Sony, mais uma grande empresa que abandona o Brasil de Bolsonaro
Sem política industrial, o país perde marcas importantes como a Sony, que encerrará as atividades no fim de março, visando transferir as operações para outro país. PT propõe a retomada via aumento da densidade tecnológica e da complexidade da matriz industrial existente
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Após 48 anos atuando no Brasil, a Sony emitiu nesta segunda (1º) um comunicado alertando os consumidores do fim de suas atividades no Brasil. Até o fim de março, ela encerrará as divisões de televisores, equipamentos de áudio e câmeras. A distribuição e vendas desses produtos serão interrompidas no meio do ano.
Originalmente, a empresa havia confirmado a medida em setembro de 2020, alegando que a decisão fora tomada “pelo recente ambiente do mercado nacional” e anunciando que realocaria suas operações em outro país. A empresa chegou ao Brasil em 1972, e a fábrica operou durante 36 anos.
Na época, o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do Amazonas, Valdemir Santana, criticou o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), e a falta de política industrial do desgoverno Bolsonaro. “O Brasil não tem política industrial. O governo federal, por exemplo, acabou com a política industrial no nosso país”, afirmou ao jornal ‘A crítica’, de Manaus.
O líder sindical também destacou o impacto que o fechamento de uma fábrica gera no mundo do trabalho. “É diferente de desemprego, que é algo cíclico. É muito pior, já que são postos que serão fechados de forma permanente, não há volta nem perspectiva de melhora. Se não tiver atividades industrial no Amazonas, serão quatro milhões de pessoas sem saber como ter renda. Aí vamos fazer o quê? Cortar madeira?”, questionou.
A política que foi escolhida nas urnas é essa que está aí. Nem o governo federal nem o estadual fazem algo para evitar esse problema. As empresas vão fechando e ninguém faz nada para tentar mudar essa realidade. Mesmo fechando a fábrica, a Sony vai continuar vendendo os seus produtos no país normalmente, mas serão 300 famílias a menos no estado sem renda para por comida na mesa
Santana acrescentou que o desmonte do setor industrial pode ser analisado com base na própria decadência da fábrica da Sony em Manaus. Ele conta que, em meados de 2021, época do último bom momento da indústria no Amazonas, a fábrica chegou a comportar quase três mil funcionários. A partir de então, o número veio caindo, chegando a 1,3 mil postos há quatro anos. Agora, a fábrica anuncia o fim do funcionamento e a demissão de 220 funcionários.
“A política que foi escolhida nas urnas é essa que está aí. Nem o governo federal nem o estadual fazem algo para evitar esse problema. As empresas vão fechando e ninguém faz nada para tentar mudar essa realidade. Mesmo fechando a fábrica, a Sony vai continuar vendendo os seus produtos no país normalmente, mas serão 300 famílias a menos no estado sem renda para por comida na mesa”, lamentou.
“É ruim para o Brasil todo. A empresa vai deixar de produzir aqui, mas vai produzir em outro lugar, no Paraguai, onde que seja, e mandar para o Brasil. A marca Sony não acabou. Acabou a produção dela no Brasil, porque fica inviável. É muito mais fácil trazer de fora, porque é mais barato do que produzir no Brasil”, disse.
Santana diz que não ficou surpreso com a notícia, porque outras empresas no ramo da tecnologia vêm anunciando o encerramento dos negócios no Brasil nos últimos anos, como a Nikon, no fim de 2017.
No fim de janeiro, a Semp Toshiba, promoveu duas rodadas de demissões, dispensando mais de 300 funcionários no dia 27 e outros 150 no dia 30. Todos sem aviso prévio, durante as trocas de turno. Outra japonesa, a Mitutoyo, fechou a planta de instrumentos de medição em Suzano (SP), em outubro do ano passado.
Já o grupo farmacêutico suíço Roche anunciou que deixará de fabricar medicamentos no País até 2024. E no ramo automotivo, Mercedes e Ford se retiram do país.
A despeito da inação dos governos, a estrutura da Sony, com 55 mil metros quadrados de área e 27 mil m² construídos, foi adquirida pela brasileira Mondial no fim do ano. A empresa planeja ampliar a cadeia produtiva, contratando 420 funcionários neste ano, mas não confirmou se os agora ex-funcionários da Sony seriam aproveitados.
Falta de política levou a queda histórica em 2020
A completa ausência de política industrial no desgoverno Bolsonaro causou em 2020 o pior resultado anual para o setor desde 2016, quando a indústria recuou 6,4% enquanto os derrotados nas eleições de 2014 lançavam o Brasil no abismo, afastando a presidenta Dilma Rousseff. A Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontou um encolhimento de 4,5%.
No segundo ano de recuo da indústria nacional – em 2019, ela havia caído 1,1% – o nível de atividade chegou ao ponto mais baixo da série histórica, iniciada em 2003. A indústria se encontra 13,2% abaixo do nível recorde, alcançado em maio de 2011, sob Dilma. Em abril do ano passado, enquanto o bolsonarismo promovia ataques à democracia, o setor atingiu o ponto mais baixo da série, operando 39% abaixo do pico de maio de 2011.
A falta de perspectiva de uma recuperação consistente da economia nacional está na origem da perda de confiança no país. O Índice de Confiança do Empresário Industrial (ICEI) recuou 1,4 ponto entre janeiro e fevereiro de 2021, para 59,5 pontos. É o segundo mês consecutivo de queda da confiança da indústria, segundo o levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
No “Plano de Reconstrução e Transformação do Brasil” lançado em setembro do ano passado, o Partido dos Trabalhadores propõe uma nova política industrial após os anos de desmantelamento do sistema produtivo nacional a partir de políticas austericidas adotadas pelos governos do golpe.
“A retomada do desenvolvimento deve almejar o aumento da densidade tecnológica e da complexidade da matriz industrial existente, simultaneamente ao seu avanço em direção ao novo paradigma digital, não apenas como consumidores, mas garantindo uma inserção autônoma e soberana do Brasil”, recomenda o documento.
“O desenvolvimento da estrutura industrial existente é possível por meio de avanços na digitalização empresarial, pela reabilitação e acúmulo de competências fabris e pela utilização competitiva de recursos naturais estratégicos”, ressalta o texto.
“A Petrobras, o BNDES, a Embraer, a Embrapa, o Finep, além dos sistemas de metrologia, patentes e padronizações estão sendo desmontados. O sistema produtivo estatal e o sistema de bancos públicos abandonaram qualquer preocupação com as políticas de conteúdo nacional e os mecanismos de indução das compras públicas”, prossegue o plano, lembrando que a reconstrução das capacidades estatais é indispensável para o reposicionamento de uma nova indústria digital.
Da Redação.