Elói Pietá: Algumas Questões Sobre a Resolução do Diretório Nacional do PT

Pietá escreve sobre o resultado eleitoral, o governo eleito, a centralidade da luta, além dos obstáculos e contradições que se colocam ao novo poder

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Elói Pietá

Algumas Questões Sobre a Resolução do Diretório Nacional do PT

1-QUAIS AS CAUSAS DA DERROTA ?

A resolução da maioria do Diretório Nacional em 1º de dezembro deixou pela metade o entendimento das causas da derrota. Os resultados de 2018 são atribuídos apenas às ações dos adversários. A maioria do Diretório não quis adotar a parte da resolução proposta pela comissão de representantes das diversas chapas que identificava na condução do PT e de nossos governos problemas que contribuíram para o resultado.

Dizia em síntese a proposta da comissão: A erosão do apoio ao PT em importantes segmentos populares se deveu ao insucesso no combate à corrupção e à adaptação do PT aos costumes da política tradicional; à não realização de reformas estruturais durante nossos governos; a algumas medidas econômicas adotadas pelo governo Dilma em 2015 erodindo bases sociais e facilitando a versão que pôs nos ombros do PT a culpa pela crise; à dificuldade no enfrentamento dos avanços da extrema direita na consciência popular.

O máximo que a maioria do Diretório admitiu foi que os avanços obtidos em nossos governos não foram suficientes para manter “a conexão política com as maiorias sociais e efetivar a disputa cultural de ideias e valores”. A resolução não diz o que faltou. Não explica por que o sistema político que foi rejeitado na maior parte do país, se manteve no Nordeste, e o PT com ele. Seriam o progresso social e econômico e a liderança de Lula tão marcantes lá que superaram no pensamento popular as acusações de corrupção e de responsabilidade pela crise? Seria porque lá o PT, lastreado nesta ampla base social, conseguiu ganhar e conservar governos estaduais, mantê-los bem avaliados e eleitoralmente fortes, facilitando que partidos e figuras que nos golpearam em 2016 voltassem a se aliar conosco? Seria porque as classes médias que nos rejeitam são menos numerosas naquela região?

2-QUAL A CENTRALIDADE DA LUTA NESTA CONJUNTURA?

A resolução orienta o PT a contribuir para a formação de amplo movimento de defesa da democracia, de direitos sociais, da soberania nacional, com os setores que apoiaram a candidatura de Haddad no primeiro e no segundo turno. Para o partido coloca como centralidade na conjuntura fortalecer a campanha Lula Livre e a denúncia nacional e internacional contra as arbitrariedades e a parcialidade de setores do Judiciário e do MP brasileiros, nas redes e principalmente nas ruas, em movimentos de massa.

O texto da comissão das diversas chapas que compõem o Diretório tinha proposta diferente. Colocava como centro da tática concentrar nossa ação na defesa dos interesses populares, vinculando a isso a defesa das liberdades democráticas, com papel destacado à campanha pela libertação de Lula. Acrescentava a defesa da soberania nacional.

3- CABE TIPIFICAÇÃO FASCISTA PARA OS VITORIOSOS?

Diz o texto aprovado pela maioria da Direção Nacional do PT: “Houve uma vitória da extrema direita, com corte fascista”. Desta afirmação deriva a tática: “É importante criar núcleos de luta pela democracia e pela defesa dos direitos sociais, contra o fascismo, nas universidades, escolas, locais de moradia”. A caracterização do governo como fascista demandaria uma discussão teórica sobre se efetivamente o fascismo é revivido numa versão brasileira. Partido único, organizador e mobilizador constante de massas, com forte hierarquia, com a anulação dos outros pela violência e pelo terror? Culto ao chefe, desprezo dos valores individuais, exaltação da coletividade nacional, da raça, e da colaboração de classes? Monopólio da comunicação e controle das relações sociais e culturais nas mãos do estado ou do partido? Forte dirigismo estatal da economia capitalista? Controle do governo central sobre os poderes regionais? Expansão imperialista e colonial? Oposição ao comunismo e ao socialismo? A aplicação à conjuntura brasileira de um conjunto de fatores que caracterizou o fascismo não está fundamentada na resolução. Conforme a interpretação da realidade serão as conseqüências de como agir.

