Assis Carvalho: Justiça tributária

A regulação por lei complementar do imposto sobre grandes fortunas, previsto na Constituição, está na ordem do dia. O cenário de consolidação fiscal recoloca a necessidade de discussão do reordenamento…

A regulação por lei complementar do imposto sobre grandes fortunas, previsto na Constituição, está na ordem do dia. O cenário de consolidação fiscal recoloca a necessidade de discussão do reordenamento das despesas da União, mas também das suas fontes de receitas.

Há várias razões para regular o imposto. A primeira é que a base de arrecadação tributária brasileira está concentrada em impostos indiretos que incidem sobre bens e serviços. A Receita Federal estima que os tributos indiretos tenham somado 18,4% do PIB em 2013, o equivalente a 51,3% da carga tributária. A concentração da carga impositiva nos tributos indiretos gera distorções econômicas, como a acentuada regressividade do sistema tributário. Ou seja, as famílias de menor renda pagam proporcionalmente mais tributos que as mais ricas, pois a carga tributária em um bem ou serviço é a mesma para ambas.

Essa tributação indireta também prejudica os investimentos, pois as empresas se deparam com uma tributação alta na compra de máquinas, equipamentos e serviços industriais. Mesmo com previsão legal de devolução de tributos indiretos, criam-se resíduos tributários que na prática não são recuperados. É necessário alterar as bases de incidência da tributação para maior participação dos tributos diretos. Há distorções, se comparamos com outros países. Em 2013, a carga tributária sobre renda, lucro e ganhos de capital era de 6,4% no Brasil. Para a média dos países da OCDE, era de 12,2% no mesmo ano. A carga impositiva sobre propriedade no Brasil é também mais baixa que a média da OCDE. A regulação do imposto sobre fortunas vai tornar mais justo o sistema. Alega-se que a regulação do imposto provocaria fuga de contribuintes milionários para outros países e que haveria dificuldades de avaliar bens a serem tributados, como propriedades imóveis e objetos de arte. Argumenta-se que essas dificuldades teriam levados países, como a Alemanha, a abandonar o gravame, mas não se menciona a hegemonia do ideário neoliberal de que menor tributação dos mais ricos seria melhor para o crescimento.

As dificuldades podem ser contornadas. Deve-se ter em mente que alíquotas marginais bem dosadas e que valor a ser pago do imposto não ultrapassem determinados limites. Outro aspecto importante: a troca de riqueza nominada em reais para outras moedas pode implicar perdas significativas dos possíveis contribuintes. A dificuldade de avaliar ativos financeiros e não financeiros pode ser solucionada por meio da adoção de tecnologia de informação e pela integração dos fiscos federal, estaduais e municipais. Não se trata de dificuldade intransponível.

Não é à toa que vários países, inclusive aqueles que tinham abolido esse tributo, discutem a sua introdução ou reintrodução. O imposto é um tributo com vantagens econômicas, com justificativa ética e de justiça tributária.

(Artigo originalmente publicado no jornal “O Globo”, no dia 8 de junho de 2015)

Assis Carvalho é deputado federal pelo PT-PI

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