Cida Abreu fala sobre o que significa presidir a Fundação Palmares

Recém-empossada, a presidenta da Fundação Cultural Palmares (FCP/MinC), Cida Abreu, fala dos 10 primeiros dias de transição e destaca objetivos e desafios à frente da casa. “Assumir a Palmares significa…

CIDA ABREU_fcp

Recém-empossada, a presidenta da Fundação Cultural Palmares (FCP/MinC), Cida Abreu, fala dos 10 primeiros dias de transição e destaca objetivos e desafios à frente da casa. “Assumir a Palmares significa uma grande responsabilidade, pois se trata da primeira organização governamental de resistência ao racismo no Brasil e que hoje representa um espaço de garantias de direitos, resultantes das lutas de milhões de pessoas”, afirma.

Em entrevista à Assessoria de Comunicação institucional (Ascom), Cida destaca que a Fundação é a concretização do que significam as lutas e os valores por traz da identidade negra em todos os canais de representação, material e imaterial, do país. “Representa a cultura afro-brasileira, que é a impressão do patrimônio cultural ancestral trazido pelos africanos”, diz. Nesse sentido, a presidenta esclarece que a missão da Fundação deve ser ampliada na compreensão pública. “A Palmares vai além das certificações quilombolas. A cultura afro-brasileira interfere e dá origem a muitas outras culturas que necessitam ser trabalhadas em todos os seus aspectos”, completa.

Comprometida com as questões étnico-raciais, ela enfatiza que o trabalho junto ao Ministério da Cultura (MinC) será intenso. A proposta é fortalecer a relação institucional, aproximando as atuações dos dois órgãos. “A partir do diálogo com o ministro Juca, construiremos caminhos para que a cultura seja vista como possibilidade de desenvolvimento econômico, dando perspectivas à população que é maioria no país”, disse, lembrando que o percentual de pessoas negras é de 53% dos habitantes da nação.

Com o objetivo de apresentar os ideais de Cida à frente da Palmares, a Ascom apresenta um ponto-a-ponto, em que e a presidenta sintetiza suas propostas de gestão nos mais diversos aspectos. Confira:

Foco institucional
“O principal objetivo da gestão é o fortalecimento da Fundação e a sua autonomia. Para isso, a base é o estímulo à dedicação do corpo administrativo com o compromisso de não apagar o que já foi construído, mas, pelo contrário, ampliando e agregando novas ideias. A Palmares precisa ser reconhecida como as demais autarquias do Governo. Aliás, uma autarquia muito especial porque trata do povo que nacionalizou a cultura brasileira a partir da sua identidade ancestral, a africana”.

Desafio
“O maior dos desafios neste momento envolve a questão quilombola. É o julgamento do Decreto 4887/2003 pelo Supremo Tribunal Federal (STF). É uma situação delicada por se tratar do meio legal que garante os direitos das comunidades quilombolas. Enquanto acompanhamos esse processo, nos apoiaremos também em outro dos mais importantes marcos legais que temos, o Estatuto da Igualdade Racial. É dele que nos utilizaremos para garantir o fortalecimento e os direitos da comunidade negra e da cultura afro-brasileira”.

Gênero
“Infelizmente, o machismo impera em nossa sociedade. Porém, a igualdade de gênero deve ser um anseio, deve estar em pauta e com o objetivo de ser alcançado. Uma das metas da Palmares diante dessa temática será contribuir para que as mulheres negras tenham espaço de voz. Também trabalharemos para fortalecer a produção cultural e o desenvolvimento econômico das atividades dessas mulheres. Mais um, entre outros objetivos, é apoiar a Marcha das Mulheres Negras”.

Corpo efetivo
“Estou me apropriando da capacidade institucional da Palmares no campo da força de trabalho e do orçamento que é para a manutenção desse espaço e para as realizações das ações finalísticas. Aqui, não represento só, conto com um corpo de funcionários efetivos e colaboradores que contribuem e que podem ser considerados também patrimônios de registro desse espaço. Nesses 10 dias de transição e de reconhecimento da Fundação, já participo da elaboração do Programa Plurianual (PPA) 2016/2019. É uma satisfação, um desafio, porque gosto de desafios, e uma alegria muito grande ter essa oportunidade”.

