Jorlandro Louzada: O que estamos fazendo sendo Petistas?
Penso que ser Petista não é errado. Errado são os outros
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Me perguntava durante o governo Dilma “o que estamos fazendo sendo Petistas?”. Fazer este tipo de pergunta à sua consciência necessita que o interlocutor/interrogado esteja em um espaço de neutralidade cognitiva. Necessita de um espaço abstrato livre da poluição midiática. Necessita abandonar o raciocínio dominante de um território ideologicamente insatisfeito. Recentemente vi em uma empresa onde prestei serviços proletários, uma palestra de uma consultoria onde se falava e até se doavam como brindes livros de Paulo Freire. Questionei o palestrante se ele, pregando o mercado de consumo como fazia, havia realmente lido o livro de Paulo Freire? Acredito que normalmente ele responderia que sim, mas ao perceber que eu havia lido também, não apenas aquele específico, optou por desconversar.
Enfim, a necessidade de se questionar traz como resposta mais concreta o olhar sobre toda a América do Sul. No Brasil, assim como Chile e Uruguai, não chegamos ao ponto de romper com as necessidades econômicas advindas dos ditames das multinacionais. Não abandonamos o aspecto Menchevique do governo de estabelecer metas de superação da pobreza, sem, no entanto, tocar na riqueza dos poderosos (por poderosos não se deve entender qualquer pessoa que possui uma empresa e emprega dois, três ou vinte funcionários. Poderosos são aqueles que mandam. Que encabeçam as políticas de violência contra trabalhadores. Quem detém a posse da terra e autoridade para governar sobre ela. Quem faz a opinião). Não houve ruptura com o “Consenso de Washington”. Melhora-se a situação dos pobres, mas não se pode tocar nos ricos.
A necessidade básica de reparação histórica das populações desfavorecidas pelos 500 anos de colonialismo e oligarquias, e pelo menos nos últimos 50 anos, de uma imersão no liberalismo radical, intensificado a partir dos anos 1990, não se mostrou em execução no Brasil de Lula. Este foi o rumo tomado por Venezuela, Bolívia e mais eficazmente pelo Equador.
Mas esta não é a análise fundamental deste texto. Os contextos advindos das vozes que sobrevieram das ruas em 2013 encabeçaram um descontentamento que as esquerdas não conseguiram absorver em seu favor – visão minha. Por quê?
Primeiro porque o que ocorreu foi uma continuação de manifestos globais, onde, desde o Egito, Turquia, Líbia e Iêmen até o Occupy Wall Street nos Estados Unidos em 2011 foram tomados como exemplo de uma ruptura global, mas este último evento estadunidense trouxe o pensamento de que não é uma revolução o que se deseja, mas uma melhora nos padrões políticos liberais. Repensar o “sonho americano”. Como sabemos este “sonho” não abrange, em particular, o Brasil. Estavam satisfeitos com a prosperidade da General Motors em Detroit e com sua condição de assalariados do capital. Quando deflagrou a crise, o “sonho americano” ficou insustentável. Nossos protestos vieram de enxurrada nesta onda, porém o embate com as elites tomou o governo como inimigo, independente de quem era o culpado.
Segundo, porque no Brasil, as manifestações tiveram como ponto norteador o aumento das tarifas do transporte público nas capitais, que estavam – e estão – sob governança e com suas empresas de transporte nas mãos dos oligarcas de partidos de extrema direita com seus laços políticos (PMDB, DEM, PSDB, PSC e seus afins). Estes são os verdadeiros poderosos. No entanto, e as eleições de 2014 mostraram bem isso. Estes partidos voltaram com força, assumindo posições importantes na esfera pública novamente, cercando o PT. Parecia que as “Jornadas de Junho de 2013” haviam sido esquecidas.
