Moro e Dallagnol distorceram a lógica do Direito, criticam juízas
Para Raquel Braga e Simone Nacif, a cada diálogo revelado fica mais evidente que a prisão de Lula se deveu a um “processo arquitetado”, com resultado já definido
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As últimas revelações trazidas pela revista Veja e pelo jornal Folha de S.Paulo, em parceria com The Intercept Brasil, que mostram o procurador Deltan Dallagnol estabelecendo “encontros fortuitos” com o desembargador João Pedro Gebran Neto, e também articulando para lucrar com a venda de palestras, revelam que a Operação Lava Jato inverteu toda a lógica do Direito. Desvirtuamento do devido processo legal, parceria entre juízes e acusação, partidarização, desvio de função de agentes do Ministério Público Federal, além de fraude para ocultar atividade negocial, são alguns dos desvios cometidos, segundo as juízas Raquel Braga e Simone Nacif, integrantes da Associação Juízes para a Democracia (AJD).
Em entrevista aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, para o Jornal Brasil Atual, nesta segunda-feira (15), as magistradas destacam que é fundamental que Dallagnol, o ministro da Justiça, Sergio Moro, bem como os demais envolvidos citados no escândalo da Lava Jato se afastem das funções públicas para que as transgressões denunciadas sejam devidamente apuradas.
Para Raquel Braga, a cada novo diálogo revelado fica mais evidente que a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se deveu a um “processo arquitetado”, com resultado já definido muito antes do julgamento. “Quando se estabelece uma relação processual, esse processo é mais importante que o fim dele, que não é condenar nem absolver, mas garantir ao cidadão o direito de defesa. A Lava Jato inverteu a lógica do Direito, com inversão de valores e desvirtuamento da teleologia (finalidade) do processo. A cada vazamento, evidencia-se a prisão política de Lula”, afirmou.
Fraude
Simone destaca que é expressamente proibido a juízes e procuradores atuarem como sócios em empresas com fins lucrativos, e classifica como “fraude” a estratégia criada pelos procuradores para burlar a lei, segundo ela. Por isso, Dallagnol e o também procurador Roberson Pozzobon articulavam para não figurarem como os representantes legais da empresa – que ficaria em nome de suas mulheres – que gerenciaria os lucros obtidos com palestras e outros eventos que tinham como objetivo lucrar com a fama adquirida com a Lava Jato. “O MP é fiscal do ordenamento jurídico, e deve zelar pela correta aplicação da lei. Então não pode um dos seus integrantes construir uma negociata para burlar a lei”, destaca a juíza.
Ambas lembram que as reiteradas rupturas da ordem jurídica e processual colocam em xeque a democracia, no Brasil, e as violações de direitos acabam tendo sempre maior impacto para as classes sociais menos favorecidas. Raquel destaca que, no Brasil de hoje, como nas sociedades burguesas em geral, o direito tem sido usado como ferramenta para preservar privilégios dos mais ricos. “A direita não tem constrangimento no exercício arbitrário desse poder.”
Ambas também assinalam o golpe do impeachment contra a ex-presidenta Dilma Rousseff como ponto de virada que inaugurou essa sequência de rupturas e desrespeito à ordem legal. “Quando há uma violação processual, como ocorreu inicialmente com o impeachment da Dilma, isso provoca uma avalanche de quebras processuais e democráticas. No final, na ponta oposta, estão as pessoas mais vulneráveis”, disse Simone.