Quilombos
“A defesa dos quilombos faz parte da nossa ancestralidade pois, as populações que os compõem são remanescentes daqueles que foram os primeiros canais de resistência às desigualdades. A certificação é uma questão que requer um acompanhamento bem intenso e com muita solidariedade, especialmente àqueles quilombos que se encontram em áreas de conflitos. A grande maioria dessas comunidades ainda necessita ser titulada, porém em um critério onde a Fundação, o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) dialoguem. A proposta é que possamos contribuir para que o Governo promova os direitos a partir da certificação, da titulação e da execução de políticas públicas. Acredito que nesse campo, a atuação distinta das áreas dentro de suas competências e a harmonia entre esses órgãos são fundamentais!”

Promoção da cultura
“A área de fomento é um fator importantíssimo e a qualificação dos produtores culturais na cultura afro-brasileira é um ponto estratégico a ser explorado. Precisamos enxergar a cultura afro-brasileira como mecanismo de desenvolvimento econômico do país. É uma meta que a população negra não somente contribua, mas também participe efetivamente desse desenvolvimento”.

Religiosidade
“A religiosidade de matriz africana foi uma forma dos negros e negras africanos sobreviverem ao banzo, à retirada do seu território. Defender esse seguimento é uma grande responsabilidade dentro de uma população de mais de 200 milhões de habitantes, especialmente em um momento em que a laicidade do Estado é colocada à prova, a partir de manifestações de resistência ao respeito da liberdade de se manifestar a partir da sua religião. A Palmares estará, pelos próximos quatro anos, fortemente atuante para o combate à intolerância religiosa. Infelizmente, ainda vivemos em um Estado que ainda precisa de muito para se afirmar no campo da democracia”.

Educação
“No Brasil, existe um racismo velado, é o racismo no tratamento, o racismo no olho. As pessoas precisam reconhecer que o racismo interfere violentamente na identidade da população negra brasileira. Para que ele seja combatido, as Leis 10.639/2003 e 11.645/2008 precisam ser fortalecidas em sua implementação. Temos uma proposta, um projeto que deve ser trabalhado com o Ministério da Educação (MEC).”

Comunicação
“Para que qualquer trabalho seja realizado em atendimento às demandas do nosso público, a Palmares deve ser ouvinte. Nesse sentido, buscaremos promover e estimular a participação popular por meio da proposta do Fórum Nacional de Cultura Afro-Brasileira. A ideia é aproximar da Fundação os produtores culturais e intelectuais em cada estado, por meio das representações da instituição. É um desafio grande trazer a juventude para colaborar e produzir conosco, mas os queremos conosco, crescendo, desenvolvendo estratégias para o combate à violência e contra o extermínio da juventude negra”.

Nacionalização
“Será relevante a participação das representações no planejamento estratégico institucional. Faz parte da ampliação e do fortalecimento da Palmares, dar visibilidade às suas atuações também em outros estados. Nesse sentido a proposta é melhorar a comunicação entre a sede e as representações, sem deixar de lado os estados onde elas não estão. A partir delas, a Fundação terá um contato mais direto e uma atuação mais presente junto aos governos municipais e estaduais”.

Internacional
“As relações internacionais trazem um reencontro da história da Palmares com a comunidade negra, com a comunidade afro-brasileira, a partir das relações culturais possíveis de serem estabelecidas. A Organização das Nações Unidas (ONU) brindou a comunidade negra com uma agenda que nos fortalece: temos 10 anos para falar dentro de um espaço internacional da questão afrodescendente. Um período repleto de oportunidades para o estabelecimento de cooperações, não só com a África, mas com a América Latina e a América Central. Essa década tem que ser de intercâmbio entre nossos países, pois temos identidades culturais muito fortes nessas regiões”.

Por fim, a presidenta Cida Abreu enfatizou o compromisso que tem para com a população e a cultura afro-brasileira. “O racismo, a discriminação e as desigualdades são muito fortes. Apesar disso, a cultura vem sobrevivendo, o que mostra que ela também é forte”, destacou. Cida explica que é por esse potencial que ela se utilizará da cultura como um instrumento de luta para alcançar as metas propostas. “Eu represento a defesa de um projeto. É por ele que vamos afirmar a nossa condição de sobreviventes ancestrais na terra brasileira”, conclui.

PT Cast