Em meio à pandemia, Bolsonaro ameaça com intervenção militar para se manter no poder, diz ‘NY Times’
Em reportagem publicada nesta quarta-feira (10), diário americano aborda a escalada autoritária de Bolsonaro em plena crise e as investigações que podem anular as eleições de 2018. O jornal assinala que a ameaça traça um arco sinistro: “a crise tornou-se tão intensa que algumas das figuras militares mais poderosas do Brasil acenam para a instabilidade, enviando sinais de que poderiam assumir e desmantelar a maior democracia da América Latina”
Publicado em
O coronavírus avança no Brasil, arrasando municípios e deixando um rastro de milhares de mortos. Enquanto isso, o presidente Jair Bolsonaro, no centro de uma das piores crises atravessadas pelo país em décadas, ignora a calamidade de saúde e usa a ameaça de uma intervenção militar para permanecer no poder, relata um dos mais prestigiados jornais da imprensa internacional, o ‘The New York Times’. Em reportagem publicada nesta quarta-feira (10), o diário americano aborda a escalada autoritária de Bolsonaro em meio a pandemia e as investigações que podem anular as eleições de 2018. A ampla reportagem é assinada pelos jornalistas Simon Romero, Letícia Casado e Manuela Andreoni.
“A crise tornou-se tão intensa que algumas das figuras militares mais poderosas do Brasil acenam para a instabilidade, enviando sinais de que poderiam assumir e desmantelar a maior democracia da América Latina”, analisa o jornal. “Mas longe de denunciar a ideia, o círculo interno do presidente Jair Bolsonaro parece clamar para que os militares entrem na briga”, relata o ‘Times’, destacando que o filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, já havia ameaçado o país com uma ruptura institucional.
O jornal assinala que a ameaça traça um arco sinistro para o Brasil, um país que ressurgiu da ditadura na década de 80 e construiu uma democracia sólida. O ‘Times’ relembra o período democrático, quando o país pavimentou o caminho para o crescimento econômico, destacando períodos da administração petista, que permitiram a realização dos maiores eventos esportivos do planeta. “Em duas décadas, o Brasil passou a representar a energia e a promessa do mundo em desenvolvimento, com uma economia em expansão e o direito de sediar a Copa do Mundo e as Olimpíadas”, pontua o veículo.
Investigação
A chegada do vírus aprofundou a crise institucional, aponta o diário. Segundo o ‘New York Times’, Bolsonaro foi criticado por subestimar o vírus, sabotar medidas de isolamento e depois referir-se com descaso a um dos mais altos índices de mortes no mundo: “Sentimos muito por todos os mortos, mas esse é o destino de todos”, foi a resposta do presidente.
Em paralelo, lembra o jornal, o presidente, sua família e apoiadores também são acusados de prática de abuso de poder, corrupção e disseminação ilegal de fake news. “O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que supervisiona as eleições, tem autoridade para usar as evidências do inquérito para anular a eleição e remover o Bolsonaro do cargo”. Ainda segundo o dário, dois dos filhos de Bolsonaro também estão sob investigação por corrupção, e o STF recentemente autorizou um inquérito sobre alegações de que Bolsonaro tentou substituir o chefe da polícia federal para proteger a família e amigos.
Sonegação de dados
A sonegação de informações referentes ao número de casos e mortos, parte da nova estratégia de sabotagem do governo desde a semana passada, também é tratada pelo jornal, que noticia a determinação do ministro Alexandre de Moraes, do STF, para que o Ministério da Saúde voltasse a divulgar dados da da pandemia integralmente. “Até tratamento da pandemia pelo presidente está sob ameaça legal”, constata o ‘New York Times’.
O jornal também volta as atenções para o general Heleno, lembrando a ameaça velada do militar feita em maio, quando falou sobre as “consequências imprevisíveis para a estabilidade nacional” depois que o Supremo Tribunal permitiu a abertura de uma investigação sobre os apoiadores de Bolsonaro.
Agora, depois que as ameaças de intervenção militar provocaram uma ampla reação, mesmo de alguns membros seniores das forças armadas, o general recuou. “O general Heleno, assessor de segurança nacional, disse mais tarde que não apoiou um golpe de Estado, alegando que ele era mal compreendido”, ressalta a reportagem.
Militarização
A reportagem segue destacando que os militares já ocupam espaço e exercem influência “excepcional” no governo. Militares, incluindo generais aposentados, representam 10 dos 22 ministros no gabinete. O governo também nomeou cerca de 2.900 outros membros da ativa das Forças Armadas para cargos na administração, descreve a matéria.
O ‘Times’ também ressalta que os militares, ao assumir a dianteira das ações de resposta à pandemia, passaram a correr riscos quanto ao resultado das estratégias. Com um crescente número de mortes, os militares podem ser responsabilizados pela população pelo fracasso no combate à Covid-19, complementa o jornal.
“Um ex-funcionário do Ministério da Saúde disse que as mudanças bruscas criaram uma sensação de caos dentro da pasta, resultando em semanas de disfunção e paralisia no momento mais crucial – quando o país deveria estar combatendo a disseminação descontrolada do vírus”, revela o diário.
Fuga de investidores
Como resultado, o Brasil agora tem mais de 700 mil casos confirmados de coronavírus, perdendo apenas para os Estados Unidos. Pelo menos 37 mil pessoas morreram e os óbitos têm se mantido na casa dos mil por dia. Enquanto isso, a crise está continua afugentando investidores. “A fuga de capitais está atingindo níveis nunca vistos desde os anos 90. O Banco Mundial espera que a economia contraia 8% este ano. A produção de automóveis, um pilar da economia outrora próspero, caiu para o nível mais baixo desde a década de 1950”, conclui o ‘New York Times’.
Da Redação