Padilha e Quarenta: “Paz, Democracia e Previdência!”

“Curiosamente é um governo que, diferente daqueles que vimos desde a redemocratização, não parece ter a pretensão de construir maiorias na sociedade”

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Tribuna de Debates do PT

#LutePelaSuaAposentadoria

Saliva e likes não nos tiram do buraco!

É do conhecimento de todos a gravidade desse momento em que estamos. Algumas posições, no entanto, nos levam a crer que alguns companheiros ainda não perceberam a extensão e a profundidade da derrota que sofremos em 2018 e dos desafios que já temos diante de nós em 2019. Se a dimensão estratégica da nossa derrota eleitoral ainda está por se confirmar a depender da consolidação de um novo regime político entorno da coalizão de Bolsonaro, é evidente que o resultado das urnas consagrou a negação da política como via democrática de resolução de conflitos.

Isso ficou nítido na ausência de espaço para o contraditório e na disseminação de mentiras através de uma estrutura em larga escala.

As forças da esquerda e do campo que sustentou os governos Lula e Dilma foram acuadas por uma onda conservadora e belicosa levando a um crescimento do autoritarismo e da violência em diversos setores da sociedade, como temos visto desde as eleições. Os partidos que tradicionalmente lideraram oposição contra o governo Lula e Dilma viram sua base eleitoral desaparecer, tragada pelo sentimento da anti-política.

É fundamental perceber que a coalizão de Bolsonaro é alimentada pela agenda neoliberal de seu núcleo econômico, majoritariamente apoiada pela grande mídia. Entorno de Bolsonaro, que goza de certo vínculo com setores populares – constituído através do discurso da segurança pública, do fundamentalismo religioso e da pauta comportamental conservadora – é que a coalizão, tutelada e sustentada pelos militares e blindada por setores do aparato jurídico-policial, tem o seu núcleo dirigente.

Curiosamente é um governo que, diferente daqueles que vimos desde a redemocratização, não parece ter a pretensão de construir maiorias na sociedade, viabilizando-as ao ampliar o diálogo e mediação com atores sociais diversos. Toda vez que Bolsonaro esteve entre mediar uma posição ou incentivar ódio ou obscurantismo, optou pela segunda via que, mesmo que de forma tosca, manteve se núcleo de apoiadores engajados.

Outra novidade é que, diferente de outros momentos onde governos da ordem queriam cooptar, neutralizar ou derrotar o PT e seus aliados, Bolsonaro buscará nos aniquilar. Acreditamos que o pior que o podemos fazer nesta ofensiva é isolar-se. O isolamento político de nosso partido facilita tais pretensões de extrema direita. A fragmentação da aliança de centro esquerda, que foi o núcleo do governo Lula e dos governos estaduais em que estivemos, fragiliza não somente o PT como os próprios movimentos sociais com quais dialogamos e hoje são os principais alvos da perseguição reacionária. Infelizmente os tensionamentos internos ao nosso campo continuam no Congresso, nos movimentos sindicais, estudantis e populares e na relação entre os partidos.

Não podemos fechar os olhos para a defensiva em que a esquerda se encontra na América Latina e no mundo como um todo, aliada à reestruturação do mundo do trabalho e da capacidade de uma “nova direita” ter um discurso popular e estar um passo além na operação das novas tecnologias de informação, seja na esfera pública, seja no submundo das rede. Entre outros objetivos, busca fragilizar os mecanismos de organização popular e representação sindical.

Aqui entre nós: apesar do surpreendente resultado eleitoral positivo que tivemos ao eleger as maiores bancadas de deputados e governadores, além dos 47 milhões de votos creditados à Haddad, o nosso partido ainda não acertou o prumo de como engajar, organizar e renovar nossa militância e nossos quadros políticos. Cometeremos um erro de largada se assumirmos uma tese de que, diante da atual situação temos que mirar, discursar e mobilizar apenas os nossos 30% que simpatizam e se identificam conosco.

A primeira derrapada desta largada seria cometer algo impensado para qualquer grande partido: dar uma marcha ré e voltar aos 30% da nossa base depois de ter sido indicado pelo povo brasileiro para ser a alternativa à Bolsonaro no segundo turno e atingir a votação de 47 milhões de votos. É como se Lula e o PT em 1989, depois de ter ganho a oportunidade de ser o Lula e o PT quase vencedores do segundo turno de 89, optassem por voltar para o casulo nos rebaixarmos ao nível que já havíamos superados. Temos que mirar um PT que interage com os 47 milhões, que apresentou um programa alternativo ao país, que governa ou integra governos de todo o nordeste brasileiro, que tem uma história na luta política e social do pais, capilaridade nacional e referência para o mundo com a maior liderança popular viva deste pais: Lula.

A segunda derrapada é acreditar que estes 30% existe e continuará existindo por uma determinada consciência política, movida pelos nossos discursos, por um reconhecimento eterno do nosso legado, ignorando que uma parte importante desta base esteve conosco porque tivemos a capacidade de, na luta política e social e, sobretudo em governos bem sucedidos, termos transformado a vida destas pessoas. Este apoio não sobrevive se esta base perceber que não somos capazes de continuar mudando suas vidas ou, no mínimo, impedir de imediato que todos os seus direitos sejam destruídos.

