“Vamos levar muito tempo para ter outra figura como Lula”, afirma Gleisi, em entrevista

Presidenta nacional PT falou sobre a reconstrução e a renovação do partido ao Reconversa, do jornalista Reinaldo Azevedo, nesta terça (22): “Uma liderança como o Lula não nasce por vontade da gente”

Reprodução / Reconversa

Na entrevista, Gleisi fez um balanço das eleições municipais ainda em curso

A presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), concedeu longa entrevista ao podcast Reconversa, do jornalista e colunista Reinaldo Azevedo, nesta terça-feira (22). A parlamentar tratou de quase todos os temas considerados caros ao PT na disputa política e falou também da reconstrução e da renovação interna da legenda. Gleisi fez questão de enaltecer a resiliência da militância nos períodos mais sombrios, especialmente a partir de 2014, ainda durante o governo da ex-presidenta Dilma Rousseff (PT).

O golpe de 2016, que afastou Dilma do cargo, e a concomitante e igualmente subversiva Operação Lava Jato serviram ao desgaste da imagem do PT, argumentou a deputada federal, mesmo o presidente Lula tendo liderado os dois mais bem avaliados governos da história do país (2003-2010). Ela reconheceu que esse processo a que o partido foi submetido está longe de ser irrelevante, mas que não foi capaz de lhe arrefecer o espírito de luta, como queriam seus algozes em Curitiba, o ex-juiz Sergio Moro e o ex-procurador Deltan Dallagnol.

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“Quando começou a denúncia do mensalão, já teve um desgaste grande, que afetou nossas lideranças nacionais […] E aí, quando veio a Lava Jato, ali tava o epicentro, né: Moro era dali, as figuras eram dali, o discurso foi muito forte, foi uma coisa devastadora para nós, pra gente segurar aquilo. E isso influenciou o interior do Paraná, influenciou muito Santa Catarina”, admite a parlamentar, referindo-se à contaminação do eleitorado da região Sul pelo discurso extremista.

Reconstrução do PT

Gleisi fez um balanço das eleições municipais ainda em curso, com o partido disputando o segundo turno em algumas capitais, como Cuiabá, Fortaleza, Natal e Porto Alegre. A presidenta do PT reiterou que as expectativas eram moderadas, embora tenha pontuado a recuperação de terreno em 2022, com a vitória de Lula pela terceira vez, e agora, em 2024, quando o partido conseguiu eleger mais prefeitos e vereadores que em 2020.

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“Onde a gente teve mais foi em 2012: 630 prefeituras. Nós ganhamos em São Paulo, então foi uma vitória muito retumbante, mas nós perdemos Belo Horizonte […] Em 2016, a gente tem uma queda abrupta: não vai pro segundo turno em São Paulo, perde e faz 256 prefeituras. Então ali começou o nosso calvário. Aquilo coincidia já com o golpe, com o impeachment contra a Dilma, e com o início da Operação Lava Jato”, explica Gleisi.

“A situação do PT ficou muito difícil, porque nós éramos ‘bandidos’, ‘ladrões’, a gente não podia sair da rua, prenderam um monte de gente. E aí culmina com a prisão do Lula, inclusive […] E a mídia sempre reforçando isso”, completou.

A presidenta do PT observa, no entanto, que o partido começou a dar sinais de recuperação já em 2018, quando o hoje ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT-SP), conseguiu ir ao segundo turno das eleições presidenciais contra Jair Bolsonaro (PL) e obteve votação expressiva. Encarcerado ilegalmente em Curitiba, Lula foi impedido de disputar o pleito, de manifestar seu apoio a Haddad e até de conceder entrevistas.

Nas corridas municipais de 2020, novas dificuldades se apresentaram ao PT. Gleisi contou ao podcast que ninguém queria fazer alianças: “Nós éramos o patinho feio”. Ela lembrou que, ao final daquelas eleições, em que o partido havia feito apenas 178 prefeituras, os críticos lhe antecipavam o fim na política. “É desde 1980 que nós estamos mortos. Já nascemos mortos”, ironizou a parlamentar.

