A força da esquerda na América Latina: Morena e Frente Ampla compartilham experiências

Partidos do México e Uruguai debatem suas estratégias de organização e vitória em seminário promovido pelo PT

Zô Guimarães

A presidenta Gleisi Hoffmann mediou a conversa entre os dois representantes

No âmbito das comemorações dos 45 anos do Partido dos Trabalhadores, a presidenta Gleisi Hoffmann mediou uma mesa internacional que simbolizou a força do momento de união entre grandes partidos da América Latina. O evento reuniu representantes de duas legendas que conquistaram recentes vitórias eleitorais expressivas: Carolina Rangel Gracida, do partido mexicano Morena, e Fernando Pereira, da Frente Ampla do Uruguai. Mais do que um encontro institucional, a mesa representou uma troca essencial de experiências, fundamental para o PT aprimorar sua organização interna, renovar-se e fortalecer-se diante dos desafios impostos pelo avanço da extrema direita.

Ambos os partidos tiveram construções partidárias e eleitorais exitosas, que os levaram a vitórias presidenciais significativas. No México, o Morena elegeu a primeira mulher presidenta da história do país, Claudia Sheinbaum, em junho de 2024. No Uruguai, a Frente Ampla, que se organiza de maneira a integrar partidos e movimentos sociais, elegeu Yamandu Orsi presidente do país. Ambas as vitórias acontecem em um momento importante para a América Latina, de novo período de resistência ao imperialismo e ao avanço da extrema direita.

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A presidenta Gleisi Hoffmann mediou a conversa entre os dois representantes, abrindo espaço para exposições de cada um sobre a atuação de seus partidos e suas experiências organizativas, e depois abriu um ciclo de perguntas para debate, incluindo a participação do público.

“E a vocês dois, parabéns pelas vitórias conquistadas nas eleições tanto do México quanto do Uruguai”, celebrou Gleisi Hoffmann, presidenta do PT. “Nós torcemos muito, acompanhamos, vibramos. Foi de grande importância para nós aqui da América Latina.” Gleisi também agradeceu ao diretor de cooperação internacional da Fundação Perseu Abramo pela organização da mesa.

“Essa mesa é muito importante. O nome já diz tudo: para inspirar a organização partidária”, acrescentou a presidenta. “É isso que precisamos discutir na organização do PT. Vocês sabem que a extrema direita está se organizando forte no Brasil, no mundo, na América Latina. Nós precisamos também nos organizar”, lembrou. “O PT tem muitos desafios. São 45 anos exitosos, senão não estaríamos aqui comemorando. Sempre temos que ter o desafio de renovação, da nossa organização partidária. Reforçar como nos relacionamos com o povo brasileiro, com os trabalhadores e as trabalhadoras”.

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A presidenta Gleisi ressaltou, ainda, a oposição enfrentada pelo governo Lula neste terceiro mandato, o quinto governo do PT. “Estamos enfrentando uma oposição mais organizada, ideológica, e fortalecida com base popular. É uma oposição de extrema direita. Como nos organizamos para isso? Como enfrentamos? Os desafios são grandes.”

Um vídeo produzido pela FPA e pelo PT foi reproduzido ao público no palco para situar um pouco a situação política dos dois países ali representados e suas respectivas vitórias eleitorais recentes no México e no Uruguai.

A construção exitosa do Morena, no México

O Movimento de Regeneração Nacional (Morena) consolidou-se como a principal força política do México em apenas 12 anos de existência formal. Mas sua história começa antes: “Nosso movimento começou como o Movimento Obradorista, fundado pelo melhor presidente que o México já teve na época atual”, afirmou Carolina Rangel, secretária-geral do partido. Mais que um partido eleitoral, o Morena se define como um partido-movimento, mantendo-se próximo da base e comprometido com o que chama de Humanismo Mexicano.

