Agora, GM ameaça com encerramento de atividades no Brasil

Decisão de encerrar produção de veículos a combustão até 2035 levanta dúvidas sobre planos da montadora para o Brasil, onde mantém três fábricas. Ano passado, PDV da empresa não atraiu a adesão esperada. Saída da Ford vai exterminar mais de 118 mil mil postos de trabalho, entre diretos, indiretos e induzidos

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Depois da Ford, GM também ameaça com desemprego

Até 2035, a General Motors deverá encerrar a produção de veículos movidos a combustão e passar a produzir apenas veículos leves (incluindo picapes e SUVs) movidos por eletricidade ou outro combustível sem emissões, como hidrogênio. A fabricante norte-americana também ampliou o investimento em modelos elétricos e autônomos em 35%, ou US$ 27 bilhões (R$ 146 bilhões) nos próximos cinco anos.

Para o Brasil, a GM confirmou que a eletrificação irá se repetir no mesmo prazo, tornando-se assim a primeira fabricante no país a formalizar a aposentadoria de carros a combustão. Mas ainda não se manifestou se as medidas implicarão no encerramento integral da produção da GM no Brasil ou se a marca montará modelos elétricos nas unidades de São José dos Campos e São Caetano do Sul, em São Paulo, e Gravataí (RS).

Surpreendidos, trabalhadores do setor automotivo encaram o anúncio com preocupação, semanas após o anúncio da Ford de encerramento de sua linha de produção no Brasil. Embora a GM se encontre em situação muito mais sólida no país, desde agosto a montadora vem promovendo programas de demissão voluntária (PDV) nas fábricas de São Caetano e São José.

Segundo o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Caetano, Aparecido Inácio da Silva, o Cidão, no PDV aberto em agosto e reaberto em outubro, 339 pessoas aderiram e foram desligadas.

O número ficou abaixo da meta da GM, que desde o início da pandemia do coronavírus adotou ferramentas de afastamento temporário e de redução de jornada e salários, e alerta os funcionários que precisa reduzir seu quadro diante da redução da demanda e da produção sofrida em 2020. Agora, a montadora pode anunciar uma onda de demissões, caso o novo PDV siga em baixa entre os trabalhadores.

O grande problema de se produzir um veículo elétrico em série no Brasil é que isso jamais ocorreu. Houve apenas experimentos pontuais que começaram com a Gurgel e culminaram na montagem de algumas unidades do Renault Twizy no Paraná. A adaptação dos parques industriais exigiria investimentos pesados.

A cadeia de fornecedores seria outro problema, já que a maioria dos componentes do trem de força dos veículos elétricos é importada, incluindo a caríssima bateria de íon-lítio. Por conta dos valores, a nacionalização dessas peças só seria possível em um trabalho conjunto com governo, instituições de pesquisa e desenvolvimento, faculdades e empresas. Essa conjunção de esforços é improvável no momento em que a área nacional de pesquisa e inovação sofre séria ameaça com seguidos cortes de recursos federais por parte do desgoverno Bolsonaro, que sequer possui política industrial.

As políticas globais de mobilidade elétrica das grandes empresas são ajustadas para cada região, considerando limitações de investimento, linhas de montagem e valor médio dos veículos novos. Por isso a surpresa da GM oferecer no Brasil só carros elétricos em 14 anos. O único elétrico da marca vendido no país é o Bolt, por altíssimos R$ 260 mil.

Considerando que o hatch é o elétrico mais barato da GM também nos Estados Unidos, a melhor alternativa para oferecer um modelo eletrificado por um valor mais atraente seria montá-lo no Brasil — ou trazê-lo do México e Argentina, para evitar os 35% de imposto de importação. Ou, na pior das hipóteses, encerrar a produção de veículos no Brasil, seguindo o caminho da Ford.

Para deputados e sindicalistas, Ford é “ponta do iceberg”

Na quarta (27), partidos de Oposição na Câmara dos Deputados, centrais sindicais, instituições e entidades do setor se reuniram para discutir a saída da Ford do Brasil. O encontro foi uma iniciativa dos deputados Carlos Zarattini (PT-SP) e Vicentinho (PT-SP).

Para o líder da Bancada do PT na Câmara, Enio Verri (PR), o episódio revela a desindustrialização do Brasil. “O debate que nós fazemos aqui sobre a Ford é a ponta do iceberg. Na verdade, aquela declaração do presidente Bolsonaro na semana passada, dizendo que o melhor caminho para o Brasil é não ter mais indústrias, defendendo o processo de desindustrialização, mostra a maneira como esse governo pensa o futuro do Brasil. Quando um governo defende uma proposta como essa, dá para entender qual o futuro do Brasil e, principalmente, qual o futuro da classe trabalhadora”, criticou.

Luís Paulo Bresciani, diretor do Dieese, afirmou que as cinco mil demissões anunciadas pela Ford significam a perda de mais de 118 mil postos de trabalho (diretos, indiretos e induzidos). Para ele, as demissões podem resultar em perda potencial de massa salarial da ordem de R$ 2,5 bilhões/ano, considerando-se os empregos diretos e indiretos.

O representante do Dieese alertou também que haverá queda de arrecadação de tributos e contribuições em torno de R$ 3 bilhões/ano. “O processo de desindustrialização tende a se agravar, caso esse processo não seja interrompido rapidamente”, avisou Bresciani, que classificou como “pífias” as mobilizações industriais do governo.

“No contexto da pandemia temos uma mobilização industrial zero. Não ouve esforço desse governo em mobilizar a indústria para o enfrentamento a crise. As iniciativas tomadas foram absolutamente pífias” afirmou. “Então, o fechamento da Ford é a ponta de um iceberg gigantesco e desastroso em que nós estamos colocados.”

No entendimento do presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM), Paulo Cayres, a decisão da Ford, além de desrespeitosa, “é canalha”. “Na nossa visão, a Ford está querendo enfrentar a nova revolução industrial fechando empresas, e na nossa visão como dirigentes sindicais, equivocadamente. Até porque toda vez que não se ouve os dirigentes sindicais, não se senta na mesa, não se discute, é isso que acontece”, concluiu.

Representante do Ministério Público do Trabalho (MPT), Ronaldo Santos criticou a falta de transparência da empresa, que pegou a todos de surpresa. Segundo ele, a saída da Ford não é só uma questão de “fechar as portas”, mas de um processo que está ocorrendo no setor automotivo que pode ocasionar “uma desindustrialização grande”.

Santos contou que o Ministério Público já pediu dados ao BNDES sobre a situação da Ford, e que está solicitando dados também para os governos estaduais. “A transparência é muito importante, nós precisamos dos dados dos subsídios, das subvenções, e os compromissos da empresa Ford e de outras no Brasil”, defendeu.

O representante do MPT sugeriu como encaminhamento que, a partir da audiência pública, se verifique a legislação, que foi alterada em 2017 pelo usurpador Michel Termer. “Antes, para uma empresa conduzir veículos no Brasil ou importar veículos, ela tinha que ter uma planta industrial aqui, e isso não precisa mais. Então, é um processo de desindustrialização, embora seja algo global, a política nacional, evidentemente, facilita”, esclareceu.

A deputada Erika Kokay (PT-DF) reforçou uma sugestão do deputado Alexandre Padilha (PT-SP). “Nós temos um segmento que está engordando o seu lucro na sombra absolutamente frondosa do próprio Estado. Acho que nós deveríamos construir, a partir dos partidos de Oposição, o que foi sugerido pelo deputado Padilha: comissão geral ou uma comissão externa para discutir a desindustrialização”.

Da Redação, com PT na Câmara

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