Gleisi Hoffmann: O Banco Central e as raposas

Presidente da CAE do Senado alerta para risco de relações não republicanas entre setor financeiro e equipe econômica do governo golpista de Michel Temer

A mídia não cansa de incensar a equipe econômica do governo interino e ilegítimo. Mais do que comentários elogiosos, as matérias ressaltam a todo momento que a economia deverá reagir positivamente só pelos profissionais escolhidos pelo presidente da República em exercício.

É fato que os currículos dos principais nomes são muito respeitados no Brasil e no exterior, notadamente do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles – presidente do Banco Central na gestão do ex-presidente Lula, é bom ressaltar! Alerto, no entanto, que não se trata somente de formação acadêmica ou, até mesmo, de experiência profissional, mas de responsabilidade na formulação e execução de política econômica e a quem ela servirá.

Nos próximos dias, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado vai sabatinar quatro candidatos para a diretoria do Banco Central. Um deles, Reinaldo Le Grazie, indicado para diretor de Política Monetária do BC, passou os últimos cinco anos no Bradesco, tendo assumido o comando da área de Asset Management em 2014.

No início de junho, na mesma Comissão do Senado, o economista Ilan Goldfajn enfrentou inevitáveis questionamentos sobre o conflito de interesses em comandar o Banco Central imediatamente após se desligar do maior banco privado do país. Não há como ignorar o fato. Foram sete longos anos como economista-chefe e sócio do Itaú, interrompidos pela indicação para o cargo máximo da instituição responsável por regular e fiscalizar o sistema financeiro nacional. De forma interina, é bom lembrar!

Considerando que esse é um governo provisório, a qualquer momento toda a nova diretoria poderá ser desmontada, abrindo uma oportunidade não menos valiosa para o mercado financeiro: receber de volta seus representantes munidos de expertise e informações privilegiadas de governo.

O mesmo profissional que até ontem assinava a análise de conjuntura econômica para os diversos setores do Itaú, hoje tem acesso a todo tipo de informação, inclusive as sigilosas, dos concorrentes. O ex-coordenador das equipes de desenvolvimento de cenários para os grandes clientes da instituição financeira, agora preside o Copom –Comitê de Políticas Econômicas. E quem comandava no Bradesco a gestão da carteira de ativos financeiros e orientava os investimentos dos clientes corporativos, poderá ser um dos agentes públicos decisivos na política monetária, abaixo apenas do presidente do BC.

Ao fixar a Selic – taxa básica de juros do país -, o Banco Central acaba por definir o custo das operações de financiamento e o rendimento dos investimentos financeiros. Sem falar na cotação do dólar e no mercado de crédito. Mesmo após a venda das ações de Goldfajn e o desligamento de Le Grazie, ambos entram para o serviço público com o estigma de representar os bancos privados, em especial o Itaú e o Bradesco, gigantes do setor. É a concretização do velho ditado da raposa que cuida do galinheiro.

Gleisi Hoffmann é senadora do PT pelo Paraná e presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal

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