Corte em programas sociais devolve mulheres à miséria e violência
Agência Pública ouviu especialista que mostraram que cortes no Bolsa Família são arbitrários e afetam principalmente as trabalhadoras mais pobres
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A crise penaliza milhões de brasileiros. Com a retirada de direitos, muitos trabalhadores voltaram à miséria. Mas são as mulheres as principais afetadas pelo desmonte das políticas públicas de proteção social, segundo especialistas. Responsáveis por um número cada vez maior de lares, elas tem sofrido com o aumento da extrema pobreza e da insegurança alimentar no Brasil.
Reportagem da Agência Pública ouviu especialistas para entender o impacto do retrocesso em políticas públicas na vida das mulheres, em especial as mais pobres. Isso porque, além da função socialmente estabelecida de cuidadora do lar e responsável pelo cuidado com familiares, as mulheres têm chefiado um número crescente de famílias em todo país. Em muitos casos, cuidando da casa sozinhas.
Em entrevista a Agência Pública, o pesquisador do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicos (Ibase) Francisco Meneses destacou o protagonismo das mulheres nas famílias brasileiras. “Muitas vezes, nos domicílios em que domina a pobreza ou a extrema pobreza, a mulher – e mãe – é a chefe da casa e não tem um companheiro. Em outros casos, a avó também cumpre esse papel. E, se existe um quadro de extrema pobreza, aquela família frequentemente vive numa situação de fome”.
Nesse sentido, as mulheres tem sido diretamente impactadas com o aumento da pobreza e da extrema pobreza, que tem se consolidado no Brasil desde 2016.
Entre 2016 e 2017, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que o número de pessoas pobres no país teve um aumento de cerca de 2 milhões, indo de 25,7% para 26,5% da população. No mesmo período, a população atingida pela extrema pobreza também teve um crescimento de 2 milhões de pessoas e passou a somar 15,2 milhões de brasileiros.
O conceito de extrema pobreza é definida pelo Banco Mundial como renda inferior a US$1,90 por dia por pessoa. De acordo com a cotação da moeda americana nesta sexta-feira (15), o valor equivale a R$7,25 por dia ou aproximadamente R$217 por mês.
Crescimento da pobreza pode fazer Brasil voltar para o mapa da fome
Devido ao crescimento da extrema pobreza, o Brasil está em alerta para o retorno ao mapa da fome desde 2017. O indicador foi criado em 1990 e monitora o número de pessoas subalimentadas no mundo.
Os países em que mais de 5% da população não consegue se alimentar de forma adequada compõe o indicador. O Brasil até 2014 tinha apenas 3%. No entanto, desde 2017, a ONU tem alertado que o Brasil pode voltar para o mapa devido a piora em indicadores como pobreza e desemprego.
O quadro se agrava com o desmonte de políticas de combate a fome promovido por Jair Bolsonaro (PSL), que extinguiu Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutrição. O órgão foi criado em 1994 na gestão Sarney, que o descontinuou no ano seguinte e só foi recriado por Lula em 2003. Era o principal instrumento legislativa de combate a fome e foi extinto por Jair em seu primeiro dia de governo.
Cortes são arbitrários e ameaçam direitos conquistados
Ainda de acordo com a Agência Pública, os cortes que tem sido promovidos contra o Bolsa Família são arbitrários e ameaçam a autonomia conquistada pelas mulheres ao longo dos anos. A reportagem ouviu a professora Walquíria Leão Rêgo da Unicamp que, desde 2016 pesquisa sobre a vida de mulheres no sertão de Alagoas e Ceará.
Ela havia observado o ganho de autonomia das mulheres por serem beneficiárias do programa e vê os cortes com preocupação. “O aprofundamento dos cortes no Bolsa Família não apenas reduzirá a autonomia dessas mulheres, mas compromete a própria vida delas e das crianças. Um verdadeiro genocídio”, alerta.
Ainda de acordo com a publicação, esses cortes são feitos com o pretexto de combater fraudes, mas são “arbitrários” e, muitas vezes, “cruéis” porque a perda pode ocorrer em um momento de ocupação temporária. A pesquisadora relata ainda que tem constatado uma “situação de medo e angústia”.
Violência é outro problema que ameaça a vida das mulheres
A reportagem mostra ainda que a violência é outro problema que ameaça a integridade e a vida das mulheres, em especial as mais pobres. Foi o que avaliou, em entrevista, a pesquisadora Natália Fontoura do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Para Fontoura, a violência doméstica ameaça ainda mais as mulheres pobres porque essas costumam ter uma rede de apoio menor. Muitas delas não tem acesso a advogado ou sequer autonomia financeira para sair de casa em situações de violência.
Da Redação da Agência PT de Notícias com informações da Agência Pública