Não é o discurso, mas a esperança nele embutida que alimenta nossas base. Não é a mobilização em si mas a capacidade de mobilizá-los mudando as suas vidas que faz o PT ter esta base política-social estrondosa. Acreditamos que se o PT perder o fio condutor da esperança e deixar de ser um instrumento vivo que gera ganhos de mudança de vida ou, pelo menos, consegue, impedir que sua vida seja destruída, verá essa base minguar de pouco em pouco. E boa parte dela hoje tem território: o nordeste brasileiro. Fazemos este registro sem propor que o PT perca sua capilaridade e inserção nacional, mas ter humildade para tentar compreender o que acontece naquela região.

Com a prisão de Lula, principal figura no diálogo e articulação com a sociedade, não podemos dar sequer uma derrapada pois a situação ficará ainda mais preocupante.

Historicamente no Brasil o povo na rua, sem que houvesse fissuras nos blocos dominantes, nunca libertou ninguém de uma prisão injusta, como a Lula está sujeito. Isso porque a estrutura do poder – que legitima e sustenta tal arbítrio – é paralela à demanda popular e social por justiça. Na campanha por Lula Livre devemos combinar as mobilizações sociais, apostar na denúncia internacional e buscar operações que dividam o bloco que em 2018 optou por cometer ou fazer vistas grossas diante de tal violência à Lula e à democracia. Não há aqui nenhuma perspectiva ingênua, mas se não buscarmos estes três movimentos a campanha LULA LIVRE pode nos ajudar a percorrer o pais, exercitar uma certa militância em Curitiba, mas não logrará o principal objetivo que temos com ela: ver Lula Livre de novo com a força do povo!

Lula é maior do que todos nós juntos e mais um pouco. Mas Lula só estará livre se nossa campanha for maior do que ele. Foi a luta do povo africano e a denúncia no mundo pelo fim do Apartheid que fez Mandela livre.

Para impor derrotas ao governo é preciso analisar objetivamente os movimentos que o sustentam e que com ele se relacionam. Não é verdade que o consórcio que permitiu a transformação de um candidato inexpressivo em Presidente está, automaticamente, fadado a se consolidar monoliticamente como algo estratégico, coeso e à longo prazo. É possível enxergar e potencializar fissuras táticas no bloco opositor. É imprescindível.

Não querer encontrá-las nos faz cair em um ativismo cômodo que não aproveita oportunidades e nos restringe à nossa “bolha” política. Esses limites são hoje insuficientes para libertar Lula e barrar o desmonte da previdência, a título de exemplo, além de não manter ad eternum o nosso 30% na sociedade.

Quais fissuras possíveis? A primeira é a defesa da paz e das vidas!

No plano prático é preciso reinserir a temática da Paz e da defesa das vidas em nossas lutas e bandeiras. O Brasil se encontra hoje confrontado com perdas significativas de vidas, que tem seu epicentro no feminicídio e no genocídio da juventude negra, mas que expande para outros setores da sociedade à medida que o discurso de ódio e violência política encontra eco na facilitação do acesso à compra e porte de armas. O temor da viralização, para usar um termo da máquina da ultradireita, de tragédias como a de Suzano, o envolvimento da milícia no crime da Marielle e o crime da Vale do Rio Doce em Brumadinho e Mariana são oportunidades para alguns temas serem reposicionados após a catarse eleitoral. Cuidar e defender da vida do povo e zelar pela paz é mais necessário aos trabalhadores do que à elite.

O PT deve abraçar a defesa da paz e da defesa da vida, sem a pretensão de protagonismo único, de hegemonismo ou exclusivismo, mas sobretudo de reencontro com uma parte da sociedade brasileira.
É preciso investigar e atacar frontalmente a ligação de membros do governo federal e da família Bolsonaro com as milícias do Rio de Janeiro, bem como a ação partidária do Ministério da Justiça. A defesa da Paz, tanto interna quanto nos nosso embates nas relações exteriores devem ter destaque em nosso programa. O desemprego e o crescimento da miséria, que nós do PT sabemos enfrentar, são hoje os maiores promotores da violência e da pequena criminalidade, que potencializada pelo populismo penal, impressiona e amedrontar milhões de brasileiros. Não adianta identificar essa realidade, é preciso respondê-la à altura.

A defesa da democracia, e o fortalecimento das apostas autoritárias que saíram vitoriosas nas eleições nacionais e em vários estados, é o centro do que urge reconquistar e reconstruir no Brasil. Não há futuro para um partido como nosso sem democracia. E há um desconforto, seja em instituições chaves para uma sociedade democrática, seja no mundo da política com os arroubos da família Bolsonaro. Não foram pequenas as manifestações de editoriais, de associações de jornalistas, da esfera jurídica em confronto com os agentes do estado de exceção nos últimos dias.
Sim, sabemos que boa parte destes apostaram na aventura do estado de exceção policial e Bolsonaro para nos derrotar. Entretanto se ficássemos presos no passado não teríamos assistido derrotas importantes do núcleo do estado de exceção, como o fundo aprovado da Lava Jato ou o decreto da mordaça de Bolsonaro/Mourão.

