Análise: PT lidera ranking de mulheres eleitas, negras e jovens no campo progressista
PT foi o partido que mais elegeu mulheres, mulheres negras e jovens em 2020 e aumentou em 25% a representatividade feminina em relação a 2016. No cenário geral, partidos de direita lideraram a quantidade de eleitas, trazendo desafios para o campo da esquerda e centro-esquerda. Entenda os dados e os fatos.
Publicado em
Ana Clara Ferrari, Agência Todas
Colaboração Aline Rocha
Em 2020, o PT teve um papel fundamental no aumento da representatividade feminina e da diversidade nas cidades brasileiras: foi o partido do campo progressista que mais elegeu mulheres, mulheres negras, LBTs e jovens em todo país, se colocando à frente da trincheira na luta da ocupação política contra o retrocesso.
Preparamos uma análise que considera o desempenho eleitoral das mulheres do PT no campo progressista e em relação a todos os partidos, para entendermos as movimentações no campo político brasileiro, a partir da representatividade feminina, e os desafios da luta feminista nas tribunas e prefeituras para o próximo período.
No geral, a participação das mulheres na política aumentou para os próximos quatro anos. No entanto, diante de tempos tão bárbaros e obtusos, o que seria uma conquista por si, precisa ser analisada a partir dos dados eleitorais com mais cautela.
Em primeiro lugar, acompanhando o desempenho eleitoral geral, os partidos de centro direita lideraram a quantidade de mulheres eleitas para as prefeituras e câmaras municipais em todo país, do espectro que vai do DEM ao PSDB, passando pelo PSD, PP e PL. Importante destacar que, em 2020, o PSD desbancou o MDB na conquista geral de prefeituras em todo país, em uma disputa acirrada pelo comando do “centrão” e das negociações de bancada a partir da força política mais capilarizada.
A lupa na vereança, por exemplo, concretiza esse fenômeno em que MDB acirra o cenário para garantir seu lugar ao sol na direita brasileira. No ranking, MDB lidera com 1265 vereadoras eleitas, seguido por PP (1020), PSD (827), PSDB (710), DEM (656) e PL (571). Já o PT aparece em seguida, em 7º lugar, com 561 mulheres eleitas, e liderando na centro-esquerda e esquerda.
No campo progressista, o Partido dos Trabalhadores foi o partido que mais elegeu mulheres em 2020. Com 561 eleitas para o legislativo municipal, o PT lidera o ranking que é seguido pelo PDT (507), PSB (411), PC do B com 122 vereadoras e PSOL com 31 eleitas em todo país.
Na disputa pelas prefeituras, as candidatas enfrentaram desafios que correspondem à ascensão dos partidos de direita nas cidades brasileiras. MDB e PSD lideraram a disputa contra candidatas a prefeita do PT em todo país. O PT elegeu 28 prefeitas e 51 vice-prefeitas.
Com raras exceções, as cidades cujas candidatas do PT não foram eleitas serão governadas por homens de direita filiados a partidos como MDB (26), PSD (24), DEM (22), PSDB (19), PP (17), PL (11), entre outros.
Ou seja, as eleições municipais 2020 para as candidaturas femininas do PT foram marcadas por uma disputa ideológica frontal em que as candidatas a prefeita, vices e vereadoras encamparam por todo país, na batalha por uma sociedade mais justa, igualitária e humana.
Diante do resultado eleitoral, a quantidade de mulheres eleitas no campo da direita e centro-direita evidencia os desafios que serão colocados na nossa disputa sobre a participação das mulheres na política, a partir do projeto político que elas defendem.
Enquanto a defesa de um Estado liberal pautar a política brasileira, não avançaremos na pauta da conquista de direitos, a começar pela igualdade entre homens e mulheres, o direito à saúde, o respeito ao corpo.
Ao mesmo tempo que é preciso pautar e efetivar representatividade de gênero, é necessário garantir representatividade política nos impactos de uma educação inclusiva, antirracista, defensora da saúde gratuita, universal e de qualidade. Essas prioridades estão circunscritas em um espectro político não representado pela centro-direita, tampouco pelas mulheres desse campo.
COMPARATIVO 2016 – RETOMADA E RESISTÊNCIA
É evidente que, além de reacionário, o golpe de 2016 contra a presidenta Dilma teve caráter misógino. Aos poucos, a história escancara as injustiças feitas contra a presidente, o ódio de classe, a violência de gênero na política tão pronunciada. As consequências desse golpe vem gerando muitos espólios não apenas para o país, em termos de retrocesso, retirada de direitos e ataques à democracia, mas também teve efeitos profundos no desempenho eleitoral do PT.
