Humberto Costa: Fora do tom
Marta Suplicy é uma política de grandes qualidades. Entre elas, a coerência e a elegância. Porém, na terça (27), em artigo nesta Folha intitulado “O diretor sumiu”, a senadora deixou…
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Marta Suplicy é uma política de grandes qualidades. Entre elas, a coerência e a elegância. Porém, na terça (27), em artigo nesta Folha intitulado “O diretor sumiu”, a senadora deixou de lado o exercício dessas apreciadas virtudes.
“Diferentemente do que diz Marta Suplicy, estamos longe de um “descalabro”.”
No texto, a ex-deputada federal, ex-prefeita de São Paulo, duas vezes ministra e atual senadora pelo PT teceu críticas inapropriadas tanto ao partido como ao governo da presidenta Dilma, do qual foi integrante até poucos meses atrás.
Falou como se ignorasse uma das mais duradouras crises internacionais, em que a França contabiliza o maior número de desempregados da sua história. Ignorou que a Suíça está à beira da recessão, que a Rússia vive uma situação de pré-calote e que até a China está desacelerando. A crise não é brasileira nem foi gestada por ausência de confiança e de credibilidade.
Tampouco foi por falta de transparência na condução da economia. Em momento algum a presidenta pintou uma “situação rósea”. Todos os dados referentes à situação do país eram públicos e foram debatidos na campanha eleitoral.
Do mesmo modo, Dilma Rousseff sempre assumiu que os ajustes necessários para controlar a inflação e promover o equilíbrio fiscal eram essenciais à manutenção do desenvolvimento inclusivo, compromisso permanente do PT.
Diferentemente do que diz Marta Suplicy, estamos longe de um “descalabro”. No seu primeiro mandato, a presidenta ofereceu estímulo à economia com desonerações superiores a R$ 104 bilhões. As tarifas estabilizaram e a inflação média de sua gestão fechou no menor patamar desde o início do Real.
A dívida pública foi controlada, os investimentos externos cresceram, programas sociais relevantes, como Mais Médicos, Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego) e Minha Casa, Minha Vida, alavancaram, recursos para a educação aumentaram em 93% e o desemprego chegou ao menor índice da história do país.
Com o cenário externo prejudicado, entretanto, o governo teve que agir para manter o país nos eixos. As medidas conjunturais foram adotadas às claras. E a equipe econômica, apoiada pela presidenta, tem se esmerado em explicar à população a pertinência delas.
É desarrazoado condenar o governo por ajustes que mantenham a estabilidade, combatam a inflação e assegurem o que de mais precioso conquistamos nesses 12 anos: emprego, crescimento de renda e de inclusão, além de largos avanços sociais pelos quais o Brasil é um país globalmente reconhecido.
Marta reúne todos os requisitos para críticas que julgar pertinentes fazer ao PT e ao governo. Mas há foros apropriados para fazê-las. E ela não os utilizou nem em um caso nem em outro. Aliás, como ministra da Cultura, esteve até três meses atrás na gestão à qual atribui, agora, “situação de descalabro”.
A população, a despeito de alguns derrotistas, segue ao lado do Brasil que cresce com os brasileiros. E, mesmo sabendo do gosto amargo de algumas dessas medidas passageiras, está consciente da sua necessidade.
Quem não se lembra, em 2003, o primeiro ano sob Lula, quando também adotamos ajustes duros contra conjuntura adversa? A partir dali, conseguimos promover o maior processo de redução de miséria e de desigualdade social do planeta. O momento atual exige esforços em favor dos mesmos compromissos.
No comando dessa peça, a presidenta Dilma Rousseff atua como a dedicada diretora que conhece o público, o enredo e os atores. O que não cabe a qualquer ator, entre os quais incluo Marta, é sair do script a ponto de prejudicar os colegas de palco e colocar em risco o resultado do espetáculo. Convido, então, a criadora do Vale-Cultura a retomar o seu papel na bela história que estamos construindo no Brasil.
Humberto Costa é senador pelo PT-PE, é líder do partido no Senado. Foi ministro da Saúde (2003-2005)
(Artigo originalmente publicado no jornal “Folha de S. Paulo”, de 04/02/2015)