É a nossa tarefa política que mais exigirá trabalho, energia, articulação a constituição de uma frente democrática. Por isso ela deve ser prioritária. Se não a alçarmos neste patamar, faremos apenas o mais fácil, que é focar naqueles com os quais temos identidade na agenda econômica e de valores.

Nada mais crucial para nos do PT do que estarmos junto do povo, o que não significa estarmos apenas como o povo que votou em nós no primeiro turno. A luta contra a proposta de demolição da previdência do governo Bolsonaro é a nossa oportunidade mais direta. Tem lugar que o que mobilizará o povo é Lula Livre, tem lugar que é a defesa da paz. Mas não tem nada que possa abrir um canal mais direto com o sofrimento da grande maioria do povo brasileiro do que uma postura de diálogo sobre o que significa a proposta de Bolsonaro para a previdência. E este contato pode alimentar todos os outros e, inclusive, deslocar uma parte da base eleitoral popular de Bolsonaro, decisiva para a luta social de agora e as lutas eleitorais que enfrentaremos nos próximos anos.

No plano econômico e social a luta pela previdência e pela seguridade social é a mais popular, abrangente e universal que temos para travar. Será também a síntese do grau de aprofundamento da agenda de Bolsonaro, assim como a capacidade em coesionar e manter agrupados os setores que foram decisivos em sua eleição. Para barrar a Reforma é preciso ampla mobilização, convencimento popular, diálogo com instituições centrais de nossa sociedade civil, e o bom uso do legado de conquistas e ampliação de direitos que Lula e Haddad simbolizam para o povo. Quem teve 47 milhões de voto na eleição mais violenta da história de nossa democracia não pode abrir mão dessa representação no momento em que é preciso colocá-la a serviço da defesa dos trabalhadores.

Nesse sentido Lula é mais uma vez a peça principal de nosso xadrez. É nele que concentram os nós górdios da democracia e do futuro do Brasil. Foi ele o principal cabo eleitoral de Haddad para ser quem melhor defenderia nosso legado em uma eleição marcada pela fraude eleitoral. Também tem sido ele quem tem apontado para a postura de intensa oposição que nós do PT devemos ter nesse momento. Embora preso, nós do PT somos responsáveis por manter a força e influência de Lula irradiando por toda a sociedade, como ele mesmo instruiu em seu discurso histórico há um ano em São Bernardo do Campo.

Não se pode restringir a imagem e o símbolo de Lula a uma certa militância de carceragem, que embora possa prestar um papel valioso de solidariedade e conforto ao nosso presidente e não se confunde com o papel fundamental que a Vigília Lula Livre tem cumprido ao longo desse ano, sozinha não irá garantir sua liberdade. Dito isto, é preciso que nós da CNB tenhamos certo entre nós que o último período tem quatro grandes expoentes que devemos cultivar, fortalecer, potencializar ao nosso projeto político nacional:

1. LULA, que com três semanas de campanha colocou Haddad no segundo turno das eleições, lutando contra o silenciamento e a complacência dos meios de comunicação. De dentro da prisão lidera ainda a esperança de milhões de brasileiros. Lula ainda é muito forte e presente na vida dos trabalhadores. É o grande líder que essa nação precisa livre hoje

2. GLEISI, que conduziu muito bem o PT até aqui resgatando a dignidade e a honra da militância e dos petistas. Que tem coragem em nos defender, resistência para enfrentar nossos adversários e cumplicidade com as nossas lutas. É a prova de que nos momentos difíceis nós soubemos nos renovar com qualidade.

3. O NORDESTE, onde Lula e PT fazem parte da história de superação e conquistas da população. Uma região em que nosso partido e nossos governos investiram com prioridade e, associado à boas políticas e um amplo arco de influências coordenado a partir de nós, soubemos aprofundar nosso projeto e obter bons resultados eleitorais.

4. HADDAD, que escolhido por Lula e pelo PT, conduziu nossa candidatura com altivez sabendo defender o nosso legado e a urgência histórica de nossas propostas, bem como apresentar elementos novos à sociedade. Haddad foi diplomado pela população como o principal líder da oposição à Bolsonaro. É resultado de nosso projeto e de nossa força política , de quem temos muito orgulho. Liderança nacional não se constrói todo dia e Haddad, depois de Lula, é o nome nacional que mais produz esperança e futuro.

Alexandre Padilha é deputado federal e Vítor Quarenta é membro do Diretório Nacional do PT

ATENÇÃO: ideias e opiniões emitidas nos artigos da Tribuna de Debates do PT são de exclusiva responsabilidade dos autores, não representando oficialmente a visão do Partido dos Trabalhadores

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