Governo antecipa segunda parcela de auxílio sem concluir a primeira

Demora no processamento das solicitações de seguro para trabalhadores informais e famílias cadastradas no CadÚnico causa filas pela terceira semana seguida nas capitais e regiões metropolitanas  

Tarciso Augusto

Fila em lotérica no bairro de Casa Amarela, em Recife

Em uma tentativa de gerar “agenda positiva” após os ataques explícitos ao Estado de Direito no domingo, 19, o governo escalou o presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, para anunciar a antecipação do pagamento da segunda parcela do auxílio emergencial para trabalhadores informais. Inicialmente prevista para 27 de abril, a parcela será paga a partir desta quinta, 23, disse ele, que não se pronunciou sobre os estimados mais de 20 milhões ainda na fila para receber a primeira parcela.

A Dataprev, estatal responsável pelo processamento da análise de elegibilidade, afirma que, ao todo, 45,2 milhões de pessoas já foram aprovadas para receber o auxílio emergencial. Mas o número exato dos beneficiários do programa ainda não é conhecido, pois os processos de análise não foram concluídos devido a uma série de pendências, como irregularidades no CPF de candidatos.

O aplicativo Caixa Auxílio Emergencial já teve mais de 50,3 milhões de downloads. A ferramenta digital serve para que trabalhadores informais, autônomos, contribuintes individuais do INSS e microempreendedores individuais solicitem o benefício. Enquanto isso, pipocam pelo país relatos de beneficiários que concluíram seus cadastros, mas ainda não receberam os pagamentos.

“Entendemos que essa espera é frustrante, mas uma boa notícia é que quando for receber, vai receber de uma só vez duas parcelas”, prometeu Guimarães, garantindo que mais de 24 milhões de pessoas já receberam o benefício.

Associação contesta

A instituição manteve abertas mais de 770 agências nesta terça, 21, e anuncia novo mutirão para o sábado, 25. A Associação do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Apcef) de São Paulo contestou a decisão, afirmando em nota que “as filas estão enormes porque o atendimento buscado pela população não é aquele oferecido pelos empregados que atendem presencialmente nas unidades”.

Segundo a entidade sindical, as principais demandas são o esclarecimento de dúvidas e busca por informações sobre o auxílio emergencial, além de relatos de problemas no acesso ao aplicativo da instituição. “A não ser que a empresa tenha um plano de transformar os empregados em bytes de dados para atuarem dentro do aplicativo, a população continuará frustrada e as filas seguirão”, conclui a nota.

Nesta segunda, 20, centenas de trabalhadores informais amanheceram em uma fila que dobrou um quarteirão na Zona Leste de Manaus, em frente a uma agência da CEF. A fila de mais de 500 metros podia ser vista de longe. Dezenas haviam dormido em frente à agência e, embora os funcionários da agência insistissem que o serviço poderia ser feito pelo aplicativo, muitos reclamavam que a análise de seus processos se arrastava há mais de duas semanas.

Filas aumentam

No Recife, três dos quatro bairros com maior incidência de casos do novo coronavírus – Madalena, Casa Amarela e Torre – também amanheceram com filas em bancos e casas lotéricas. Em Casa Amarela, que contabilizava 48 casos e uma morte nesta segunda, bastava atravessar a Esquina do Arraial para se deparar com filas enormes para bancos e lotéricas, sem nenhum ordenamento.

Em Fortaleza, outra capital nordestina em situação de emergência pela pandemia, cerca de 100 pessoas reuniram cadeiras e papelões para acampar na calçada da agência do Bairro Messejana. Várias estavam lá pela terceira ou quarta vez. No Centro, a fila dobrou a Rua Guilherme Rocha, mesma cena vista na agência da Avenida Francisco Sá, no Bairro Jacarecanga. Neste último, houve reclamações pela venda de senhas a R$ 30,00 no local.

Na agência da Caixa no distrito do Ouro Verde, em Campinas, Região Metropolitana de São Paulo, a cena vista na manhã desta segunda foi de filas dobrando a esquina de pessoas de diferentes faixas etárias, a maioria sem máscara de proteção e sem respeitar a distância recomendada. A cidade registrava na manhã de segunda 177 casos confirmados da doença e oito mortes, com 986 pacientes em investigação. Em São Gonçalo, Região Metropolitana do Rio de Janeiro, pela terceira semana consecutiva, centenas de pessoas formaram filas nas agências da Caixa e da Receita Federal.

Burocracia continua

Na última semana, decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) havia suspenso a regularização do CPF para o recebimento do auxílio emergencial. Em atendimento a um pedido do estado do Pará, o tribunal entendeu que a exigência extrapolava o poder de regulamentação da lei que instituiu o auxílio.

O processo chegou ao presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), João Otávio de Noronha, que, a pedido do governo federal, sustou os efeitos da liminar. Para o ministro, a modificação nos critérios para a obtenção do benefício poderia atrasar o processamento das solicitações.

Mas a judicialização derivada da demora no pagamento do auxílio emergencial prossegue em outras frentes. O Ministério Público Federal (MPF) em Goiás também ajuizou ação civil pública, na sexta, 17, contra a CEF e a União, pedindo providências imediatas para evitar aglomerações nas agências da instituição financeira em todo o País. A mesma ação foi proposta pelo Ministério Público e a Defensoria Pública de Mato Grosso, contra o Banco do Brasil e Banco Bradesco de Cáceres (MT), a 219 quilômetros da capital Cuiabá.

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