Começa o julgamento dos assassinos de Marielle Franco e Anderson Gomes
Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz respondem aos crimes de duplo homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio e receptação, e podem ser condenados a 84 anos cada um
Publicado em
Depois de seis anos e sete meses do mais grave crime de violência política de gênero já ocorrido no Brasil, que chocou o país e teve repercussão internacional, começou nesta quarta-feira (30) o julgamento dos ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, assassinos confessos da vereadora carioca Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes. O julgamento ocorre no 4º Tribunal do Júri na região central do Rio de Janeiro (RJ) e a expectativa é que se estenda até a madrugada de amanhã (31).
Os sete jurados que formarão o Conselho de Sentença do júri popular são homens. Lessa, que está na Penitenciária de Tremembé, no interior de São Paulo (SP) e Élcio Queiroz, que está no presídio da Papuda, em Brasília (DF), devem prestar depoimento por videoconferência. Segundo o G1, há um processo paralelo no STF, que julga os irmãos Brazão e o delegado Rivaldo Barbosa como mandantes. Corre lá por causa do foro dos réus.
Depoimento da sobrevivente
Às 10h30, a primeira depoente foi a assessora de Marielle e principal testemunha do atentado, Fernanda Chaves. Por videoconferência, ela contou como foi o dia 14 de março de 2018, as agendas que a vereadora teve e como foi o percurso de carro até o momento dos disparos.
Chaves, a única sobrevivente do crime, contou que os tiros atravessaram a janela do carro, que Anderson falou ‘ai’, e que Marielle estava imóvel. “Senti o braço e a perna dela sobre mim”, relembrou. Para ela, o veículo havia passado pelo meio de um tiroteio.
Questionada pelo Ministério Público sobre o que mudou na sua vida após o crime, a testemunha afirmou que absolutamente tudo mudou, pois teve que sair do país com o marido e a filha que, à época do crime, tinha apenas seis anos.
“Eu perdi minha filha sendo uma idosa”
O Ministério Público buscou apresentar para os jurados a Marielle fora dos gabinetes, a pessoa ligada à família, a figura humana.
Na sequência, foi a vez da mãe da vereadora, Marinete da Silva, falar. Bastante emocionada, ela afirmou que espera que a justiça seja feita: “Eu perdi minha filha sendo uma idosa”, disse. Conforme relatou, ela foi contra a candidatura de Marielle, mas não podia impedir o desejo da filha: ” Eu não sentia coisa boa no meu coração em relação ao mandato partidário.”
Marinete contou que a filha sempre ajudou em casa e foi uma mulher que sempre primou pela educação, e era dedicada à família e à filha. “Ela não parou diante da dificuldade ao ter a filha tão nova (aos 19 anos). Ajudou a criar a irmã caçula. Todo esse amor deixou de existir por conta dessa barbaridade que fizeram com a minha filha”, disse.
Possível motivação do crime
Terceira testemunha, Mônica Benício, viúva de Marielle, relembrou como foi a convivência com a vereadora, com quem viveu por 14 anos. Também muito emocionada, a arquiteta afirmou que a companheira vivia o melhor momento profissional da vida e que estava em ascensão política: “Tinha agenda política nos 7 dias da semana. Estava feliz com o retorno do trabalho dela.”
O tema da questão fundiária, relacionado ao uso do solo e construções em áreas carentes no Rio de Janeiro, foi questionado pelo Ministério Público. De acordo com a viúva, esta pode ter sido a causa da morte da companheira.
“Com toda certeza ela tinha a preocupação da defesa da cidade. Como era uma pauta que me interessava, eu sempre acompanhei de perto. Ela tinha uma arquiteta urbanista que estava no mandato dela para discutir a cidade de maneira interseccional. A gente pensa a cidade de muitas frentes. E como a Marielle defendia a questão da moradia de forma digna, da favela e periferia, isso era um debate”, disse Mônica.
Ela classificou o assassinato da esposa como um dos “crimes mais emblemáticos do nosso país. Enquanto essa justiça não se apresenta, o que a gente passa de recado é que existe um grupo que é capaz de assassinar como forma de fazer política na certeza da impunidade, e isso não cabe na democracia. Existe uma política antes e depois do assassinato de Marielle”, afirmou Mônica.
Anderson queria mudar de trabalho
Quarta a prestar depoimento, Ágatha Arnaus, viúva de Anderson, contou planos da esposo para trocar de trabalho, e compartilhou que o casal sempre sonhou em ter um filho, Arthur. Quando o motorista foi morto, a criança tinha apenas 1 ano e 8 meses.
Encerrando a primeira parte do julgamento, o agente da Polícia Civil do Rio Carlos Alberto Paúra Júnior depôs. Ele abordou o processo de investigação para definir que o carro usado no crime foi clonado e para localização das placas.
A previsão inicial é de que o julgamento dure pelo menos dois dias. Depois de o júri ouvir as testemunhas e os réus, os advogados de Lessa e Queiroz e o promotor designado vão debater o processo para buscar convencer os jurados.
Da Redação do Elas por Elas, com informações do G1