“Você não limpa as coisas assim, não arruma as coisas em um curto espaço de tempo, dois, três anos, entendeu? Para você manchar a imagem, é facílimo. Agora para você recuperar a imagem, é muito difícil, e mesmo no governo, estando no governo”, ponderou.

A deputada disse ainda que a eleição presidencial de 2022 foi a disputa mais tensa que já encarou, porque, além da enxurrada de mentiras da extrema direita, Bolsonaro detinha a máquina pública e torrou dinheiro acima do Orçamento da União para se reeleger.

Renovação interna

Sobre renovação interna, Gleisi enumerou as principais lideranças regionais do PT, algumas com notório destaque, como é o caso do ministro da Educação, Camilo Santana (PT-CE), um fenômeno de votos no Ceará, e do próprio Haddad. A deputada mencionou a necessidade de eles “se forjarem nacionalmente”. “Eu não tenho dúvidas: daí vai sair o nome que vai, no futuro, substituir o Lula”, antecipou, antes de anunciar que o presidente deve ser o candidato do partido em 2026.

A respeito da figura de Lula, a presidenta do PT disse que se trata de um dos maiores políticos da história do Brasil, uma peça praticamente insubstituível nos quadros da legenda. “Nacionalmente, uma liderança como o Lula, ela não nasce por vontade da gente, ela é forjada na luta […] Nós vamos levar muito, muito, muito tempo para ter uma outra figura como o Lula”, definiu.

“Eu acho que esses ministros nossos, que já tiveram experiência nos estados, têm uma grande oportunidade para fazer isso, para fazer essa disputa política, entrar na disputa política, precisam fazer isso, era importante fazer. E a gente tem que incentivar”, acrescentou Gleisi, ao esclarecer como se desenvolve a renovação do partido.

Disputa política

A parlamentar defendeu ainda que o PT não abra mão de suas causas históricas nas disputas políticas doravante. Questionada sobre o apagão na cidade de São Paulo, a deputada enfatizou que é dever do partido se posicionar contra a privatização de serviços essenciais, como o de energia elétrica. O governador do estado, Tarcísio de Freitas (Republicanos), virtual postulante à Presidência em 2026, e o atual prefeito da capital e candidato à reeleição, Ricardo Nunes (MDB), insistem em terceirizar a culpa pela crise ao governo federal, enganando o eleitor.

“Eles privatizaram a Eletrobras […] Tem que ir para cima disso, sim. Eles são privatistas, eles vendem o Estado, eles desmontam o Estado. E essa crise de energia, ela vai se alastrar, porque, sem a Eletrobras, com outras empresas que foram privatizadas, e essa crise de investimento, nós vamos ainda ver muitos apagões”, alertou a presidenta do PT.

“É Tarcísio que é responsável por isso também, porque ele defende essa política. Defendeu no governo do Bolsonaro e fez o que fez na Sabesp. Logo vai ter problema na água aqui”, argumentou Gleisi, em referência à venda da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) pelo governador bolsonarista.

A parlamentar criticou ainda as gritantes e persistentes desigualdades socioeconômicas no Brasil e a ausência de proteção para os trabalhadores, algo que, historicamente, o PT sempre se propôs a combater. Na avaliação dela, o partido precisa continuar comprando essa disputa, mas respeitando as mudanças sensíveis no mercado de trabalho. “O Estado tem que ser o que dá oportunidade para quem quer ser empreendedor”, enfatizou.

“O que me preocupa foi o que você falou: quem que vai cuidar desse pessoal depois, quando ele não puder mais se virar por conta própria, mais trabalhar. Isso nós temos que pensar, porque isso é uma responsabilidade da sociedade, de todo mundo, inclusive desse pessoal. Por isso, não pode enfraquecer o Estado na questão previdenciária ou na questão de uma renda mínima”, concluiu Gleisi.

Da Redação

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