Cânhamo pode oferecer opção de diversificação para a agricultura, diz Dartora

Deputada é apoiadora da primeira exposição na Câmara dos Deputados sobre cânhamo; ONU defende a planta como commodity para movimentar economia de países em desenvolvimento

Billy Boss/ Câmara dos Deputados

Deputada Federal Carol Dartora (PT-PR)

Na semana que dá início à COP 28, reunião anual das Nações Unidas sobre o Clima, que começa amanhã em Dubai e seguirá até 12 de dezembro, a Câmara dos Deputados recebe, pela primeira vez, uma exposição sobre o cânhamo, espécie da família da Cannabis Sativa, mas que é caracterizada pelo baixo teor de Tetrahidrocanabinol (THC), de 0.3%, e pela estrutura fibrosa e esguia. A exposição acontece até o dia 1º de dezembro, no Espaço Mário Covas, no Anexo 2, e é aberta ao público. 

A iniciativa da mostra “Cânhamo: uma revolução agrícola não psicoativa” é da deputada federal Carol Dartora (PT-PR), que conta com o apoio dos parlamentares Sâmia Bomfim (PSOL-SP), Túlio Gadelha (REDE-PE), Luciano Ducci (PSB-PR), Bacelar (PV-BA) e Talíria Petrone (PSOL-RJ). A exposição foi organizada pela jornalista Manuela Borges, que há dois anos está à frente do Instituto InformaCann, organismo sem fins lucrativos idealizado para desenvolver pesquisas científicas, ampliar o acesso ao tratamento terapêutico com a Cannabis Sativa.

Na avaliação de Dartora, a mostra pode criar um ambiente propício para o diálogo entre diferentes partes interessadas, incluindo representantes do governo, empresas, cientistas e membros da sociedade civil sobre o papel e a importância da planta. “A exposição proporciona uma oportunidade de aumentar a conscientização e educar os legisladores e o público sobre os benefícios e aplicações do cânhamo, especialmente no que diz respeito às fibras”, observa a deputada.

“Uma exposição na Câmara dos Deputados sobre produtos de fibra de cânhamo pode desempenhar um papel crucial na promoção da conscientização, educação e discussão sobre o potencial do cânhamo, influenciando positivamente o debate público e a formulação de políticas relacionadas ao cultivo e uso dessa planta”, justifica. “Assim, construir consenso e resolver dúvidas sobre o cânhamo e seus usos”, afirmou a parlamentar petista. 

Borges revelou que há dois anos conta com um quadro chamado “Cannabis no Congresso” e, desde então, ela veste roupas de cânhamo para gravar com os deputados: “Eu percebo que quando você mostra um produto finalizado, uma roupa ou um cabo de carregador revestido de cânhamo, muda a percepção deles”, disse.

“A grande parte não sabe que o cânhamo é uma planta sem efeito psicoativo que, por exemplo, nos Estados Unidos já tem uma Regulação Federal sobre, muito embora o uso recreativo e medicinal da planta seja regulado pelos estados. Então, a ideia é mostrar que realmente existem mais de 25 mil produtos, que podem ser feitos a partir da fibra da planta e da semente da planta também”, detalhou. 

Segundo a jornalista, uma das condições da Casa para a realização da exposição foi apresentar somente produtos elaborados a partir da fibra do cânhamo: “Não foi fácil conseguir esse espaço. A gente teve que ceder, inclusive, e não mostrar muitos produtos”, destacou

“Uma das exigências foi essa, porque eu tenho, por exemplo, cosméticos que entraram no Brasil com receita médica, alimentos à base de cânhamo que não contém canabinoides, ou seja, THC, CCB, CBG, CBN, são alimentos feitos a partir da semente da planta. Trinta por cento da semente são proteínas, aminoácidos e ácidos graxos, ômega três, seis e nove. Então, a gente não vai poder mostrar esses produtos. Só existem roupas, tecido, tênis e linha. Só isso que foi permitido”, revelou a jornalista.  

Impacto significativo na economia 

Em 2022, a ONU publicou o documento “Commodities at a Glance Special issue on industrial hemp (Resumo de Commodities Edição especial sobre cânhamo industrial), onde recomenda a países em desenvolvimento o uso do cânhamo como nova estratégia para movimentar economia. 

“Há experiências práticas atuais e conhecimentos empíricos que definem as medidas que poderiam ser tomadas pelos países em desenvolvimento onde as características climáticas e agronômicas são favoráveis ​​ao seu cultivo, a fim de explorar o seu potencial econômico e social. O cânhamo industrial não possui propriedades intoxicantes”, diz um trecho do documento. 

A consultoria especializada em dados sobre a cannabis Kaya Mind, desde 2020 estuda o impacto da planta na economia brasileira. Segundo reportagem do portal Money Times, a Kaya Mind estima que no quarto ano após a normatização do cânhamo, o Brasil contaria com uma área de 15,1 mil hectares para produção. Baseada em estimativas de diferentes países, a consultoria pôde estimar quanto cada um dos insumos valeria no país, e assim, calcular o total produzido pelo setor. 

