nome completo e o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) de cada um dos doadores e das quantias doadas
ii) disponibilização em sítio eletrônico disponível à consulta pública de lista com identificação dos doadores e das respectivas quantias doadas, a ser atualizada instantaneamente a cada nova doação
iii) emissão obrigatória de recibo para o doador, relativo a cada doação realizada, sob a responsabilidade da entidade arrecadadora, com envio imediato para a Justiça Eleitoral e para o candidato de todas as informações relativas à doação
iv) dar ampla ciência a candidatos e eleitores acerca das taxas administrativas a serem cobradas pela realização do serviço – as empresas podem cobrar, por exemplo, um percentual em cima de cada doação recebida, antes de repassar os valores às campanhas
v) fazer referência ao limite legal fixado para doação (10% dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição), com a advertência de que o valor do limite é calculado pela soma de todas as doações realizadas no período
eleitoral e a sua não observância poderá gerar aplicação de multa de até 100% (cem) por cento do valor excedido
vi) verificar e impedir a entrada de recursos oriundos de fontes vedadas: pessoas jurídicas; pessoas físicas permissionárias de serviços públicos; e recursos de origem estrangeira. As empresas arrecadadoras ficarão solidariamente responsáveis, junto com as candidaturas, pela eventual entrada indevida de recursos dessas fontes, que são proibidas de contribuir com as campanhas, uma vez que apenas as pessoas físicas (não permissionárias de serviços públicos) é que podem efetuar doações para as campanhas eleitorais
vii) caso as pré-candidatas ou os pré-candidatos desistam das candidaturas antes do registro, ou por algum motivo não tenham o registro efetivado, ou então tenham o registro indeferido antes mesmo de iniciar a campanha, as doações arrecadadas na pré-campanha deverão ser devolvidas a cada um dos doadores, descontadas eventuais taxas previamente acordadas.
Dessa forma, é essencial que as pré-candidatas e os pré-candidatos, que tenham interesse em efetuar a arrecadação prévia de recursos eleitorais, contratem apenas as empresas com cadastro deferido na lista disponibilizada no sítio eletrônico do Tribunal Superior Eleitoral, feita a ressalva de que não há regulamentação pela Justiça Eleitoral das condições contratuais relativas à cobrança de taxas administrativas aplicadas à arrecadação para pré-candidatos.
Esse assunto deverá ser estabelecido em contrato entre a pré-candidata e a entidade arrecadadora e fica aí sob a égide da legislação civil aplicável a todas as relações contratuais.
Por fim, importa ressaltar que o financiamento coletivo não é válido apenas para a fase da pré-campanha, mas pode ser contratado também após o registro das candidaturas e operar até o dia das Eleições.
Nessa fase de pré-campanha, porém, esse mecanismo ganha especial importância, posto que é a única forma pela qual as pré-candidatas podem promover a arrecadação prévia de recursos financeiros, e ainda serve como um grande fio condutor para o engajamento nas redes e a divulgação de suas pré-candidaturas.
Gabriela Shizue Soares de Araujo, advogada eleitoralista, professora de Direito Eleitoral e Coordenadora de Extensão, Mídia e Eventos da Escola Paulista de Direito (EPD). Mestre e Doutoranda em Direito Constitucional pela PUC-SP. Membro do observatório de Candidaturas Femininas da OAB-SP e da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP. Apresentadora do programa Diversas: O Direito Por Elas, na Escola Superior da Advocacia da OAB-SP.