4-QUAIS AS POTENCIALIDADES DO NOVO GOVERNO?

A resolução não avançou na análise das potencialidades do novo poder, das contradições entre as forças econômicas, sociais e políticas que o levaram à vitória, nem o alcance da resistência das oposições e do povo. As novidades de um reformismo intensamente privatizante podem trazer por certo tempo repercussões favoráveis na economia e uma expectativa positiva para o novo governo. Afinal, são muito grandes as dúvidas na sociedade de como superar a crise. Uma contínua e sempre renovada campanha contra a corrupção podem lhe dar aval popular por um bom período e dificultar a recuperação da imagem do PT. Uma ofensiva na área da segurança pública, articulando e liberando a ação das polícias contra a criminalidade comum, pode ter respaldo popular. Uma reforma da previdência que prejudica a maioria pode ser propagandeada como um ataque a privilégios realmente existentes no setor público. A orientação ideológica conservadora na área dos costumes e da educação pode trazer apoio de larga parcela da sociedade. Tudo coroado com a guerra da informação em que os vitoriosos se mostraram capacitados. É de se prever uma tarefa difícil para as oposições.

5-QUAIS OS OBSTÁCULOS E CONTRADIÇÕES DO NOVO PODER?

O candidato passou uma imagem de antissistema. Mas terá que encarar as resistências do poderoso sistema que permanece: no parlamento nacional, no poder judiciário, no poder militar e policial, nos poderes estaduais, no poder da mídia, no poder das grandes corporações financeiras/industriais/agrárias/comerciais/de serviços, no poder das igrejas, no poderes internacionais. Os conflitos internos serão grandes. Uma parte pode prevalecer sobre as outras e neutralizá-las ou engoli-las. No embate entre o núcleo militar e o núcleo civil do governo a tendência é que o grupo militar seja predominante, pois tem unidade, estratégia, táticas, experiência recente e dos tempos da ditadura militar.
A realidade colocará obstáculos à retórica e às intenções do novo poder. Ele enfrentará uma realidade de crise econômica persistente, desemprego conjuntural e estrutural, insatisfações das classes médias e pequenos empresários, insatisfações populares com a baixa qualidade e oferta de serviços públicos, com a retirada de direitos, com uma enraizada violência criminal, com as aspirações frustradas da juventude das periferias, com as conseqüências da desindustrialização, etc.
Além disso, o novo poder enfrentará uma forte oposição política com profundas raízes na sociedade, e uma população que aprendeu durante mais de 30 anos uma rica experiência democrática.

6-QUAIS AS RAZÕES DE CONVOCAR UM NOVO CONGRESSO DO PT?

A maioria do Diretório não aceitou convocar o 7º Congresso. Pôs dúvidas e adiou para fevereiro a decisão. Mas, a realidade política mudou muito com a nova fase do golpe e justifica um novo congresso do partido. Pois, a extrema direita, antes recolhida e isolada, agora acessou ao núcleo central do poder. As forças armadas agora voltam ao governo. Nunca antes se falava abertamente em liberar à auto-decisão das polícias a vida ou morte das pessoas. Nunca o neoliberalismo radical tinha ganhado tanto poder. O estado laico agora é ameaçado por um projeto de estado religioso pentecostal. Grandes mudanças já em curso serão agravadas nas relações do capital com o trabalho. Desde a eleição de Trump surgiu no mundo um novo tipo de campanha eleitoral e um vale tudo nos novos meios de comunicação, sem limites, como na guerra. O novo governo dá sinais que vai manter tais métodos que usou na campanha e a agressividade retórica que pode estimular violências reais contra as oposições e os movimentos sociais. Dentro das classes populares surgiu significativo apoio à extrema direita e nelas penetrou a rejeição ao PT antes menos presente. Tudo isso exige reflexão e decisão coletiva. É importante realizar um novo, amplo e democrático congresso do PT.

Por Elói Pietá, Membro do Diretório Nacional do PT e coautor no 6º Congresso da Tese Alternativa Crítica Autocrítica e Utopia

ATENÇÃO: ideias e opiniões emitidas nos artigos da Tribuna de Debates do PT são de exclusiva responsabilidade dos autores, não representando oficialmente a visão do Partido dos Trabalhadores

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