Entre a paridade e unicórnios: uma reflexão sobre as cotas e a paridade para as eleições no PT

Em artigo, Ludmila Queiroz fala do pioneirismo do PT na busca pela equidade de gênero nos espaços de direção, mas afirma que o País e o próprio partido ainda caminham a passos muitos lentos para uma real igualdade de condições de disputa e ocupação nos espaços de poder

O Machismo e o racismo são eixos estruturantes na desigualdade presente na nossa sociedade. O preconceito geracional é também face importante nesse contexto. Medidas de empoderamento e reparação para que estes grupos estejam representados são fundamentais na busca por uma sociedade mais justa.

Se observarmos que em nosso país a escravidão deixou de existir há pouco mais de um século e que há menos de 100 anos as mulheres não tinham direito ao voto, teremos uma pequena mostra do quanto essa luta pela garantia de dignidade à pessoa é nova em nossa cultura.

Dessa forma o PT, partido que elegeu a primeira presidenta do país, é pioneiro na busca pela equidade de gênero nos espaços de direção, inicialmente as cotas de 30% e a partir do 4º congresso, com a paridade de gênero e as cotas de 20% para jovens, negros e negras para os cargos na direção partidária.

Contudo, caminhamos ainda a passos muitos lentos em direção a uma real igualdade de condições de disputa e ocupação nos espaços de poder, inclusive dentro do partido dos trabalhadores.

O empoderamento das mulheres, dxs negros e dxs jovens é visto como uma obrigação, como uma incômoda tarefa a ser cumprida na hora da indicação para os cargos da direção do PT. Para alguns, cumprir a “paridade” como já foi inclusive publicizado, significa ter uma direção menos combativa e menos capaz de dar conta das tarefas políticas, em especial com a crise que vivemos.

A implantação desse processo de tornar os lugares de direção do PT mais democráticos ainda é marcado pela tutela dos homens que não puderam entrar nas executivas e diretórios indicam por exemplo, suas filhas, esposas e irmãs para os cargos, usando-as tão somente para a reprodução de seus pensamentos e opiniões numa política de cabresto, na qual a autonomia dessas mulheres, sobretudo as mais jovens não têm vez.

Além disso, nós mulheres jovens que ocupamos o espaço de direção com legitimidade e autonomia nos vemos enfraquecidas por esse método político machista que apenas demarca o espaço do homem ‘‘dono’’ da vaga da direção ou do lugar na chapa. Pois tendo mulheres como companheiras de direção que não compreendem seu papel de vanguarda estando na direção de um partido político como o PT, nossas pautas continuarão em segundo plano, nossas candidaturas enfraquecidas e nossa atuação fragmentada, mesmo que a longo prazo, essas companheiras se fortaleçam e se empoderem.

Nesse sentido, ainda há um processo de unicornização da figura da jovem mulher negra. Na lógica viciada onde cumprir as cotas e a paridade é algo ruim, uma única pessoa que cumpra todos requisitos simplifica a questão da manutenção de poder dos nossos companheiros. Frases como “jovens mulheres negras são artigo de luxo no PT hoje” são reproduzidas pelos dirigentes como se fosse uma coisa boa ter sua capacidade questionada; como se o único motivo de estar naquele fosse sua condição e não a política que desenvolve.

O termo “unicórnio” então, vem da ideia de caçar algo raro e seu processo é o de reforçar a submissão dessa mulher, jovem e negra, pois ao cabo do processo muitos de nossos “capas” não nos enxerga como dirigentes e os acordos políticos ainda acontecem entre os velhos homens brancos. Se nas direções temos a presença de 50% de mulheres, raramente encontramos mulheres nas direções das tendências internas do PT, no papel de articuladoras e porta-vozes da política de seu grupamento.

Além disso, é recorrente a fetichização do uso do lugar de fala dessas mulheres. Pra todas as polêmicas, em especial nas pautas caras para as mulheres e para negros e negras, coloca-se essas jovens, orientadas por seus dirigentes, pra fazer a defesa do que é indefensável. Desgastando sua imagem e preservando a de quem realmente pensa o que foi dito.

A Juventude do PT foi pioneira ao criar ricos espaços de auto-organização das jovens mulheres que nos permitiam acumular força para, entre outras coisas, aprovar a paridade de gênero no I Congresso da JPT em 2008. Posteriormente porém, não conseguimos enraizar nossas pautas nem promover um processo de avaliação do funcionamento da paridade. Hoje, com a paridade em todo o partido, esta reflexão se faz ainda mais necessária.

Sendo assim, o 3 Congresso da JPT é um espaço fundamental para que nos aprofundemos sobre a temática, espaço em que devemos debater a garantia e a autonomia dos e das novas dirigentes, ofertando formação política a estes e estas e ajudando na mudança da mentalidade do PT.

É necessário que a JPT se debruce sobre essas questões, passando orientação aos secretários de formação política um trabalho diferenciado com essas lideranças que ocupam os cargos na cota de juventude, sobretudo as mulheres. Criando espaços de fortalecimento destes e destas que são dirigentes do PT no presente e não no futuro.

Ludmila Queiroz é militante do Fora da Ordem e Candidata a Secretária Estadual da JPT no Rio de Janeiro

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