Em 2020, sob a égide do governo Bolsonaro com a fábrica de mentiras e do crescimento das forças de direita e centro direita, o cenário se tornou ainda mais desafiador. No entanto, as mulheres não se furtaram de seu papel histórico na luta por uma sociedade mais justa, democrática e humana.
Com mais de dez mil candidatas, o PT ampliou o número de eleitas em mais de 20%, saindo de 519 eleitas (entre vereadoras, prefeitas e vices) em 2016 para 639 eleitas em 2020. São ares de reconstrução.
Total eleitas (vereadoras, prefeitas e vices) 2016 = 444 + 31 + 44 = 519
Total eleitas (vereadoras, prefeitas e vices) 2020 = 561 + 28 + 51 = 640
VEREADORAS – MAIOR, MAIS DIVERSA E REPRESENTATIVA
Em 2020, a sociedade brasileira apostou na participação feminina nas Câmaras Municipais e escolheu o PT para fazer parte desse processo. Foram 561 vereadoras eleitas contra 444 em 2016, um aumento de 25%. As regiões que lideraram esse desempenho, em tempos tão desafiadores, foram Sul, Nordeste e Sudeste. Em primeiro lugar, Rio Grande do Sul (94), seguido de MG (80), Bahia (61), Piauí (59), Santa Catarina (47) e São Paulo (44).
No campo progressista, o PT liderou o ranking de vereadoras eleitas e elegeu o maior número de negras e jovens em todo país, demonstrando que está conectado com as transformações e os anseios da sociedade brasileira.
A garantia de candidaturas diversas e representativas, um dos principais esforços do projeto Elas Por Elas, da Secretaria Nacional de Mulheres do PT, também demonstrou resultado nas urnas. O PT elegeu 267 vereadoras que se auto declararam negras e pardas em todo país, um avanço para a construção e a consolidação do combate ao racismo e o fortalecimento da pauta antirracista. Além de 53 jovens, 158 mulheres entre 30 e 39 anos, e 21 LBTQIA+ (segundo levantamento preliminar).
A retomada do crescimento de mulheres eleitas, ainda que tímida, ressalta o aspecto de uma luta histórica do Partido dos Trabalhadores e Trabalhadoras: a garantia da diversidade. Ao contrário da tônica produzida pela grande mídia, o PT segue sendo um partido que elege mulheres com um projeto político progressista, diverso, representativo e com peso na sociedade — se expressando concretamente na votação de mulheres petistas em cidades de todo país.
JOVENS
O PT também lidera o ranking do campo progressista de vereadoras jovens eleitas para o legislativo municipal nas cidades brasileiras. O partido elegeu 53 jovens, a classificação é seguida pelo PDT (41), PSB (30), PC do B (9) e PSOL (9).
Em relação aos outros partidos, o PT ocupa o 4º lugar, atrás do MDB, PP e PSD, nessa ordem. O Rio Grande do Sul lidera o ranking de jovens eleitas, seguido por São Paulo, Minas Gerais e Santa Cantarina. Já na proporção de jovens em relação ao total de candidaturas do Estado, o ranking fica com São Paulo, Espírito Santo, Tocantins e Amazonas.
Considera-se jovem a candidata abaixo de trinta anos. Em uma leitura fria e superficial, a quantidade de jovens candidatas pode parecer pequena numericamente, mas o perfil etário ajuda a entender a disposição de participar da campanha como um ato muito corajoso e resultado de uma trajetória política própria e, muitas vezes, coletiva. Quando uma luta por direitos avança, move um conjunto complexo de forças, na qual a juventude está inserida.
Nos últimos anos, os movimentos secundaristas de jovens trabalhadoras, antirracistas, o debate feminista mais presente amplamente na sociedade, conquistas de direitos como no governo do PT com maior acesso às universidades, inclusão social, cotas raciais e os avanços dessas lutas, indicam um campo de formação progressista e a necessidade de retomada de de renovação política, que se coloca em processo no partido.
Faixa etária das eleitas
53 mulheres jovens
158 mulheres entre 30 e 39 anos
315 mulheres entre 40 e 59 anos
35 mulheres com mais de sessenta anos
Confira a distribuição de mulheres eleitas por faixa etária nos estados
Confira a proporção de jovens eleitas por estado
NEGRAS
Em 2020, o PT elegeu 267 vereadoras negras em todo país e a proporção entre negras e brancas chega a quase 50%, representando equilíbrio e a luta também interna por igualdade racial, reflexo da realidade da sociedade brasileira.
