Leopoldo Vieira: Das conferências nacionais ao sistema de planejamento democrático
Entre várias reformas do Estado necessárias, o PT aponta três, como medidas imediatas (…) A primeira consiste na reorganização administrativa e institucional (…) Enquanto o Estado funciona na forma de…
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Entre várias reformas do Estado necessárias, o PT aponta três, como medidas imediatas (…) A primeira consiste na reorganização administrativa e institucional (…) Enquanto o Estado funciona na forma de caixinhas setoriais (educação, saúde, trabalho, entre outros) e regionais, os problemas atuais tornam-se cada vez mais complexos e totalizantes, incapazes de serem superados pela lógica de organização pública em partes que não se comunicam, quando concorrentes entre si. A fonte disso encontra-se centrada na recuperação do sistema de planejamento democrático e transparente de médio e longo prazos”. (Carta de Salvador, resolução do V Congresso do PT)
Com a mesma alegria militante que recebi a Carta de Salvador e a resolução da última executiva nacional do PT, vi, em meu e-mail, a “Circular de Mobilização para as Conferências de Políticas Públicas”, assinada pelo presidente Rui Falcão, e os respectivos secretários de Mobilização, Movimentos Populares, Mulheres, Juventude e Agrário do partido. É um chamado não só aos filiados do PT, mas à sociedade em geral para que se engaje nas 16 conferências nacionais a se realizarem entre 2015 e 2016, nos três níveis de governo, sempre sendo município e estado etapas para a plenária nacional. Os temas versarão sobre Saúde, Assistência Social, Juventude, Mulheres, entre outras.
Será importante que os respectivos setoriais partidários dos estados e municípios articulem reuniões locais para planejar a participação nas etapas municipais e estaduais das conferências em diálogo com os movimentos sociais com quem têm relação, se coordenem com os órgãos de políticas públicas de governos dirigidos e/ou com participação do PT e demais forças de esquerda e da base aliada, onde for possível. Isso pode ser um recomeço para a concertação político-social para este segundo mandato da presidenta Dilma. Por outro lado, a circular faz questão de destacar que “Historicamente, a democracia participativa sempre foi uma das pautas prioritárias do Partido dos Trabalhadores”. Não à toa, segue, que “Nos últimos doze anos são incomparáveis os avanços na área, o Estado brasileiro tornou-se mais poroso às demandas, visões e perspectivas da sociedade civil e dos movimentos sociais”, que “Conselhos e Conferências tornaram-se presentes e decisivos em diferentes espaços de construção de políticas públicas”. É nesta direção que pergunto: iniciado o segundo mandato da presidenta Dilma, num contexto de aguda luta política, o que queremos projetar para 2018? Só um balanço com mais dezenas de conferências realizadas?
Imagino que o trecho a seguir guarde as razões pela qual a circular foi elaborada e enviada a todo o país: “Há uma crise do sistema político e das formas tradicionais de participação e representação política, e diante desse quadro é preciso que consigamos ao mesmo tempo renovar e pensar novas formas de participação social e, também, continuarmos sendo o referencial e paradigma de representação da luta e dos interesses dos trabalhadores e trabalhadoras.”. Segundo se extrai do documento, avalia-se que a participação social foi um pilar para mudarmos o país em nível local, que foi decisiva para a conquista da credibilidade para dirigir a presidência da República e, nesta instalados, promover as grandes transformações nacionais dos últimos 13 anos.
O que diz a circular é que a participação social é também a base, na verdade a ponte, para o dia seguinte a estes dias confusos.
Vamos seguir a tendência de aprofundar a participação social, via conselhos nacionais, nas expressões das escolhas estratégicas de governo? A essa pergunta, a continuidade do Fórum Interconselhos, agora chamado de Fórum “Dialoga Brasil”, disse “sim”. Mas, qual o universo dessa participação é fundamental para os nossos dias?
Vamos manter o diálogo com representantes das direções dos movimentos sociais que se articulam nos conselhos e no próprio Fórum Interconselhos ou, para além, vamos envolver as bases destes movimentos, num amplo processo de acordo, onde se enxerguem na agenda pública central como protagonistas e não apenas por um sentimento de pertencimento por outras questões relacionadas às lutas populares históricas?
Vamos seguir apenas realizando mais conferências nacionais ou, definitivamente, vamos dar um passo adiante vinculando suas resoluções, agendas e plataformas a estas expressões de escolhas estratégicas, fortalecendo a sinergia participação-planificação-orçamentação-controle social e dando a ela um caráter de massas, que significa construir a transição entre o calendário previsto das conferências para uma efetiva convergência do ciclo destas com o de instrumentos como o PPA, LDO e LOA?
Vamos nos contentar com isso ou ousar um passo ainda maior, alcançando os milhões beneficiados pelos programas sociais que conformam a nova base social do projeto político em curso no país, superando o já frágil reconhecimento de que somos seus aliados pela mudança de vida?
Em casos mesmo como o da Cúpula Social do Mercosul, que acontece em Brasília esta semana, vamos articular a participação social como um momento de encontro de direções de movimentos sociais e suas seções especializadas em integração regional para uma discussão geral ou estruturar o debate de um projeto de desenvolvimento regional, do Cone Sul, da Pátria Grande, por dentro dos canais de diálogo e participação social brasileiros?
Passados 13 anos de governos liderados pelo PT e mais tantos das conquistas constituintes ou da resistência anti-neoliberal, o caminho não pode ser mais nem o da sociedade x Estado e nem mais só o de tornar o Estado permeável à sociedade. É a hora da cooperação estratégica. A circular mostra o partido que é referência da maior parte dos movimentos sociais se preparando para esta tarefa. Cabe ao Estado, liderado pelo mesmo partido, construir os meios para a estratégia comum.
Os caminhos para o governo foram plantados: constituir organismos para os beneficiários dos programas sociais, nos estados e municípios, representados em nível nacional, discutirem e avaliarem a Dimensão Estratégica do PPA; pactuar com os ministérios e conselhos relacionados às conferências a serem realizadas um calendário para que as próximas ocorram vinculadas ao monitoramento deste Plano 16-19, em fase de elaboração, para já convergirem com o ciclo 20-23 no processo de elaboração, assim como pré-pactuar com os temas que não estão previstos ainda para que já se organizem neste rumo; fazer dos conselhos nacionais os espaços de consulta para a elaboração da LDO e LOA, superando o próprio Fórum Interconselhos (ou “Dialoga Brasil”) como o locus desta construção.
Democracia participativa é a renovação permanente do pacto social entre os períodos eleitorais, o acordo do passo-a-passo da implementação da estratégia de desenvolvimento e do projeto político sufragado. Vamos resistir e lutar para manter a democracia liberal ou oferecer como o “sacrifício” de nossa vitória a construção de uma democracia de massas no Brasil?
Leopoldo Vieira foi coordenador do monitoramento participativo do PPA 2012-2015 e do programa de governo sobre desenvolvimento regional da campanha à reeleição da presidenta Dilma Rousseff