Indústria continua despencando; alta dos juros aprofunda a crise
Abandonado pelo desgoverno Bolsonaro, setor interrompe “vôo de galinha” ensaiado no fim de 2020 e mantém trajetória descendente iniciada em janeiro de 2021. Selic mais alta vai agravar a decadência
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Se por um lado a derrocada econômica criada pelo desgoverno Bolsonaro vem gerando lucros crescentes para o mercado financeiro, por outro continua arrastando a indústria nacional para o abismo. Os Indicadores Conjunturais da Indústria divulgados nesta quarta-feira (10) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam redução de 0,4% no setor de agosto para setembro de 2021, na série com ajuste sazonal.
Os dados indicam taxas negativas em nove dos 15 locais pesquisados. As quedas mais acentuadas foram no Ceará (-4,4%) e Amazonas (-4,0%). Frente a setembro de 2020, houve quedas em onze dos 15 locais pesquisados. Os recuos mais intensos foram na Região Nordeste (-13,7%), Amazonas (-13,5%), Bahia (-13,3%) e Ceará (-12,3%).
Na comparação trimestral, o recuo do terceiro trimestre (-1,1%) cessou o desempenho positivo presente desde o último trimestre de 2020 (3,4%), em todas as comparações com o mesmo período de 2020. E isso no momento em que, tradicionalmente, as fábricas aceleram a produção para atender às encomendas de fim de ano.
No trimestre encerrado em setembro de 2021, a média móvel trimestral foi de 0,7% frente ao período encerrado em agosto e manteve a trajetória descendente iniciada em janeiro de 2021. Em relação a setembro de 2020, houve recuo de 3,9%, com quedas em 11 dos 15 locais pesquisados.
Em termos regionais, 11 dos 15 locais pesquisados apontaram taxas negativas, com quedas mais acentuadas no Amazonas (-4,0%), Minas Gerais (-1,3%), São Paulo (-1,2%) e Ceará (-1,2%). Na série com ajuste sazonal, nove dos 15 locais pesquisados mostraram taxas negativas. As perdas foram mais acentuadas no Ceará (-4,4%) e Amazonas (-4,0%), que eliminou parte do avanço de 6,8% observado no mês anterior.
A perda de dinamismo observada na produção industrial na passagem do segundo (22,7%) para o terceiro trimestre de 2021 (-1,1%) se explica pela redução de ritmo em todos os 15 locais pesquisados, com destaque para Amazonas (de 71,2% para -7,8%), Ceará (de 62,4% para -7,2%) e Rio Grande do Sul (de 30,6% para -0,8%).
O acumulado dos últimos doze meses (6,4% em setembro) reduziu a intensidade do crescimento observado em agosto (7,2%) e interrompeu a trajetória ascendente iniciada em agosto de 2020 (-5,7%). Em termos regionais, 10 dos 15 locais pesquisados registraram taxas positivas em setembro de 2021, mas 12 apontaram menor dinamismo.
Mais juros para a ciranda financeira
Abandonada por Jair Bolsonaro e seu ministro-banqueiro Paulo Guedes, a indústria sofre com o descaso de um desgoverno incapaz de propor medidas anticíclicas que façam frente ao desarranjo mundial nas cadeias de produção e de conter o êxodo de grandes fabricantes que ocorre desde 2019.
Mas se falta política industrial e o mínimo investimento em pesquisa e inovação, a torneira de recursos públicos continua aberta para os endinheirados que apostam no cassino da ciranda financeira.
Segundo o Estado de São Paulo, em entrevista ao jornal japonês Nikkei Asia, o diretor de Política Monetária do Banco Central (BC), Bruno Serra, não descartou uma nova aceleração do ritmo de alta da taxa básica de juros, a Selic. “Se for necessário aumentar a taxa em mais de 1,50 ponto porcentual, nós precisaremos fazer isso”, disse Serra.
Na reunião de outubro do Comitê de Política Monetária (Copom), o BC já havia elevado de 1,00 para 1,50 ponto porcentual o reajuste da Selic, aumentando a taxa para 7,75% ao ano. Na ocasião, o colegiado também indicou aumento semelhante em dezembro, o que levaria a Selic a 9,25%. Para Serra, pode ser mais. “Nós ainda estamos perseguindo o centro da meta de 2022”, justificou.
Em agosto, quando a Selic aumentou para 5,25% ao ano, a entidade Auditoria Cidadã da Dívida estimou que cada elevação de 1 p.p. da taxa gera um crescimento inicial direto e imediato de R$ 25 bilhões anuais no pagamento de juros da dívida pública.
“O processo de desindustrialização atinge patamares preocupantes e reflete no aumento do desemprego e no atraso tecnológico do país, enquanto o extrativismo exercido pelas grandes corporações que exploram o agronegócio de exportação e a mineração predatória avança e nos remete à reprimarização econômica”, escreveu a coordenadora nacional da entidade, Maria Lucia Fattorelli, em artigo no Monitor Econômico.
“Inúmeros estudiosos já afirmaram que sem indústria de transformação não há desenvolvimento e, para que a indústria exista, é necessário acesso a crédito e investimento em educação e tecnologia. O Brasil tem impedido as duas coisas”, prosseguiu a economista.
Segundo Fattorelli, a falta de acesso a crédito barato tem sido um dos principais fatores do retrocesso da indústria nacional. “Ele decorre da opção dos bancos em destinar os recursos da sociedade para depósito no Banco Central, recebendo remuneração diária sobre um dinheiro que sequer pertence a eles”, explica.
“Não é por acaso que bancos seguem batendo recordes de lucros, alcançando o maior patamar histórico de lucros em plena pandemia, enquanto empresas vão à falência, o desemprego explode e milhões de pessoas se transformaram em moradores de rua e passam fome. Isso em um dos países mais ricos do planeta”, concluiu Fattorelli.
Da Redação, com Imprensa IBGE