Dentre todos os partidos, o PT foi o que mais elegeu que se declararam pretas com 81 vereadoras eleitas. O PDT aparece em 9º lugar (26), seguido de PSB (23), PC do B (17) e PSOL (15).
Em relação às que se declararam pardas, o PT segue liderando dentre os partidos do campo progressista com 186 mulheres eleitas no legislativo. Em seguida, vem PDT (182), PSB (146), PC do B (59) e PSOL (2). No geral de todos os partidos, o PT ocupa o 6º lugar atrás de MDB, PP, PSD, DEM e PL, nessa ordem.
Não é possível analisar esses números sem considerar o racismo estrutural da sociedade brasileira e o aumento da violência política que marcaram as eleições desse ano e tiveram um alvo específico: as mulheres negras. Portanto, além do equilíbrio racial, os obstáculos enfrentados pelas candidatas negras precisa ser pesado, trazendo uma importância e um novo significado para além dos números quantitativos. Dessa forma, cada mulher negra eleita pelo Partido dos Trabalhadores carrega uma conquista também qualitativa de garantir que suas vozes, seus corpos e seus corações ocupem o devido espaço nos cargos eletivos do país.
A pesquisa Violência Política Contra Mulheres Negras revelou que a maioria das mulheres negras que se candidatou a cargos eletivos em 2020 sofreu algum tipo de violência no ambiente virtual. No total, 78% das candidatas negras de todas as regiões do país, que responderam à pesquisa, relataram ter sofrido desde xingamentos racistas em suas páginas até ataques sincronizados em transmissões ao vivo. Os dados são do estudo realizado pelo Instituto Marielle Franco, com apoio da Terra de Direitos e Justiça Global, e divulgado em novembro. Os principais autores das violências são grupos não identificados (45%), candidatos ou grupos militantes de partidos políticos adversários (30%) e grupos anti-feministas, racistas e neonazistas (15%).
No PT, as mulheres negras também sofreram para serem eleitas e também por serem eleitas, como o caso da candidata eleita Ana Lucia Martins (PT) primeira mulher negra eleita em Joinville (SC). Ela teve que procurar segurança abrindo um boletim de ocorrência contra ameaças que vem recebendo em suas redes sociais desde o anúncio de vitória nas eleições. As mensagens recebidas diziam: “Agora só falta a gente m4t4r el4 [sic] e entrar o suplente que é branco”. As informações são do G1. Leila Arruda, candidata a prefeita em Curralinho (PT-PA), foi brutalmente assassinada a facadas pelo ex-marido, de quem estava separada há mais de três anos. Com uma campanha que demarcou a luta das mulheres, em defesa da educação pública de qualidade, Leila teve sua vida ceifada por um homem que se julgou no direito de tirar a vida dela.
Na Bahia, Major Denice (PT-BA), candidata a prefeita de Salvador, enfrentou a violência política na campanha pela ocupação do Palácio Thomé de Sousa (sede da prefeitura soteropolitana). Nesse caso, além de lidar com xingamentos e atos racistas nas redes, ela ainda teve que combater a campanha de desinformação e fake news.
Outro caso denunciado foi o da educadora e fundadora da Rede de Mulheres Negras da Bahia, Lindinalva de Paula (PT-BA). Ela sofreu um ataque de hackers no lançamento online da pré-candidatura, um mês antes do início da propaganda eleitoral. A atividade realizada na plataforma Google Meet foi invadida por dois perfis que interromperam a transmissão com imagens pornográficas, termos ofensivos e saudações ao atual presidente, Jair Bolsonaro.
Benedita da Silva (PT-RJ), candidata a prefeita pelo Rio de Janeiro, prestou diversas queixas de crime de racismo, injúria e difamação por conta de ofensas racistas que sofreu nas redes sociais. E, coincidentemente, Benedita, que também é deputada, foi alvo de ataques racistas no mesmo dia em que o TSE aprovou sua proposta de cotas eleitorais para negros.
Ainda em novembro, o Partido dos Trabalhadores acionou o TSE e a Procuradoria Geral Eleitoral exigindo providências em relação à proteção das mulheres candidatas e eleitas e pela responsabilização e penalização dos agressores e disseminadores de inverdades.
