Maria do Rosário: A Instabilidade Antidemocrática

Na democracia representativa as eleições periódicas permitem que a população avalie retrospectivamente seus mandatários

Gustavo Lima/ Câmara dos Deputados

A deputada federal Maria do Rosário em pronunciamento na Câmara

Vivemos uma crise promovida por aqueles que seguem adotando a política do quanto pior melhor, sem se importar com seus graves efeitos para o país. Em que pese importantes inciativas que acenam no sentido da retomada do investimento estatal, sabemos que é também central que a iniciativa privada volte a investir. Para tal, é preciso que retomemos a estabilidade, pois a saída da crise econômica passa por vários fatores nos quais a superação da crise política não cumpre papel menor. 

Somente com a garantia da democracia, do respeito à Constituição, e aos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, responderemos a tarefa fundamental de estabilização do país. Do contrário, o jogo encerrado pela crise mundial, em que os ricos e os pobres ganhavam, não será substituído por um de soma zero, mas por outro mais perverso, em que todos perderão. Diante desse quadro cabe-nos perguntar quais os fatores nos trouxeram a esta situação, e como faremos para superá-la. 

Na democracia representativa as eleições periódicas permitem que a população avalie retrospectivamente seus mandatários. Durante o período eleitoral são debatidos projetos, esse embate é de natureza democrática, eleições não se tratam de consenso, mas de uma disputa que confere legitimidade ao eleito ao longo do seu mandato.

Mesmo a democracia representativa não se limita ao período eleitoral, o povo segue tendo a possibilidade de influenciar a tomada de decisão dos eleitos por meio da garantia da livre opinião pública, e ao Estado cabe assegurar-lhes a liberdade de expressão e de manifestação.

Não há problema algum que disputas ideológicas sedimentem diferenças na sociedade, grande parte da Europa assim viveu durante quase um século, a questão não é ter opiniões distintas, não é protestar, lutar, o erro reside em não aceitar o diferente, em não seguir uma regra básica da democracia: os que ganham governam, os que perdem, se assim o quiserem, fazem oposição, mas nunca tentam depor por razões políticas e de ocasião, os eleitos. Infelizmente, não é isso que vemos no Brasil hoje.

No dia em que foi anunciada a vitória de Dilma, ainda em outubro de 2014, iniciou-se um processo de inviabilização deliberada ao seu governo. Primeiramente vivenciamos tentativas de impedimento de sua posse, seguida de questionamento discricionário das urnas eletrônicas. Ao longo de 2015, a tática foi impor as chamadas “pautas-bomba” no Congresso Nacional com vias a inviabilizar o governo economicamente; e, por fim, a instauração de um processo de impeachment cujo vício de origem, um pedido baseado em uma vingança, e a ausência de crime de responsabilidade por parte de Dilma, o configura como golpe.  

A ação de supostos aliados que tomam atalhos para chegar ao poder, combinada à insatisfação golpista dos que há quatro eleições são rechaçados nas urnas, e dos que não aceitam que o povo comece a ter acesso aos direitos mais básicos, nos trouxe a essa situação de crise política e econômica, e nos colocou em estado de convulsão social. A saída, contudo, não passa por rasgar a Constituição depondo uma presidenta que não cometeu crime algum.

Caso Temer alcance êxito em sua conspiração, não terá a legitimidade conferida pelo voto, e, portanto, será constantemente questionado, não por uma oposição comum, mas por gente nas ruas, movimentos organizados, partidos políticos, que não aceitarão passivamente o golpe. Quem poderia crer que um presidente ilegítimo, que alcança o máximo de 2% nas pesquisas de intenções de voto construiria governabilidade?

E mais, o programa que defende aprofundará a crise. Sacrifício do povo brasileiro, redução do Estado em contraposição à retomada dos investimentos, entreguismo ao invés de priorização da indústria brasileira e da política de conteúdo nacional, também não são a saída para os nossos problemas. 

Não menos importante, o impedimento da presidenta implicaria em mais uma batalha. Se os decretos de crédito suplementar forem transformados em crime após um julgamento exclusivamente político, a coerência implicará na destituição do vice, que também assinou decretos da mesma natureza. O resultado seria um país governado por um réu no Supremo Tribunal Federal que fez da Câmara dos Deputados seu feudo, e consegue a difícil tarefa de praticamente unificar o Brasil em prol da sua cassação.  

Exemplos não nos faltam dos efeitos nocivos trazidos pela quebra da institucionalidade democrática. O que fará com que o país retome o crescimento será o fim do terceiro turno, com a aceitação do resultado eleitoral, o afastamento de Cunha da presidência da Câmara, e, sem dúvidas, a mudança dos rumos do governo, no sentido da implementação do programa eleito em 2014, não o golpe, não a deposição de uma mulher honesta e o frontal ataque à nossa jovem e incompleta democracia brasileira. 

Maria do Rosário Nunes é Deputada Federal pelo Rio Grande do Sul

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