Impeachment vai colocar povo na periferia da história, afirma Cardozo
Cardozo explicou ao plenário da Câmara porque o impeachent é golpe, e lembrou que o governo que sair desse processo não teria legitimidade institucional
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O processo de impeachment é golpe e um desrespeito à democracia conquistada duramente no Brasil, afirmou hoje o Advogado Geral da União José Eduardo Cardozo durante defesa da presidenta Dilma Rousseff no plenário da Câmara.
Cardozo sustentou que não há nenhuma base jurídica para o pedido de impeachment da presidenta Dilma e que se passar, será uma ruptura institucional contra às normas vigentes. Ou seja, um golpe. “É uma subtração do direito ao voto das pessoas”, afirmou ele. Citando Ulysses Guimarães, Cardozo afirmou que quando se suprime o voto, o povo é colocado na periferia da história. “Qualquer governo que nascer de uma ruptura institucional não terá legitimidade, e isso será lembrado pela história”, afirma.
Durante sua fala, Cardozo lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) delimitou o conteúdo da denúncia ao que havia sido aceito pelo deputado Eduardo Cunha quando aceitou o pedido de impeachment de Dilma, rejeitando as extrapolações feitas no relatório do deputado Jovair Arantes. Arantes incluiu em seu texto argumentos que já haviam sido rejeitados por Cunha, e que não poderiam ter voltado à discussão.
“Qualquer governo que nascer de uma ruptura institucional não terá legitimidade, e isso será lembrado pela história”
Assim, recaem duas denúncias sobre Dilma: seis decretos de crédito adicional, e as chamadas “pedaladas fiscais” do ano de 2015. “O governo FHC e Lula baixaram dezenas de decretos dessa natureza”, afirmou.
Cardozo lembrou que não houveram empréstimos das instituições financeiras ao Tesouro, mas apenas atrasos pontuais no pagamento de prestadores de serviço. O advogado comparou: “Quando um trabalhador atrasa o pagamento ao seu empregado, o empregado não está emprestando dinheiro para o trabalhador”. Analogamente, foi o mesmo que ocorreu com as pedaladas. Além disso, ele afirmou que o Tribunal de Contas da União sempre aceitou esse mecanismo, e quando mudou seu entendimento, o governo deixou de fazê-lo.
“Não há dolo. Onde se vê o crime de responsabilidade?”, afirmou. Além disso, esses mecanismos não são geridos pela presidenta, mas pelo secretário do Tesouro Nacional. E a denúncia se baseia no fato que a presidenta conversava rotineiramente com o secretário. “Que diálogo sinistro é esse que é utilizado para uma ruptura democrática?”, ironizou o advogado.
Cardozo lembrou que não recai sobre Dilma nenhuma acusação de corrupção, enquanto existem vários inquéritos instaurados sobre suspeitas de deputados e senadores. “Num país que tem uma corrupção histórica estrutural, um país que tem a Operação Lava Jato investigando e que tem várias pessoas que estão sendo acusadas e investigadas, terá uma presidente da República afastada sem nenhuma imputação grave por questões contábeis, que sempre eram feitas por todos os governos, que eram respaldadas pelos tribunais de contas e que não se prova o dolo?”, questionou ele. “Não era isso que os Constituintes queriam quando aprovaram o artigo 85 da Constituição”, afirmou. Cardozo explica que o governo tem um contrato de prestação de serviço com o Banco do Brasil. “Atraso de pagamento não é empréstimo”.
“Houve violência. Vingança e retaliação não são motivos para abertura de processo de impeachment”, afirmou ele.
Cardozo também afirmou que a destituição de um presidente por mera perda de maioria é uma característica dos sistemas parlamentaristas. No presidencialista, é necessário a comprovação de atentado grave à Constituição. “Nós adotamos o presidencialismo. O chefe de governo é chefe de Estado. O impeachment é uma medida excepcional. Meras operações contábeis, aceitas pelo Tribunal de Contas e feitas por todos os governos, respaldadas por Tribunais de Contas ser utilizada como impeachment?”, questionou ele.
“Afirmamos textualmente que este processo teve início num ato viciado, num ato nulo, em questão que ainda está sendo debatida no Supremo, que foi um ato do senhor presidente da Casa em retaliação ao fato de o PT ter negado votos para a não abertura do processo (de cassação contra ele”
Segundo ele, o governo não ofendeu as metas fiscais porque enviou para o Congresso um projeto autorizando déficit e os parlamentares permitiram que houvesse um rombo de R$ 119,9 bilhões.
Na análise da denúncia, Cardozo esclareceu que não houve descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal por parte do governo ou qualquer outra irregularidade orçamentária em 2015, principal argumento dos que solicitaram o impedimento da presidenta.
Disse também que as contas do governo de 2015 sequer foram julgadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) ou analisadas pelo Congresso, o que para ele derruba a tese de que há qualquer comprovação de ilícitos orçamentários.
“Mais de 20 órgãos se manifestaram em relação a isso. Como a presidente da República deixa de assinar decreto após mais de 20 órgãos o recomendarem”, questionou, lembrando que entre estas instituições estava o próprio TCU.
Coletiva
Em entrevista coletiva, após a apresentação, Cardozo admitiu que o governo pode apresentar novas ações ao Supremo Tribunal Federal (STF) questionando o processo conduzido pela Casa. Um dos pontos que já está no alvo de Cardozo é a exposição do jurista Miguel Reale Júnior, que o antecedeu na tribuna, para expor os pontos do pedido que culminou no processo.
“Vamos analisar a acusação do jurista Miguel Reale Júnior”, afirmou. Cardozo disse que a AGU vai pedir as notas taquigráficas para analisar o discurso. Reale Júnior falou sobre Operação Lava Jato e contas de 2014. O argumento da defesa de Dilma é que, apesar do STF ter negado todas as liminares apresentadas pela defesa na sessão extraordinária da Corte, que seguiu até a última madrugada, a Corte reforçou que os objetos da denúncia estão limitados aos seis decretos suplementares e aos pagamentos relativos ao Plano Safra, que foram classificados como pedaladas fiscais. “Se entendermos que existe alguma questâo que exija ajuizamento imediato, vamos fazer”, completou.
Outras questões que podem ser judicializadas referem-se aos requerimentos apresentados por Cardozo ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que foram oficializados pela AGU, durante a fala em plenário: um, foi o pedido para que Cunha oriente os parlamentares sobre os objetos da denúncia. A intenção de Cardozo é evitar que, nos discursos, orientações de bancada e outras manifestações que vão anteceder a votação, prevista para domingo, acusações que não estão incluídas no pedido de impeachment ganhem espaço e acabem induzindo o resultado, sem que a defesa possa ou esteja preparada para contra-argumentar, já que está focada nos pontos da denúncia.
O outro requerimento pede que a defesa tenha mais uma oportunidade de se manifestar. O ministro já tinha apresentado pedido semelhante a Cunha, mas foi negado, considerando que a acusação era aquela que foi feita pelos subscritores da denúncia original. “Só que o Supremo decidiu que não. [Decidiu] Que o que será votado é o parecer da comissão, e é ele quem materializa a denúncia, então a defesa tem que falar depois do parecer, sob pena de haver desrespeito ao direito de defesa. Haverá um grave cerceamento da defesa”, afirmou. Da forma como está definido o cronograma por Cunha, a defesa de Dilma não falaria mais até a votação. Cardozo quer voltar a se manifestar depois da fala de Jovair Arantes (PTB-GO), prevista para abertura da sessão de votação no domingo, 14h.
Da Redação da Agência PT de notícias, com informações da Agência Brasil