Preço de cada insumo por hectare: Fibras: R$ 12 mil; Sementes: R$ 21 mil; Óleo de sementes: R$ 71 mil e Óleo de CBD: R$ 160 mil. Assim, no quarto ano da regulamentação do cultivo, as vendas por safras totalizariam R$ 4,9 bilhões, com cerca de 6,7% de impostos por temporada, com isso, seria possível arrecadar cerca de R$ 330 milhões em tributos por ano.

Planta versátil e amiga do meio ambiente

A Cannabis é classificada pela biologia como sendo uma planta do gênero de angiospermas que inclui três variedades dominantes: Cannabis sativa, Cannabis indica e Cannabis ruderalis. É uma planta que contém cerca de 400 compostos químicos mapeados, e mais de oito mil strains/variações de sementes e plantas, induzidas geneticamente. 

Versatilidade é o sinônimo desta planta. As sementes do cânhamo são usadas na produção de alimentos, suplementos nutricionais, medicamentos e cosméticos. O caule e suas fibras são usadas na produção de papel, tecidos, cordas, compostos plásticos biodegradáveis, materiais para construção e até biocombustíveis.

Um acre de cânhamo produz 900 litros de combustível, três toneladas de proteína e 30 toneladas de fibra por ano. Com o uso do cânhamo também é possível produzir papel; plástico biodegradável; óleo, solventes e lubrificantes; tecido mais macio e resistente; concreto mais leve, duro, antibactericida e antimicrobiano, além de produtos como roupas, fraldas, bolsas, jeans, tecidos finos, armações para óculos. A planta tem uma infinidade de usos, que podem auxiliar tanto na retomada econômica quanto na geração de emprego e renda, além de contribuir para a preservação do meio ambiente.

“A integração do cânhamo na economia brasileira, quando feita de maneira sustentável e responsável, pode gerar benefícios econômicos significativos enquanto aborda desafios ambientais. Contudo, é importante considerar questões regulatórias, ambientais e sociais ao explorar seu potencial”, assegura a deputada. 

Por ser o Brasil um país tropical, o clima é extremamente propício para o cultivo da planta. É fundamental destacar algumas das vantagens que o cânhamo oferece. Com rápido crescimento, a planta leva em média três meses para crescer, tem acelerada fotossíntese, é bioacumuladora, sendo uma planta bioabsorvente, potencializa a limpeza do solo, removendo metais pesado – o que seria ótimo para revitalizar solos como os de Mariana (MG), que sofreu com o rompimento de a barragem da mineradora Samarco contaminando o solo, assim como em locais que recebem aterros sanitários, ou que têm o solo degradado.

Em tempos de aquecimento global, é necessário ressaltar que o cânhamo absorve mais CO2 por hectare do que qualquer outra planta ou cultura comercial, o que o torna mais essencial ainda tendo em vista que é urgente a adoção de novas estratégias que diminuam ainda mais as emissões de dióxido de carbono.

Para cada tonelada de cânhamo produzida, são removidas 63 toneladas de carbono da atmosfera; a pegada anual de carbono de um cidadão médio da União Europeia é de cerca de 10,5 toneladas de CO2. Uma tonelada de cânhamo pode, portanto, neutralizar a pegada de carbono de um cidadão da UE por seis anos; e para absorver as 64 toneladas equivalentes de CO2 de uma tonelada de cânhamo, seriam necessárias 2.860 árvores totalmente crescidas.

“Agora o mais importante é a questão da sustentabilidade do crédito de carbono. Tudo que é feito de plástico pode ser feito de cânhamo biodegradável. O tecido de cânhamo também, ele pode ser reabsorvido pela natureza e combater aqueles lixões que a gente vê no deserto do Atacama de roupas sintéticas. Na construção civil também o cânhamo é incrível no uso de tijolos. Casas que estão sendo construídas já de forma mais sustentável. O papel feito de cânhamo, uma árvore de eucalipto demora sete anos para crescer e virar celulose, com seis meses, você já pode derrubar o cultivo do cano para produzir papel para produzir madeira”, detalha Borges. 

Maiores economias no mundo já usam o cânhamo 

Grandes potências como EUA, China e França já introduziram o cânhamo em suas atividades econômicas a partir do uso de tecnologias sustentáveis, com menor impacto ambiental, menor consumo de água e químicos.

Em 2018, sob a gestão do conservador Donald Trump, os Estados Unidos adotaram o Farm Bill 2018, que tem uma legislação específica com foco no cultivo, plantio e comércio. A Farm Bill de 2018, que o Congresso dos EUA aprovou em dezembro daquele ano, removeu o cânhamo da Lista de Substâncias Controladas, o que essencialmente tornou legal a variedade menos intoxicante da planta.

A China é a maior produtora global de Cânhamo e “destina mais de 407 mil hectares para produção da planta e conta com uma longa história de produção da matéria-prima com destino ao uso industrial, com o caule sendo utilizado para produção de fibras têxteis. De acordo com a Kaya Mind, de tudo que o país produz, 75% se destina para produção de fibra”. Já a França produz cânhamo desde 1960.

“A cadeia produtiva do cânhamo, desde o cultivo até o processamento e a fabricação de produtos, pode criar empregos em várias etapas e gerar impactos positivos nas áreas rurais e urbanas”, defende a deputada paranaense. 

Marina Marcondes, da Redação do Elas por Elas, com informações Money Times e Girls in Green

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