Para Araújo, defender a vida é “sacrificar liberdade em nome da saúde”
Em reunião do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, o ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo amplia isolamento do Brasil no exterior ao repetir discurso negacionista do presidente sobre a pandemia. “As liberdades fundamentais são hoje ameaçadas por desafios crescentes, e a crise da Covid apenas contribuiu para exacerbar essas tendências” opinou o ministro. Enquanto isso, número de vítimas fatais por Covid-19 se aproxima do patamar de 250 mil mortes
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O governo Bolsonaro voltou a utilizar canais diplomáticos para reiterar, perante o mundo, o discurso negacionista do presidente que ajudou a elevar as mortes por Covid-19 ao patamar de quase 250 mil óbitos. Em reunião do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, na segunda-feira (22), o ministro das Relações Exteriores tomou para si a estratégia genocida de Bolsonaro ao atacar a ciência em nome da “liberdade”. A fala de Araújo consolidou de vez o isolamento do país na comunidade internacional.
“As liberdades fundamentais são hoje ameaçadas por desafios crescentes, e a crise da Covid apenas contribuiu para exacerbar essas tendências”, discursou o chanceler, na audiência pela internet. “Sociedades inteiras estão se habituando à ideia de que é preciso sacrificar a liberdade em nome da saúde”, opinou o ministro.
“Não critico as medidas de lockdown e semelhantes, que tantos países aplicam, mas não se pode aceitar um lockdown do espírito humano, o qual depende da liberdade e dos direitos humanos para exercer-se em sua plenitude”, filosofou Araújo, distanciando-se da matemática que salva vidas, tal qual o líder de extrema direita que ocupa a Presidência.
Sem fazer citações diretas, Aráujo também advogou em favor das fake news ao criticar o “tecnototalitarismo”, responsável, segundo ele, pela prática de censura nas redes sociais. Em outras palavras, o ministro condena a retirada do ar de sites e canais de You Tube que promovam notícias falsas e desinformação sobre vacinas e outras medidas de segurança sanitária defendidas por autoridades de saúde.
“A maré crescente de controle da internet por diferentes atores, movidos por objetivos econômicos ou ideológicos, precisa ser detida”, afirmou Araújo, repetindo a mesma estratégia manipuladora por trás das menções a “interesses de alguns grupos”, presentes no discurso de Bolsonaro.
“Nossa tarefa é garantir que as tecnologias sirvam para engrandecer o ser humano, e não para submetê-lo ou apequená-lo, transformando cada homem e mulher em uma simples coleção de dados a serem explorados”, prosseguiu, sem mencionar a rede subterrânea de notícias falsas que atua contra a comunidade científica pela internet.
Ataque à democracia e minorias
“O bolsonarismo é mestre em apelar ao discurso da liberdade enquanto restringe direitos, desestabiliza a democracia e ataca minorias”, denunciam as diretoras executiva e de programas da entidade Conectas Direitos Humanos, Juana Kweitel e Camila Asano, respectivamente. “Entretanto, essa falsa dicotomia entre defender a liberdade e salvar vidas não encontra amparo em nenhuma discussão séria a respeito de direitos humanos”, afirmam, em artigo para a ‘Folha de S. Paulo’.
As especialistas criticaram ainda a ministra da Mulher, Família e Direitos Humano, Damares Alves, que também discursou na reunião. “Coube a Damares Alves distorcer as medidas do governo em apoio às populações mais vulneráveis à pandemia, como idosos e indígenas”, avaliaram. As duas condenaram o foco do governo no aborto, “ainda que o conceito de vida desde a concepção não encontre respaldo na Constituição”.
Atraso brasileiro ganha o mundo
As diretoras da entidade lembram que o isolamento internacional do Brasil acentuou-se com a saída de Donald Trump, restando “agora a aliança na cruzada antigênero com países com má-reputação em direitos humanos como Arábia Saudita, Polônia e Hungria”. E concluem: “Dessa maneira, o Brasil vai cristalizando sua reputação internacional como representante do atraso”.
Enquanto Araújo trabalha para manter a liderança do país como pária mundial, o país se aproxima rapidamente da marca de 250 mil vidas perdidas. Nesta terça-feira (23), foram registrados 247,2 mil óbitos e 10,2 milhões de infectados. A média móvel manteve-se no patamar de 1.055 óbitos diários. Já são 33 dias acima de mil mortes diárias.
Da Redação, com informações de Folha de S. Paulo