Rui Falcão: Eugenia política é discurso do fascismo

A advogada Janaína Conceição Paschoal, em recente artigo nesta Folha, voltou à narrativa política do ex-senador Jorge Bornhausen, atualmente aliado da candidata Marina Silva. Para quem não se lembra, esse senhor…

A advogada Janaína Conceição Paschoal, em recente artigo nesta Folha, voltou à narrativa política do ex-senador Jorge Bornhausen, atualmente aliado da candidata Marina Silva. Para quem não se lembra, esse senhor ficou conhecido pela frase “vamos nos ver livre dessa raça”, pronunciada em 2005, vociferando seu ódio contra o PT.

“Usar palavras como doença e raça contra quem pensa diferente é parte do repertório conservador. É arma dos que tremem diante das mudanças”

Faz parte do repertório conservador o recurso à linguagem de raça e de enfermidade contra quem pensa diferente. O estímulo aos preconceitos é arma antiga dos que tremem diante das mudanças. Tampouco é novidade que vociferem pela liquidação, muitas vezes física, de quem carrega a chaga de defender os interesses do povo trabalhador.

A autora destila em seu artigo a raiva dos que não aceitam que o país tenha deixado de ser governado para satisfazer as elites raciais de Bornhausen ou as pessoas socialmente saudáveis da belicosa advogada.

A articulista não deixa por menos: “O Brasil padece de um câncer terminal”. Não está se referindo à desigualdade social ou à pobreza, por exemplo, mas ao partido “que está no poder há longos e penosos 12 anos”. Ela não esconde seu amargo desgosto com os governos de Lula e de Dilma, que tiraram 40 milhões de brasileiros da miséria.

Talvez esteja entre aqueles endinheirados que se ouriçam porque há pobres que agora frequentam espaços e usufruem benefícios antes reservados só aos ricos. Porque os trabalhadores, incluindo os domésticos, ganham melhores salários e têm mais direitos assegurados. Porque o país não pertence mais a um punhado de privilegiados.

As frases da doutora são recheadas de termos médicos, ou de “bioética”, a discutir a cura para doença tão grave. Seu vaticínio não deixa por menos: “Quando alguém está acometido por um […] câncer extremamente agressivo […], em geral, procura todos os tratamentos que […] a medicina disponibiliza”.

Sua analogia tem endereço certo: contra o partido da enfermidade maldita, ela aceita até o remédio chamado Marina Silva, a preferida de Bornhausen. “Entre a morte certa e a possibilidade de melhora, racionalmente o doente costuma escolher correr riscos”, pontifica.

Nem sequer vê na postulante do PSB maiores virtudes que merecessem seu voto. O único objetivo que lhe importa é derrotar o PT mesmo aceitando que está correndo “muitos perigos”. Pouco lhe importa, de fato, o programa e as ideias em disputa. Ou discutir com seriedade as profundas transformações ocorridas no país desde 2003.

A sra. Conceição Paschoal, como tantos de sua estirpe, está em uma batalha na qual vale tudo para varrer a esquerda do comando do país.

Sua guerra contra o PT não é novidade, já nos levou a ditaduras sanguinárias. O catecismo de pensamentos como esse está ancorado em uma eugenia político-ideológica própria do fascismo: garantir que subsistam no poder apenas vozes que representem raças e classes autodefinidas como sadias e superiores.

Não nos amedrontamos ou nos confundimos diante de personagens como a referida advogada e seu discurso raivoso. A bem da verdade, caberia a Marina Silva refletir sobre o porquê de figuras do naipe de Bornhausen e Conceição Paschoal estenderem-lhe as mãos em sua atual cruzada antipetista.

Rui Falcão é advogado, deputado estadual em São Paulo e presidente nacional do PT

(Artigo originalmente publicado na edição de 03/10/2014 na Folha de S. Paulo)

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