União homoafetiva contra retrocessos

Apesar dos avanços registrados nos últimos anos, deputados da bancada evangélica querem restringir a definição de família somente para aquelas formadas por homem, mulher e seus descendentes

O Brasil celebrou o casamento de 3,7 mil casais homoafetivos em 2013. Conquista esta que só foi possível após a aprovação de uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que obrigou cartórios brasileiros a registrarem o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. Na contramão dessa vitória pela igualdade de direitos, parlamentares da bancada evangélica tentam reverter tal avanço ao aprovar o Estatuto da Família que, entre outras alterações, quer restringir a definição do termo “família” apenas para aquelas formadas por pessoas de sexos opostos.

A partir da norma aprovada pelo CNJ, juízes – que antes poderiam negar-se a realizar casamentos gays – agora são obrigados, também, a converter a união estável homoafetiva em casamento. Uma decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) caminhou na mesma direção e considerou como entidade familiar aquela formada por casais formados por pessoas do mesmo sexo. A iniciativa tornou possível a adoção e a concepção de filhos por métodos de reprodução assistida.

Embora esse tipo de união tenha aumentado, elas representam apenas 0,35% do total de uniões civis realizadas no Brasil. No total, foram contabilizadas 1 milhão de uniões em 2013. Dessas, 1,9 mil dos casamentos foram entre mulheres e, 1,7 mil, entre homens, segundo pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os números representam 52% das uniões civis entre mulheres e, 48%, entre homens.

De acordo com o levantamento, 2,4 mil casamentos civis entre pessoas do mesmo sexo ocorreram no Sudeste. São Paulo é o estado com mais registros no Brasil, com 1,9 mil casos. Em seguida vem o Rio de Janeiro, com 211. Minas Gerais está em terceiro, com 209. O Acre foi o estado com menos uniões gays em 2013, com apenas um registro em 2013.

Para o secretário de educação da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Toni Reis, o levantamento do IBGE aponta dados extremamente significativos. “Não foi nada do que os fundamentalistas disseram e ninguém perdeu direitos. O casamento é uma coisa muito séria. Eu me incluo nessa estatística”, comemora. Reis vive em uma relação homoafetiva há 25 anos. O casal, que tem três filhos adotivos, celebrou o casamento civil logo após a resolução do CNJ.

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Estatuto da Família – Apesar dos avanços na conquista dos direitos das famílias homoafetivas no Brasil e no mundo, deputados da bancada evangélica no Congresso Nacional tentam aprovar um projeto de lei que restringe o núcleo familiar formado apenas por homem e mulher e seus descendentes.

Para Toni Reis, o projeto de lei do Estatuto da Família é um acinte à cidadania. Ele critica a iniciativa e defende que, independente do projeto, as famílias homoafetivas continuarão a existir. “Isso não vai ajudar a manter casamento algum. Essa lei é inválida e inócua. Eu respeito muito a família tradicional, nasci nesse tipo de família e convivo com diversas”, opina o secretário da ABGLT.

Polêmico, o texto substitutivo do PL 6583/13, apresentado pelo relator deputado Ronaldo Fonseca (Pros-DF), traz outro ponto bastante controverso ao sugerir a proibição da adoção de crianças por casais homoafetivos. Para isso seria necessário a alteração do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) .

“O obscurantismo está presente nesta Casa, passeando faceiro, pisoteando a Constituição, a democracia”, declarou Kokay após a reunião da comissão. Para ela, o Estatuto da Família “retrocede no direito das famílias serem constituídas a partir dos vínculos do afeto. É um atentado contra a dignidade humana”, destaca Kokay.

“É um atentado contra a dignidade humana”

A deputada considera repulsiva a proposta discutida no Congresso e acredita que o Parlamento deveria garantir direitos a todos os brasileiros, independentemente da orientação sexual. “Não deixem que isso aconteça. Não deixem que a última palavra seja dada pelos fundamentalistas”, apelou em vídeo postado na página dela Facebook.

A reunião da comissão que analisa a proposta foi iniciada no início da semana passada, mas foi interrompida por um pedido de vista coletivo, apresentado pelo deputado Paulo Freire (PR/SP) com a adesão de outros parlamentares. A deputada Erika Kokay (PT/DF) apresentou 11 emendas ao texto, mas nenhuma foi acatada. O Estatuto da Família deverá ser votado na próxima terça-feira (16) pela comissão especial criada para analisar o projeto.

Por Flávia Umpierre e Mariana Zoccoli, da Agência PT de Notícias

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