PREFEITAS, MAIS DO QUE ELEITAS: LEGÍTIMAS E COMPETITIVAS
O PT elegeu 28 mulheres para prefeita em todo país e ocupou o 10º lugar no ranking geral atrás de MDB, PSDB, PP, DEM, PSDB, PL, PDT, PTB e Republicanos. Já no campo progressista, o PDT lidera com 34 prefeitas eleitas, o PT em segundo lugar seguido de PSB (27) e PCdoB (9).
Mas os dados também devem ir além do que salta aos olhos. Do total de candidaturas femininas, 45 obtiveram mais de 40% dos votos válidos. Dessas, 19 foram eleitas com esse recorte, e outras não foram vitoriosas em cenários muito apertados, com disputas acirradas contra a direita.
Ou seja, mais de 25 mulheres, apesar de não eleitas, mostraram que é possível disputar em condições competitivas e resistir aos preconceitos arraigados também na cultura política brasileira. Foram candidatas feministas que correspondem aos desafios da conjuntura e fortalecem o processo de amadurecimento político no Brasil. Além dessas, ainda somam-se 26 candidatas a prefeita que obtiveram a expressiva votação no intervalo entre 30 e 39,9% dos votos válidos em suas cidades.
Essa expressão da competitividade das mulheres na disputa pelo poder executivo demonstra que o PT apostou em candidaturas fortes e legítimas que respondem aos interesses da sociedade.
28 candidatas eleitas >> 19 tiveram mais de 45% dos votos
26 candidatas não eleitas >> mais de 45% dos votos
26 candidatas não eleitas >> entre 30 e 39,9% dos votos
CORRIDA COM OBSTÁCULOS E VIOLÊNCIA
As eleições 2020 no Brasil entraram para a história como a disputa que marcou o aumento da violência política contra as mulheres. A onda da resistência feminista que encontrou potência na campanha “Ele Não”, em 2018, teve reflexo nas candidaturas de mulheres desse ano. Com foco no aumento da participação política feminina para enfrentar o fascismo e o bolsonarismo, as mulheres foram às ruas para disputar o processo eleitoral. A reação conservadora e antidemocrática não tardou em avançar sobre seus corpos, suas vozes, suas honras e suas vidas.
Apesar de ter sido a primeira eleição municipal com a garantia do fundo partidário e a cota de 30% de mulheres, a disputa se deu em um ambiente hostil, diante de uma conjuntura reacionária e conservadora, principalmente para as mulheres..
No Partido dos Trabalhadores, os dados demonstram que elas cumpriram um papel fundamental e primordial na trincheira dos direitos, da defesa da democracia e de um projeto de sociedade com mais justiça social e menos desigualdade.
A chave para a retomada do processo de crescimento foi a conexão das mulheres do PT com a realidade do povo brasileiro e sua diversidade de gênero, raça, faixa etária, orientação sexual e capilaridade — refletindo os perfis da classe trabalhadora. Mesmo com o avanço dos partidos de direita e centro-direita, elas não se furtaram de ocupar seus espaços e ampliaram em 20% a sua participação na política, um feito grandioso dentro de um espectro temporário em que os retrocessos parecem não ter fim.
O Brasil atravessa a pior crise sanitária dos últimos cem anos, aliado à crise econômica, social, financeira e de soberania alimentar. O partido segue sendo alvo de perseguições e mentiras, a escalada da violência de gênero, não apenas na política, mas em todos os campos impera. Com escolas fechadas, as mães têm suas cargas triplicadas no cuidado com as crianças; com o desemprego, elas são as primeiras a serem demitidas; com o confinamento, mulheres e crianças estão mais expostas à violências, abusos e feminicídio; um cenário complexo que empurra, de forma cada vez mais violenta, as mulheres para fora do espaço político, confinadas apenas ao lar e à dependência de homens. E mesmo eleitas, ainda se encontram em campo hostil, como o caso da deputada Isa Penna, desrespeitada e violada em público, aos olhos de todos e com câmeras, por um deputado que se sentiu legitimado em assediar seu corpo.
Portanto, a análise do desempenho eleitoral das mulheres do PT também devem estar aliado a essa perspectiva conjuntural mais ampla, que torna o crescimento e a importância delas exponencialmente maior que os 25% e seus derivados — abrindo o horizonte para um cenário de fortalecimento, formação e acompanhamento das mulheres eleitas e suas disputas locais para os próximos quatro anos.
Essas eleições abriram uma fresta para os ares de reconstrução, liderada pela força e garra das mulheres, de que tempos melhores virão.