João Victor Chaves: Carta às esquerdas – A esquerda que grita
A ascensão de um partido de bases progressistas à presidência da República em 2002 representou uma lufada de esperança
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O desenvolvimento tardio da esquerda brasileira contribuiu para que o país detivesse, na atualidade, índices elevadíssimos de concentração de renda, produto das políticas de exclusão social vigentes no país.
A ascensão de um partido de bases progressistas à presidência da República em 2002 representou uma lufada de esperança, após séculos de manutenção de poder político nas mãos de algumas oligarquias.
A esperança, entretanto, foi sucedida de uma incontida frustração por setores da esquerda que cobravam por reformas mais estruturais, diante de uma oportunidade de que jamais desfrutaram antes.
Os governos petistas são, certamente, passíveis de críticas pelo que não lograram realizar e pela maneira como lidaram com suas crises. A posição hegemônica do PT na esquerda brasileira foi e é importante para estabelecer paradigmas de discurso político tanto à esquerda quanto à direita.
Uma reflexão mais profunda sobre os desdobramentos da operação Lava Jato e a relação da esquerda não-petista com o poder e com o pragmatismo político-partidário é pertinente para uma melhor compreensão do momento que atravessamos.
É certo que há ambientes de forte prevalência de militantes e ideias de esquerda.
Entretanto, isso não se reflete na distribuição das cadeiras no Parlamento, até hoje sob grande influência dos setores conservadores da sociedade, assim consideradas as bancadas evangélicas, ruralistas e “da bala”.
A acomodação de interesses capaz de resultar em uma composição de governabilidade, na hipótese de ascensão de um Presidente da República de viés um pouco mais progressista, esbarra no grande conflito de ideias e setores representados pelos parlamentares brasileiros.
O respeito à maioria parlamentar sufragada pelas urnas é alicerce inescapável do jogo democrático.
Portanto, ainda que fosse desejável a adoção de medidas mais aprofundadas de caráter progressista, há de ser observada a resistência de incontáveis setores de esquerda em uma composição que resulte na atuação mais efetiva de governos à esquerda.
Uma convergência mínima junto aos representantes eleitos para o Parlamento é o que se espera de um governo eleito, o que não significa que não deve haver limites para concessões, ainda que estas sejam necessárias.
Há de se ressaltar que todas as forças políticas, quando alçadas a uma condição de governistas, sofrerão inevitável desgaste perante a opinião pública.
Entretanto, há setores ditos progressistas que não parecem dispostos a enfrentar esse desgaste, optando por permanecer perpetuamente na oposição e se manter incólume às críticas que recairão sobre qualquer governo.
Certamente o PT pode ser responsabilizado, de muitas formas, pelos equívocos cometidos ao longo dos anos de sua administração.
Entretanto, não é exagero afirmar que toda a esquerda foi contaminada por esse desgaste, aos olhos de grande parte da opinião pública, ainda que a esmagadora maioria dos parlamentares brasileiros tenha viés ideológico à direita.
O excessivo apego de setores da esquerda a “manuais de recato partidário” tem resultado em descolamento da realidade política do país, sem grandes realizações do ponto de vista prático.
Da mesma forma, não se pode ignorar o papel dos formadores de opinião que militam nos veículos da imprensa brasileira, muito preocupados em demonstrar indignação com os rumos da política sem, contudo, esclarecer à população as razões para tamanho alarmismo.
Enquanto a direita se beneficia de séculos de hegemonia parlamentar no Congresso brasileiro, é triste notar que grande parte da esquerda prefere assistir de camarote aos retrocessos impostos à democracia brasileira.
Por João Victor Chaves, para a Tribuna de Debates do PT
ATENÇÃO: ideias e opiniões emitidas nos artigos da Tribuna de Debates do PT são de exclusiva responsabilidade dos autores, não representando oficialmente a visão do Partido dos Trabalhadores