Terceiro, porque a empresa midiática brasileira é muito poderosa no mundo e sua filosofia organizacional é contra as filosofias sociais de partidos como o PT, PCdoB, PCB, PSOL, e os mais radicais como PSTU e movimentos como o MST. Qual é esta filosofia organizacional? Uso o exemplo da universidade para explicar. Simplesmente o poderoso que tem seus filhos usufruindo do sistema público elitizado como a universidade, possui uma empregada ou um porteiro no prédio, boa parte das vezes, negra (o), que tem uma filha na mesma idade que os seus, porém sem condições de competir pela vaga de estudante no sistema público de ensino superior. – O “por que” de não haver condições de disputar a vaga também está no contexto do debate, mas não cabe discorrer agora.
Estas elites permitiram, com certo incentivo do Banco Mundial, que o governo criasse meios de “integrar” as classes menos favorecidas no ensino superior. Como? Criou-se, desde os anos FHC uma série de profissões e cursos universitários antes não existentes, dentro das prerrogativas do ensino tecnológico. Quando o governo PT começou a oferecer oportunidades mediante políticas sociais a pobres, em cursos tidos como elitizados, o descontentamento foi generalizado por distintos segmentos.
“Pensava-se: “não pode a filha da minha empregada, parda, estudar medicina com meu filho”, ou ainda”, “vamos acabar virando Cuba com esta revolução que está tirando o privilégio de nós ricos, de nossos filhos estudarem medicina. Estão dando vagas para negros e carentes da escola pública, e ainda estão dando dinheiro para eles, nós já os empregamos”…
Com tudo isso, em 2013 após um descontentamento que seria contra classes hegemonicamente dominantes, com o (dês)trabalho das esquerdas, mas não por conta disso, chegamos ao colapso de 2016 com mais um golpe de estado.
E hoje, o que estamos fazendo sendo Petistas? Não posso deixar de pensar que minha crença, apesar de todos os roubos de alguns que merecem ser presos, erros por parte de lideranças do partido, é a de que ser Petista é uma boa opção frente ao país que não quer mudar desde 1500.
Pois conseguimos ao longo desses últimos anos, não a totalidade, mas mudar um pouco da cor das salas de aula. Alternar o gênero dos estudantes e profissionais de todos os segmentos. Fazer com que crianças de todo o país questionassem o papel da escola ao ponto de não deixar que elas funcionem como estão tão facilmente.
Infelizmente são algumas mudanças e não são as que dizem que o Brasil evoluiu. Mas são caminhos e trilhas embora não pavimentadas ainda. Como diria Frei Betto: “(…) Ao longo das últimas décadas foram emergindo da esfera da ingenuidade para a esfera da crítica; da passividade à militância; da dor à esperança; da resignação à utopia (…)”.
Penso que ser Petista não é errado. Errado são os outros. Como pode há 516 anos haver uma classe que nunca deixou seu lugar no topo e quando alguns de baixo sentiram o sabor de ter algum capital cultural, a massa elitista entrou em pânico. Disseram: “Somos o país da bolsa. Tudo é bolsa… o Bolsa Família é para incentivar pobre a ter filhos…” Outros dizem: “Somos cristãos e o PT é contra nossos ideais”. Estes até se organizam em partidos também. E quais ideais são estes? Explorar a ingenuidade das pessoas simples? Pregar o ódio? Então Jesus é contra estes ideais também. Creio até que Jesus em seu tempo foi e é um intelectual de esquerda.
Como uma classe que se julga tão intelectualizada pode chegar a conclusões como estas? Por isso ser Petista é a melhor opção hoje… Quase uma obrigação cívica.
Por Jorlandro Louzada, pedagogo, especialista em Sociologia Urbana pela UERJ, mestrando em Educação, Processos Formativos e Desigualdades Sociais pela UERJ. Mora no Rio de Janeiro, RJ, sendo natural de Valença, RJ, seu domicílio eleitoral. Ainda não filiado, milita em favor do PT junto aos movimentos por moradia, contra as remoções urbanas na capital fluminense. Cursou o ensino superior graças às políticas sociais do PT (ProUni) em seus primeiros anos, para a Tribuna de Debates do VI Congresso. Saiba como participar.
ATENÇÃO: ideias e opiniões emitidas nos artigos da Tribuna de Debates do PT são de exclusiva responsabilidade dos autores, não representando oficialmente a visão do Partido dos Trabalhadores