Paulo Pimenta: Em busca de um crime do Lula
Há um vício de origem no noticiário e nesse arremedo de investigação sobre medidas provisórias de incentivos fiscais nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O que se quer, mais uma…
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Há um vício de origem no noticiário e nesse arremedo de investigação sobre medidas provisórias de incentivos fiscais nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O que se quer, mais uma vez, é encontrar um crime para pendurar no pescoço de Lula. Às favas os fatos: as MPs em questão criaram dezenas de milhares de empregos numa parte do Brasil em que a indústria automotiva jamais teria chegado sem um empurrão do Estado. Isso se chama política de desenvolvimento regional. No país dos justiceiros, virou crime. “Crime do Lula”.
A primeira MP, a 471/2009, simplesmente prorrogou, até 2015, o incentivo que vigorava desde 1999 e seria extinto em 2010. Foi aprovada por unanimidade no Congresso. A segunda, 512/2010, estendeu o incentivo a novos projetos. Em 2013, o Congresso acrescentou emenda à MP 627, sobre tributação de empresas no exterior, estendendo o incentivo até 2020. Como é comum nos trâmites de legislação tributária (e também de interesses corporativos), escritórios de lobby foram contratados pelas partes interessadas.
Na cabeça de alguns jornalistas, delegados e procuradores, Lula só poderia ter assinado tais MPs para favorecer a indústria automotiva, movido a propina. É gente que julga os outros pela régua da própria malícia ou da própria mediocridade. Não têm noção do que seja governar um país ou coordenar políticas públicas dentro do jogo democrático.
A primeira “reportagem” do Estado de S. Paulo sobre o tema, de outubro passado, já trazia entre aspas a expressão “MP comprada”, sem explicar quem, acaso, a teria vendido. Fazia uma ligação inverossímil e desonesta entre a MP de 2009 e um contrato firmado, cinco anos mais tarde, entre um escritório investigado na Zelotes e a empresa do filho de Lula. Caso inédito de propina a longuíssimo prazo…
A reportagem desonesta deu azo à invasão do escritório do filho de Lula pela PF, autorizada por uma juíza substituta e mais tarde corretamente desautorizada por uma desembargadora do Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Torturando os fatos, o que se tenta agora – na imprensa e nas delegacias – é associar o tal contrato ao conjunto de MPs, inclusive a de 2013, que Lula nem assinou, pelo simples fato de não ser mais presidente. Ou seja: não se investigam fatos, investiga-se Lula.
Se tivessem um pingo de honestidade intelectual (abro mão do equilíbrio) nossos justiceiros iriam ao anuário da Anfavea para saber que, além da indiciada CAOA, outras cinco indústrias (das maiores) estão nas regiões abrangidas pelos incentivos: Ford (BA e CE), Fiat Chrysler FCA (PE), John Deere Tratores e Mitsubish(GO) e Mahindra (AM). Foram responsáveis por 8% das unidades produzidas no Brasil em 2013. Estão em fase de implantação unidades da JAC Motors e Foton Motors, ambas na Bahia.
Cada uma dessas fábricas traz consigo uma rede de fornecedores de autopeças e serviços, que gera milhares de empregos de qualidade. O pólo de Camaçari, por exemplo, é o centro de uma rede de 27 fornecedores, gerando 5 mil empregos diretos e 50 mil indiretos. A fábrica da FCA em Goiana (PE) atraiu 16 indústrias do porte da Pirelli, Magneti Marelli, Saint Gobin, entre outras, gerando 9 mil empregos diretos.
Onde está o prejuízo ao interesse público? Onde está o tráfico de influência, se as medidas foram apresentadas publicamente, com exposições de motivos, e aprovadas pelo Congresso? Onde estão as supostas evidências de que as MPs teriam sido “compradas”? E quem as teria “vendido? A unanimidade do Congresso? Só um mentecapto ou alguém de má fé absoluta para imaginar essa trama. Ou alguém inabalavelmente determinado a pendurar um crime – qualquer um – no pescoço do maior líder popular deste País.
Em seu governo, Lula assinou duas Medidas Provisórias que aumentaram os salários da Polícia Federal: a 305/2006, que incorporou as gratificações aos vencimentos e passou o piso de agente iniciante de R$ 4 mil para R$ 6,2 mil; e a 431/2008, que levou esse piso para R$ 7,5 mil. Raciocinando como cidadão, acredito que Lula agiu assim para fortalecer o combate ao crime e à corrupção. Raciocinando como certos jornalistas, promotores e delegados, teria de dizer que alguém “comprou” as MPs para beneficiar a PF. Seria mais um “crime do Lula”.
Paulo Pimenta é deputado federal pelo PT do Rio Grande do Sul