Walter Andrade: O significado da ficha número um
Ainda somos milhares, ainda podemos contar com as centrais sindicais e os movimentos de massa. Mais do que isso: precisamos contar com nós mesmos
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Qualquer análise, por mais profunda, se tornará frágil e incapaz de refletir o real sentimento da base histórica do Partido dos Trabalhadores em Minas Gerais. A cada movimento, cada ato ou gesto das diferentes lideranças, fica mais difícil reconhecer a essência desse partido que surgiu, exatamente, na direção contrária.
Essa base histórica ainda é aquela que milita no partido e também nas entidades de classe, nos movimentos sociais, nas jornadas de luta e se desdobra pra defender o partido no dia-a-dia, inclusive e não apenas nas redes sociais. Os que carregam na memória e no coração o Estatuto, as teses e documentos históricos. Esse exército em minoria que brada sem ser ouvido por assepsia ideológica e partidária.
Quase unânime dizer que o isolamento do partido nos municípios, a falta de formação política e a comunicação ineficaz talvez seja o conjunto de ferramentas que bem aplicadas evitaria, por exemplo, a debandada e por conseqüência o fiasco eleitoral ocorrida no último pleito.
Em Minas Gerais, o partido retrocedeu de 114 prefeituras em 2012, para 37 em 2016. O mesmo se aplica aos vereadores e vereadoras. Entretanto a leitura não pode ser feita apenas pelos números, sobretudo porque é preciso avaliar se quem foi eleito prefeita ou prefeito em 2012 realmente estava utilizando a função para imprimir o modo petista de governar e contribuindo para a independência financeira da sigla, por exemplo.
Certamente esse inchaço foi o resultado da campanha de filiação em massa e da não formação desses novos quadros. Um discurso repetitivo, porém essencialmente necessário. Agora mais do que nunca. Algo contraditório se considerarmos que o PT possui desde 1996 a Fundação Perseu Abramo. Uma fundação de apoio que tem por missão realizar debates, editar publicações, promover cursos de formação política e preservar o patrimônio histórico do partido – tarefa pela qual é responsável o Centro Sérgio Buarque de Holanda.
Não deve ser difícil concluir que entre os um milhão e setecentos mil filiados no Brasil nem dez por cento conheça a entidade, sobretudo quem está na base, nas cidades como Aimorés, no extremo Leste de Minas Gerais cuja luta é contra o fantasma da UDN.
É fundamental fazer mesmo a assepsia. Não somos iguais na ousadia, no jeito de falar, pensar e nas funções programáticas exercidas. Entretanto precisamos ser iguais na ética e no zelo com o dinheiro público. Disso não podemos abrir mão. O inchaço partidário colocou em um mesmo caldeirão quem milita em função de um projeto socialista e quem está na política para conquistar o poder a qualquer custo. Não se coadunam.
Não são raros os casos de prefeitos que nunca foram às reuniões das Comissões Executivas ou dos Diretórios. Muito menos agiam em conformidade com os documentos históricos do partido. A facilidade para encontrar quem fez compromissos eleitorais com candidatos a deputados fora do nosso campo é natural em qualquer região de Minas Gerais.
Por outro lado alguns dos nossos congressistas também guinaram por caminhos dúbios e mesmo em campanha eleitoral optaram pela prática fácil da direita: o dinheiro, a compra e a conseqüente venda.
Nossa direção se transformou em um espectro de representação. Quem foi eleito no PED deixou a função para assumir outra e no lugar ficou alguém que fala por ele. Assim é na direção estadual e na maioria dos mais de 800 diretórios e comissões provisórias. O mesmo se repete da direção nacional.
A implantação das Coordenações Regionais do PT em Minas Gerais, em tese foi um grande avanço. Entretanto a falta de infra-estrutura para atuar e o distanciamento da Direção Estadual torna cada vez mais difícil exercer esse papel. A linguagem e a prática se distanciaram.
PT foi o partido preferido de cerca de um quarto do eleitorado brasileiro em dezembro de 2009. No entanto, em 2015, a porcentagem de eleitores que declaram preferência ao PT não chegou a 12% contra um índice de rejeição na casa dos 38%.
Na prática, isso significa que o volume de filiados e simpatizantes ou receberam formação insuficiente para apostar no projeto ou não acreditam nele.
Mas a batalha não está perdida. Sabemos quem são nossos inimigos e as armas que eles têm. Mais ainda: sabemos onde erramos. Imprudente permanecer no erro.
Ainda somos milhares, ainda podemos contar com as centrais sindicais e os movimentos de massa. Mais do que isso: precisamos contar com nós mesmos. Preparar nossos quadros, capacitar e formar nossa militância e claro fazer a assepsia. Afinal, a ficha de filiação número um assinada pelo companheiro Apolônio de Carvalho, naquele 11 de fevereiro de 1982, precisa representar a mudança.
Walter Andrade, Presidente do PT em Aimorés (MG), Delegado do Diretório Estadual e Coordenador do PT no Vale do Rio Doce, para a Tribuna de Debates do 6º Congresso. Saiba como participar.
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