Deputados do PSL usaram verba pública para espalhar ataques
Inquérito que está no STF amplia cerco ao Planalto e coloca canhão de luz sobre o financiamento de atividades de grupos extremistas da direita. Quatro parlamentares usaram recursos de representação parlamentar para financiar e propagar fake news
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O esquema bolsonarista de desferir ataques crescentes ao Supremo Tribunal Federal e às instituições democráticas começou a ser desvendado pela Procuradoria Geral da República, que deu início ao rastreamento do dinheiro que financia manifestações favoráveis ao fechamento do Congresso e do Suprema Corte, ensaiado pelo grupo extremista ‘300 do Brasil’. Quatro deputados do PSL estão sendo investigados pelo uso de dinheiro público para divulgar manifestações antidemocráticas nas redes sociais.
Os deputados federais Bia Kicis (DF), Guiga Peixoto (SP), Aline Sleutjes (PR) e General Girão (RN), de acordo com reportagem do jornal ‘O Globo’ repassaram R$ 30,3 mil para a Inclutech Tecnlogia, empresa do marqueteiro Sérgio Lima, responsável por cuidar da marca do Aliança pelo Brasil, partido que o presidente Jair Bolsonaro tentar criar. Os recursos têm origem na cota parlamentar a que têm direito. O dinheiro foi usado para propagar as mensagens de caráter anti-democrático, pedindo o fechamento do STF e do próprio Congresso.
O inquérito que investiga o caso foi aberto em 20 de abril para investigar quem está por trás desses atos. Na semana passada, 11 parlamentares bolsonaristas tiveram o sigilo bancário quebrado, bem como empresários, donos de sites e canais no YouTube pró-governo, que se tornaram alvo de mandados de busca e apreensão.
A participação do presidente em atos com ataques ao Supremo, ao Congresso e à própria democracia embasaram o pedido de impeachment oferecido pelos partidos de oposição – incluindo o PT –, mais de 400 organizações da sociedade civil, além de intelectuais e juristas, apresentado ao presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ).
No despacho em que pediu o cumprimento de diligências ao STF, o vice-procurador-geral da República Humberto Jacques apresenta duas fontes distintas de financiamento de Sara Giromini, líder do movimento “300 do Brasil”. Investigadores receberam informações de que a extremista e seu grupo arrecadaram R$ 10 mil às vésperas do ataque ao prédio do STF com fogos de artifício.
Além disso, uma jornalista chamada Jéssica Almeida, que se infiltrou no grupo de Sara para entender como ele funcionava, relatou que “o 300 do Brasil” arrecadou R$ 71 mil por meio de uma plataforma de doações coletivas. A PGR agora vai buscar saber quem está por trás desses repasses.
Polícia Civil do DF
Nesta segunda-feira, dia 22, a Polícia Civil de Brasília anunciou que avalia a abertura de uma linha de investigação para apurar o quem financiou o grupo ‘300 do Brasil’. No domingo, a polícia do DF realizou uma operação de busca em um imóvel utilizado pelo grupo liderado por Sara Winter. O delegado da Coordenação Especial de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Cecor) da Polícia Civil, Leonardo de Castro, disse que confirmou a existência de material suspeito no imóvel usado pelo grupo.
O imóvel alvo da operação de ontem, uma chácara na região de Arniqueiras, pertenceria a um empresário de Goiânia (GO). Sem citar nomes, o delegado disse que o dono seria um dos membros do grupo e já teria inclusive ameaçado o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), nas redes sociais. “Pode ser um indício de que ele seja um dos financiadores do grupo, justamente por disponibilizar esse imóvel, caso seja confirmada a propriedade”, comentou o policial.
Além do grupo ‘300 do Brasil’, outros grupos extremistas – ‘Patriotas’ e ‘QG Rural’ – também teriam usado o imóvel. A polícia informou ter apreendido fogos de artifício, manuscritos com planejamento de ações e discursos, cartazes, aparelhos de telefone celular, um facão, um cofre, além de imagens das câmeras de segurança da propriedade.
Sigilos quebrados pelo Supremo
Além desses quatro parlamentares, outros seis deputados do PSL tiveram os sigilos bancário, fiscal e telemático quebrados por determinação do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no STF. São eles: Daniel Silveira (RJ), Carolina de Toni (SC), Alê Silva (MG), Carla Zambelli (SP), Cabo Junio Amaral (MG) e Otoni de Paula (RJ), assim como o senador Arolde de Oliveira (PSD-RJ).
Em 19 de abril, Dia do Exército, véspera da instauração do inquérito no STF, milhares de pessoas saíram às ruas do país para demonstrar apoio ao governo Bolsonaro. Parte delas estendeu faixas e bradou contra o Congresso e o STF. O mesmo voltou a ocorrer em 3 de maio. Bolsonaro participou dos eventos e chegou a discursar.
De acordo com a lei, não são permitidas ações que tenham por objetivo “a mudança do regime vigente ou do Estado de Direito”, assim como é proibida “a propaganda, e seu financiamento, de processos ilegais para alteração da ordem política ou social”. Também não se pode incitar animosidade entre Forças Armadas e as instituições democráticas.
Ganhos com atos anti-democráticos
A Procuradoria Geral da República estima que sites bolsonaristas faturaram com a transmissão de discursos feitos pelo presidente durante os protestos antidemocráticos. Avalia-se que dois deles teriam arrecadado mais de R$ 150 mil com a exibição dos atos. A ‘Folha Política’ – site que dissemina fake news – pode ter faturado entre US$ 6 mil e US$ 11 mil ao veicular o discurso de Bolsonaro em 3 de maio.
Outro site, o ‘Foco do Brasil’, segundo a PGR, pode ter amealhado algo entre US$ 7,55 mil e US$ 18 mil com uma transmissão feita em 19 de abril. A arrecadação provém de publicidade, parcerias, assinaturas e eventuais compras de produtos oferecidos pelos canais. O cálculo se baseia no relatório de empresa especializada em análises estatísticas do YouTube.
O ‘Foco do Brasil’ mantém um canal no YouTube com 2,8 milhões de inscritos. A ‘Folha Política’ também publica notícias na forma de vídeo. Além de um site, tem um canal no YouTube com 2,05 milhões de inscritos, onde dá espaço a políticos bolsonaristas que atacam ministros do STF e divulgam fake news. Na última semana, a página serviu de palanque para o deputado Daniel Silveira e outros políticos criticarem o ministro Alexandre de Moraes.
Relatório produzido a pedido da CPI das Fake News do Congresso Nacional, identificou 2,065 milhões de anúncios pagos com verba da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República em sites, aplicativos de telefone celular e canais de YouTube que veiculam conteúdo considerado inadequado. Entre eles estão páginas que divulgam notícias falsas, oferecem investimentos ilegais e até aplicativos com conteúdo pornográfico.
Da Redação, com agências Globo e Estado