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A estrutura organizacional do Morena sustenta-se em Comitês Seccionais, o núcleo de militância do partido. “Nosso segredo foi a revolução das consciências. Sabíamos que, por meio dela, transformaríamos o país. E isso significa continuar falando com as pessoas, nos organizando e batendo em portas.” Para isso, o partido aposta na formação política permanente: “Nosso Instituto Nacional de Formação Política atua como um espaço de aprendizado contínuo, semelhante à Fundação Perseu Abramo”.

A chegada de Cláudia Sheinbaum à presidência do México é um marco para o Morena. “É a primeira mulher a liderar o país e uma presidenta feminista, comprometida com a luta para que todas avancemos juntas”. A ascensão de Sheinbaum reforça o compromisso do partido com a Quarta Transformação, movimento iniciado em 2018 com a eleição de Andrés Manuel López Obrador. “Decidimos que não bastava vencer eleições. Precisávamos continuar perto do povo”, destacou Rangel.

O partido também enfrenta desafios na batalha comunicacional. “A direita mexicana, politicamente e moralmente derrotada, prefere apoiar Trump a respaldar nossa presidenta. Nosso papel é contrapor as fake news, informar a militância e garantir que a verdade sobre as ações do governo chegue às pessoas”. Iniciativas como a campanha México Te Abraçaforam criadas para apoiar a população migrante nos Estados Unidos, fortalecendo os laços do Morena com os mexicanos no exterior.

Atualmente, o Morena busca expandir sua base, com uma meta ambiciosa: 10 milhões de afiliados. “Se tivemos mais de 36 milhões de votos na última eleição, podemos nos tornar a maior força política e moral do país”, enfatizou a dirigente. Mas um alerta se mantém: “O Morena falhará se se afastar do povo. Nossa tarefa é seguir escutando, estar presentes e caminhar juntos. Não temos o direito de descansar”.

A experiência exitosa da Frente Ampla do Uruguai

A história da Frente Ampla no Uruguai é um exemplo de unidade e construção política sólida. Em sua participação no seminário, o presidente do movimento, Fernando Pereira, destacou que o partido atravessou momentos difíceis, mas sempre manteve o compromisso com a transformação social. “O PT foi um farol no caminho da Frente Ampla e de boa parte da esquerda latino-americana”, afirmou.

A esquerda uruguaia enfrentou dura repressão durante a ditadura, com perseguições, exílios e desaparecimentos. No entanto, soube se reorganizar e, em 1989, conquistou pela primeira vez a prefeitura de Montevidéu, mantendo-a por 35 anos consecutivos. “Quando a esquerda se conecta com a sociedade, pode construir longos ciclos”, explicou Pereira.

No plano nacional, a Frente Ampla governou o país por 15 anos, liderada por Tabaré Vázquez e Pepe Mujica. Durante esse período, o PIB uruguaio saltou de 16 para 60 bilhões de dólares, enquanto a pobreza caiu de 40% para 8% e a indigência de 10% para 2%. “Mudamos a vida dos trabalhadores rurais, triplicamos o número de empregados no campo e fortalecemos os sindicatos”, ressaltou.

A recente vitória da esquerda nas eleições reafirma a força do movimento. Yamandú Orsi, do Frente Ampla, assumirá a presidência com maioria no Senado e 48 dos 99 deputados. Pereira enfatiza que o diferencial da Frente Ampla foi entender que um partido de esquerda não pode se afastar da sociedade. “Quando perdemos, aumentamos a militância, fortalecemos a presença no território e ouvimos o povo”, disse.

Para Pereira, a unidade é estratégica e essencial para a consolidação da esquerda. Ele citou o papel da juventude no movimento, lembrando que 66% dos menores de 25 anos apoiaram a Frente Ampla nas últimas eleições. O desafio, segundo ele, é manter essa conexão constante. “A direção dos partidos nunca deve se afastar do povo. Temos que ir aos mesmos supermercados, às mesmas feiras, estar onde o povo está”.

Com ventos de mudança na América Latina, Pereira reforçou a importância de construir uma esquerda forte, popular e democrática. “A unidade não é uma questão tática, é estratégica”, concluiu.

Da FPA

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